Olá pessoas! Quem gosta de livros de fantasia? Estava eu esses dias pensando sobre que post fazer, quando lembrei de um livro que eu AMEI e que ainda não tinha feito resenha. Só que não me vi como alguém capaz de conseguir transmitir para vocês toda a riqueza da trama... foi então que decidi recrutar meu amigo - que é mais apaixonado pela história e mais talentoso com as palavras do que eu - para resenhar "O Império Final", o primeiro livro da trilogia "Mistborn: Nascidos da Bruma", escrita pelo norte-americano Brandon Sanderson (lançado no Brasil pela editora Leya). Ainda bem que ele aceitou! Espero que gostem e que se sintam motivados a dar uma chance para o livro. Garanto que não vão se arrepender!
"Há alguns dias, parei durante alguma atividade corriqueira e insignificante como estender a roupa ou lavar a louça e refleti sobre algo que sempre me deixou um tanto quanto intrigado: a capacidade criativa dos autores de nossas sagas favoritas.
De fato, qual teria sido o processo neurológico por trás da imaginação de J.K. Rowling ao criar o feitiço do patrono, aquele que conhecemos tão bem? Ao decidir que Transfiguração merecia ser uma disciplina curricular na escola de magia que arquitetou em sua mente com tamanha maestria? O que se passa na cabeça de George R.R. Martin ao tecer as intrigas de sua saga épica de forma tão cruelmente magnífica – coloquemos cruel nessa mente –, muitas vezes deixando nós, leitores, incapazes de dizer a nós mesmos que aquele personagem que se foi era simplesmente aquilo, um personagem? Qual foi o pacto que Suzanne Collins fez ao escrever Jogos Vorazes? Em que cláusula específica daquele contrato com sabe-se lá que entidade ficou assegurado que a história deixaria quem a lesse obcecado até que chegasse a seu fim? Qual é o limite da inventividade desses mestres da ficção? Seriam eles capazes de criar uma nova história?
Não uma história qualquer, mas outra com um mundo igualmente encantador, cheio de elementos cuja veracidade e senso de realidade mal são questionados por nós, que estamos ávidos por deixar a razão de lado e embarcar naquela aventura. Tolkien tem a Terra Média d’O Senhor dos Anéis e Lewis tem As Crônicas de Nárnia. Mas nenhum deles criou a Terra Média e Nárnia. Outro autor do qual nunca tinha ouvido falar, por outro lado, criou Mistborn: Nascidos da Bruma. Esse autor se chama Brandon Sanderson, e foi quem incutiu essas perguntas na minha cabeça com o primeiro livro da citada saga. Não é segredo algum que venho fazer esta resenha como um leitor leigo. E, mesmo como leitor leigo, como falar sobre as minhas impressões a respeito da história sem antes falar um pouco desta? Então deixe-me contar uma coisinha ou duas sobre Nascidos da Bruma - O Império Final.
As brumas surgem à noite. Os skaa se preparam para dormir ao pôr do sol, aterrorizados demais para que jamais ousem abrir a porta de suas casas depois que a noite chega. Durante o dia, as cinzas caem constantes do céu, o sol é vermelho e brilha através da fumaça, e há mil anos as plantas perderam a sua coloração verde. As profecias da distante Terris diziam que o Herói das Eras teria o poder de deter as Profundezas e salvar o mundo... e que também teria o poder de destruí-lo. Ele havia falhado. Desde então, o Senhor Soberano governa o Império Final, exercendo a sua tirania sobre uma sociedade brutalmente oprimida e um mundo arrasado.
E é aqui que começo a expor os meus motivos para elevar O Império Final a um posto entre os meus livros preferidos. O primeiro deles diz respeito ao referido sistema político em que se passa a história. A sociedade no Império Final é estritamente separada em dois grupos: a nobreza e os skaa. Os skaa são escravos camponeses, trabalhadores de fábricas e forjas que possuem a tarefa exclusiva de satisfazer os caprichos da nobreza, e que almejam nada mais do que sobreviver aos espancamentos de seus capatazes e um prato de sopa para aguentar até o dia seguinte. A nobreza, por sua vez, tem mais do que o poderio de forças armadas para garantir sua dominância sobre a classe desfavorecida: ela tem o próprio Senhor Soberano, imortal e onipotente, aquele que ditara um milênio antes como as coisas deviam ser. E tudo, ou o pouco que mencionei, pode parecer simplista demais, o que, asseguro, não procede. Na verdade, a imersão nesse sistema pela leitura em si se dá tão naturalmente que em momento algum você se pega com impressões críticas negativas a respeito dele. É como se você não fosse confrontado com aquela velha sensação de ver o uso da fantasia para se criar algo surreal demais justamente porque a própria fantasia é uma desculpa. O que quero destacar aqui é que há uma diferença entre descrever e narrar com arrogância e a certeza de que se alcançará determinado objetivo, e narrar e guiar o leitor em direção à mitologia da história com técnica e com elementos inteligentes. Em O Império Final, não é provável que se pergunte por que maioria avassaladora da população é escravizada e não se rebela contra a minoria que a oprime. Mas há de se perguntar quem é um simples camponês para questionar a vontade da Centelha do Infinito.
Em meio a isso, no entanto, há os que ousem ter esperança e se organizem na tentativa de fazer o impossível. Kelsier é o líder de uma gangue de ladrões em Luthadel, sede do palácio do próprio Senhor Soberano e a maior cidade do Império Final. Nada os distinguiria de outras gangues que aplicavam golpes em Casas nobres para enriquecer, não fosse um único fato. E este fato é outra das minhas razões por amar a história, eu, fã de sistemas de magia inteligentes e bem feitos. Os homens da gangue de Kelsier são misteriosos alomânticos, que possuem poderes variados e inusitados. Um deles tem a peculiar capacidade de controlar as emoções de uma pessoa como quem controla fantoches. Outro, por exemplo, é capaz de aguçar todos os seus sentidos, enxergando a distâncias que nenhum olho humano pode fazê-lo ou ampliando sua audição de forma assombrosa. Tais poderes não se baseiam em explicações vazias, entretanto, pois fazem parte de um sistema complexo e bem pensado, por vezes até mesmo obedecendo a princípios reais da ciência e da física, algo totalmente eficaz em deixar tudo muito mais interessante e incrível. Os brumosos – assim são chamados os alomânticos que possuem um único poder – fazem principalmente parte da nobreza e são raros, mas há skaa bastardos e mestiços que, pela sua herança de sangue nobre, podem herdar a alomancia. Um brumoso que é capaz de aumentar sua força e habilidades físicas, seja ele um nobre ou um skaa, por exemplo, é conhecido como Brutamontes. Outro que é capaz de abrandar as emoções de uma pessoa é um Abrandador.
Alguns poucos, porém, possuem todos os poderes alomânticos. São os Nascidos da Bruma. Tal é o poder de um nascido da bruma que, se um único brutamontes equivale a dez guerreiros treinados em batalha, há quem compare um nascido da bruma a ter um exército inteiro ao lado. Os nascidos da bruma são extremamente raros mesmo entre a nobreza. Só um alomântico de linhagem extremamente pura teria chance de ser um nascido da bruma; logo, os poucos – e desconhecidos – que existem são quase exclusivos das Grandes Casas de Luthadel. Os skaa brumosos são ferozmente perseguidos pelas forças do Ministério e do Senhor Soberano, que buscam assegurar a sua extinção, e não há quase rastro algum da existência de um nascido da bruma skaa.
Kelsier e sua gangue traçam o plano de algo que ninguém sequer conseguiu chegar perto de realizar antes: derrubar o Império Final e o Senhor Soberano. É quando eles ouvem boatos sobre uma garota explorada e maltratada, usada por outra gangue de ladrões para dar golpes. Vin não faz ideia de que é uma alomântica, embora uma rápida avaliação de Kelsier e seus amigos mostra que a garota usa, ainda que inconscientemente, os poderes de uma Abrandadora para persuadir pessoas e trazer lucros para sua gangue. E tudo muda quando Vin se descobre capaz de acessar outros poderes alomânticos.
A magia em Nascidos da Bruma – Império Final é um arraso. Dito isto, não me prolongo. E há a condução da narração. Sanderson se mostrou mais do que competente em criar situações que prendam a atenção do leitor e deixem-no voraz para saber o que vai acontecer. É algo que se pode dizer de muitos outros livros e histórias, claro, mas não se menciona o que é comum a muitos se não for algo excepcional e digno de ser mencionado. Outro fato é o de que a história dentro da história – ou background, como preferir – é muito intrigante, o que também destaca o talento do autor. A narrativa te induz a fazer suposições. E então, faz você questionar aquela suposição e criar uma nova suposição por cima dela, sem que uma esmague completamente a outra, e mais uma vez, até que você já não tenha certeza do que esperar sobre algo. Talvez seja o que comumente se conhece por reviravolta, mas prefiro não usar esse termo. Penso em reviravoltas mais como acontecimentos inesperados e surpreendentes, o que também é característico do livro.
Por fim, a ação é um espetáculo à parte. Arrisco a dizer que o autor tem uma das melhores escritas neste sentido que já tive o prazer de conhecer. Não é maçante; muito pelo contrário, carrega uma pegada e uma energia incrível. O nível e a quantidade das descrições são perfeitos para que você visualize e ao mesmo tempo não perca o ritmo do acontecimento em questão.
O sistema político e a mitologia criados por Brandon Sanderson no primeiro livro de sua saga foram o que me fizeram perguntar aquilo sobre a criatividade dos autores. E não, não sou capaz de responder a essa pergunta. Sei que, assim como Martin e Rowling, e outros que marcaram a minha vida, Sanderson foi capaz de criar mais uma saga que vou carregar no meu coração de leitor e amante de fantasia enquanto não me tornar insensível aos encantos desse gênero.
E, como consideração final, acho que, ao escolher livros para ler, devia confiar mais nos meus instintos e menos em listas de mais lidos do skoob."
Sobre o autor da resenha:
Gustavo H. tem 22 anos, estuda Letras na UnB e é funcionário público. Apaixonado por fantasia, aguarda ansiosamente a chegada de Daenerys Targaryen à Westeros.