Paulistas, de Daniel Nolasco


Para aqueles que deixam sua terra natal e vão em busca de oportunidades nas grandes capitais e cidades do país vale a pena prestar atenção no documentário 'Paulistas', de Daniel Nolasco, que entra amanhã em cartaz pelo projeto de sessões 'Vitrine Petrobras'.

De caráter observativo, a produção revela ao público a passagens de férias dos irmãos Samuel, Vinicius e Rafael pela região de Paulistas e Soledade, lugares onde cresceram e ainda tem parentes. Localizados ao sul de Goiás, os 'quase-vilarejos' já tiveram seu tempo de exploração de recursos hídricos e também foram palco de expansão do setor agrícola, durante a década de 90 - o que motivou bastante a ida dos habitantes para outros cantos do Estado ou até do país.  

Exposta a situação da baixa taxa de moradores jovens ali e o porquê, Paulistas reflete ainda o quão única é a vida no interior. O quão acolhedora e, porque não dizer, pacata. Experiência esta que pode até deixar de existir pela despovoação ocorrida. As imagens apresentadas também trazem ainda muita subjetividade e ganham, claro, um tom poético.

Trailer

Um projeto como Paulistas é relevante pela visão dual que ele invoca. Afinal, ao mesmo tempo que ele denuncia o abandono da vivência 'local' ele também denuncia uma acontecimento global onde as pessoas saem de seu lar em busca de uma vida melhor, ou por qualquer outro motivo, e não cultivam aquela cultura rica que deixaram para trás.

Para alguns, pode ser um filme que não acontece nada, e como diz a atriz Maria Ribeiro (veja aqui a partir de 7:14min) esse tipo de produção é também importante, pois vivemos em um tempo onde 'as redes sociais' ditam que necessitamos de acontecimentos atrás de acontecimentos para que nossas vidas se movam mais rápido e tenhamos 'dias ocupadíssimos'. Para muitos outros, a película, com pouco mais de uma hora, adentra um universo que pessoas maduras refletirão e tentaram encontrar respostas para suas mazelas vividas na cidade grande enquanto senhores de idade ainda labutam arduamente no interior e o mais alarmante problema de saúde que venham apresentar é uma queda de pressão ou ainda 'uma cama que se molha pela goteira da chuva' (hahahaha). 

O papel dos jovens aqui é percorrerem as belas paisagens, lidarem com tarefas braçais, acharem algum tipo de diversão andando de moto bêbados ou irem no forrozinho do centro comunitário, mas também não deixam de informar seus gostos modernos por rock, séries de zumbis e o vício nosso de todo dia chamado 'celular'. 


Em contraste, os habitantes idosos do lugar se mostram acostumados ao tempo em que a tevê ainda era o único meio de comunicação existente e também demonstram pouca habilidade com telefones. Apesar disso, gostam de tocar seu violão e fazer seus afazeres do dia com muita ânsia de vida.

Tecnicamente há destaque para o som que ecoa forte em certas cenas e também para o tom diverso da paleta de cores que é abrilhantado pela beleza do sul do Goiás e suas velhas habitações.

Há uma cena muito forte de matança de um porco que pode causar repulsa se você é vegan, mas, por outro lado, não é nada que te faça ficar revoltado com aqueles moradores como com grandes corporações que causam dores muito piores em milhares de animais.

Confira nossa entrevista (via e-mail) com a Equipe do filme.

WBN= Olá, Equipe do documentário Paulistas. Bem, o filme aborda um mix de temas importantes em voga atualmente (Migração, meio ambiente, movimentos urbanos e etc). Acreditam que ele  pode trazer interação entre pessoas que passam por situações semelhantes em outras partes do nosso imenso país e até do mundo?

R= Acreditamos que sim. Apesar do “Paulistas” falar sobre uma comunidade bem específica localizada no sul de Goiás, os temas abordados no filme podem despertar o interesse e a identificação em pessoas de todo o Brasil. A migração do campo para as cidades, por exemplo, é uma questão presente na história do Brasil desde o século passado e foi um dos fatores responsáveis pela configuração das metrópoles do país. O filme também aborda temas que podem ser considerados universais, como a saída dos filhos da casa do pais em busca de novas perspectivas de vida e o embate entre a tradição e a modernidade. Achamos que é uma história que dialoga também com pessoas bem distantes da realidade do campo ou do interior do Brasil.  

WBN=   A trama apresentada  traz um mundo em que o jovem busca visitar, mas não com tanta frequência. Pode-se ver isto como uma boa chamada de atenção para como estamos vivendo atualmente?

R= Uma das propostas do filme é fazer uma reflexão sobre a relação da juventude com a tradição. No Paulistas e na Soledade, as duas regiões que aparecem no filme, os jovens mudaram para as cidades mais próximas e a grande maioria deles foram em busca de outras possibilidades de vida que não teriam se tivessem ficado ali. Mas como é uma comunidade que vem sofrendo com o êxodo rural desde a década de 1980 a situação chegou ao ponto que mostramos no filme - a pessoa mais nova que mora na região é a Maria Cristina que tem 45 anos. Os meninos que aparecem no “Paulistas” tem uma ligação muito afetiva com os pais, com a fazenda e com a região onde cresceram. Mas eles foram embora porque desejavam outras vivências. A situação é bastante complexa e o fato dos jovens voltarem cada vez menos também está ligado há uma série de outros fatores - como as obrigações com o trabalho e a escola.
  

WBN= Todo processo de criação para projetos são super especiais. Querem ressaltar algo que motivou ainda mais vocês a batalhar pela ideia?

R= Para o diretor, a principal motivação para a realização do filme foi a relação pessoal dele com o Paulistas, a Soledade e as pessoas que estão no documentário. Daniel Nolasco, nasceu nessa região, e também foi um dos jovens que saíram de lá buscando outras perspectivas de vida. Ele acompanhou de perto as transformações pela qual passou a região nas últimas duas décadas, e em 2013 começamos os trabalhos para realizar o filme.

WBN= Indicam ao público alguma referência em particular sobre o filme ou sobre o processo de realização dele? ( Pode até ser uma playlist de músicas que a equipe escutou durante a realização do documentário).

R= Duas músicas que estão no filme nos acompanharam em boa parte das filmagens: a “Brand new fear” do Hellbenders; e “Erre” do Boogarins. O Vinícius, um dos personagens principais, passava boa parte do tempo escutando música com seus fones de ouvido. Ele gosta muito de rock e heavy metal, essas duas músicas estavam na playlist dele durante as filmagens. Quando chegou a hora de montar o filme fazia todo sentido para nós que essas duas músicas estivessem no “Paulistas”. 


WBN=  O Diretor de ‘’Paulistas’’, Daniel Nolasco, traz a própria experiência para o filme e constrói um mundo ainda maior. Assim, percebe-se que há preocupação em passar verdade na trama. Pode-se dizer que esta é a função principal da arte? 

R= Não saberíamos responder se essa é a função principal da arte. Se a arte tem uma função principal, isso pode mudar de pessoa para pessoa. Pensamos ser uma questão subjetiva. Acreditamos que trazer essa experiência de vida para o filme tem como uma das intenções criar a verossimilhança da história. Uma das necessidades de conhecer bem o assunto que você está trabalhando está nisso - construir um filme em que o espectador acredite no universo que está sendo apresentado para ele.

WBN=  Por último, gostaríamos de saber o que vocês esperam do espectador após a saída da sessão.

R= “Paulistas” é um filme que tem a intenção de propor várias questões e que também não pretende dar respostas acabadas para o espectador. O filme aborda vários temas que podem conversar bastante com o público. Então esperamos que as pessoas saiam da sala de cinema envolvidas e refletindo sobre as histórias dos personagens. 



Ficha Técnica
Direção e roteiro: Daniel Nolasco. ComAlcino Rodrigues, Alessandra Santana, André Luiz Monteiro, Branca Cardoso, Cleidiane Nolasco, Cristiane Nolasco, Daniel Nolasco, Diego Silva, Didimo Correia, Elismar Filho, Elismar Pereira, Erielle Fernandes, Evandy Correia, Fátima José, Gisele Correia,José Jaconi, Irene Alves, Isabela Reis, Jeorgeta Rodrigues, Leonice Pires, Maria Cristina Nolasco,  Miguel Romano, Osvaldo Marra, Pedro TarcísioRafael Nolasco, Reginaldo Ferreira, Rui Correia, Samuel Nolasco, Simone Nolasco, Silvio Dourado, Valdeci Simões, Victor Rodovalho, Vinicius Nolasco, Wander Marra, Waldina Nolasco. País e Estados de Produção: Brasil, GO/RJ. Ano: 2018.Gênero: Documentário. Assistente de Direção: Larissa Fernandes. Técnicos de som diretoFelipe Cordeiro e Nara Sodré. Técnico de SomFederico Billordo. Design: Gabriel Godinho. Fotografia: Larry Sullivan. Montagem: Will Domingos. Distribuição: Vitrine Filmes. Produtoras: Estúdio Giz e Panaceia Filmes. Duração: 76min.
Avaliação: Dois  televisores quebrados e meio (2,5/5).

22 de fevereiro nos Cinemas!
See Ya!


B-

Escrito por Bárbara Kruczyński

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