Conhecido majoritariamente por seus documentários, Sérgio
Tréfaut se volta para a ficção com “Raiva”, filme baseado no romance “Seara de
Vento” escrito pelo português Manuel da Fonseca e publicado em 1958, história
que se passa no sul de Portugal, especificamente
na região do Alentejo, onde uma família busca sobreviver em meio a pobreza.
Trailer
Em um dado momento Palma (Hugo Bentes) assume a narração e
diz que seu pai se matou e enquanto vemos o enterro dele o homem justifica que o
motivo do suicídio foi vergonha por ser pobre. Depois, diz: “nas terras mortas
onde não há pão, os pobres nascem pobres e os ricos nascem ricos. Os pobres
morrem pobres e os ricos morrem ricos”. Há um certo tom de resignação na fala
de Palma, como se essa situação fosse eterna e imutável. Entretanto, não é uma
resignação inteiramente passiva. Se seu pai se matou por vergonha de ser pobre,
Palma, fazendo jus ao título do filme, mantém uma raiva silenciosa e brutal
durante todo o filme.
“Raiva” encontra no preto e branco, com o qual o longa é
filmado e na ausência de uma trilha sonora que o acompanha, uma forma cruelmente
austera de tratar da miséria na qual os personagens vivem: muitas das cenas tem
como som de fundo os gemidos e grunhidos do pequeno Bento (Kaio César), filho
de Palma e Júlia (Leonor Silveira), e fica do lado de fora da casa o dia todo
dentro de um forte que ele mesmo construiu com barro e galhos.
As mulheres da família de Palma usam sempre preto, como se
estivessem em um velório para elas mesmas e por sua família (como uma
permanente lembrança da morte que se aproxima dos pobres que morrem pobres), e
reforçando o assassinato com o qual o filme abre seus trabalhos. Essa escolha de começar a película com o seu grande desfecho para depois mostrar os detalhes dos
acontecimentos que fez com que o assassinato fosse cometido demonstra uma
preocupação não com algum final surpreendente ou para a conclusão dessa
história e sim, para todos os detalhes da vida desta família; desde a aparência
dolorosa dos personagens que parecem morrer aos poucos diante do público até os
objetos que os cercam e que reforçam a miséria na qual eles estão inseridos.
Ficha
Técnica
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