quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Coringa, de Todd Phillips


Coringa sempre foi um dos vilões mais amados do público que lê HQs. Sua excêntrica personalidade, contudo, só havia ganhado destaque naquele universo. Nas telas e em live-action, sempre o vimos como antagonista ao homem morcego e com um grupo seleto de criminosos que perambulam por Gotham City.

Após o estrondoso sucesso do ator Heath Ledger em "Batman - O Cavaleiro das Trevas", de Christopher Nolan (2008), ficou claro que o anti-herói era intrigante o suficiente para também ter uma apresentação cinematográfica  só sua. Todavia, o falecimento precoce de Ledger excluiu o ator da chance de estar no papel, porém, ainda assim, o seu talento expôs o personagem e a ele próprio a um nível nunca antes imaginado, fervor com a crítica e um Oscar póstumo. A partir dali, a concepção de um filme origem foi também levada a serio.

Com base então na HQ, a escrita por Alan Moore, principalmente, ("Piada Mortal") esmiuçar as características deste e trazer sua jornada de surgimento ficou mais fácil. E o produtor, roteirista e diretor Todd Phillips se jogou de cabeça na ideia. Conhecido por realizar produções mais voltadas para a comédia, Phillips começou a contrabalancear seu currículo com películas como "Cães De Guerra" (ler comentários aqui).

Phillips e o parceiro de roteiro, Scott  Silver, revelam que, desde o início, escreveram o texto com Joaquin Phoenix em mente e o ator acabou comprando a possibilidade de interpretar Coringa pela proposta humana que os realizadores queriam e conseguem entregar.

Assim, para o nosso delírio e contentamento, o filme chega as telas mundiais esta semana, após fazer uma linda caminhada no Festival de Veneza e levar pra casa o Leão Dourado de Melhor Filme.

A distribuição é da senhora maravilhosa Warner Bros Pictures do Brasil.

Trailer
Título original e ano: Joker, 2019. Direção: Todd Phillips. Roteiro: Todd Phillips e Scott Silver — baseado nos personagens criados por Jerry Robinson, Bill Finger e Bob Kane. Elenco: Joaquin Phoenix, Robert De Niro, Marc Maron, Zazie Beetz, Brett Cullen, Frances Conroy, Dante Pereira-Olson, Shea Whigham, Glenn Fleshler, Leigh Gill, Sharon Washington, Carrie Louise Putrello, Bill Camp, Douglas Hodge. Gênero: Drama, crime suspense. Nacionalidade: EUA. Trilha Sonora: Hildur Guðnadóttir. Editor Musical: Daniel Waldman. Fotografia: Lawrence Sher. Edição: Jeff Groth. Figurino: Mark Bridges. Direção de Arte: Distribuidora: Warner Bros Pictures. Duração: 02h01min.
Na trama, Arthur Fleck (Phoenix), um homem solitário e atormentado que sonha em ser comediante, trabalha como palhaço em hospitais e faz apresentações circenses por aí. Em outros momentos, Fleck cuida da mãe doente, Penny (Frances Conroy), e também vai a consultas com uma agente social (Sharon Washington) para tentar estabilizar seus problemas mentais. Ademais, o homem sofre de uma condição que o faz rir em horas impróprias e constrange todos a sua volta.

Uma dessas horas, aliás, vem a acontecer enquanto este está voltando para casa de metrô e três homens de classe alta se incomodam com sua presença. Cansado de apanhar e de ser aterrorizado, Fleck reage atirando nos três e matando-os com uma arma que um colega de trabalho o emprestou. A cidade de Gotham fica consternada com o ocorrido e um movimento popular toma as ruas, mas não para vingar as mortes e sim para exigir respeito a população de classe baixa. A elite, representada por figurões como Thomas Wayne (Brett Cullen), começa a temer que serão atacados perante o caos criado e a vida de Arthur Fleck começa a se transformar a partir deste acontecimento. 


O roteiro de Phillips e Silver usa como referências cinematográficas Taxi Driver: Motorista de Táxi (1976), Touro Indomável (1980) e O Rei da Comédia (1982). Este último ganha ainda mais força, pois insere-se na trama um apresentador de televisão no qual Fleck e a mãe são aficionados, o popular Murray Franklin (Robert De Niro). E como naquele, aqui o apresentador sofre com o 'amor' advindo do fã - consequência clara de uma sociedade que não é inclusiva e escolhe maltratar e apontar as fragilidades alheias, ao invés de acolher os que precisam de cuidados especiais. 


Outro fator importante é como Fleck lida com suas emoções e desejos. Somos apresentados a sua vizinha, Sophie Dumond (Zazie Beetz), exatamente para termos a ideia psicológica de como sua mente funciona. Suas interações com outros seres humanos, os colegas de trabalho trapaceiros, moleques de rua que o espancam ou até crianças procurando afeto dentro de conduções de transporte, também nos revelam que seu estado doce e inocente é ao mesmo tempo muito exótico e atrai perseguição.

A direção é estupenda em nos trazer uma análise potente do personagem e de como sua caminhada se deu. Seu crescimento conturbado, sua vida estranha e todos os julgamentos por quais ele passou a vida toda. Sua transformação não acontece, em nenhum momento, para instigar a violência, pelo contrário, temos a oportunidade de conhecer quem realmente Coringa é e porquê ele tem tantos transtornos. Esta hora, temos empatia, e até o olhamos de outra forma - afinal, vemos alguém ser surrado apenas por estar a margem. A relação com a mãe é uma das chaves para também sentirmos a sua dor e esse circulo se fecha com o plano de funo criado a partir do 'acidente' em defesa da própria vida.

O ato final do filme, na verdade, mostra que era impossível ter controle da situação. Gotham, dominada por uma classe alta soberba e vil que não olha para os mais pobres, claramente não se importa com ninguém além deles. Os políticos pouco ligam se há ou não limpeza e precaução para impedir a proliferação de ratos nos bairros, imagina então cuidar daqueles que sofrem de problemas neurológicos e que necessitam de atenção especial. Inclusive, até cortam as verbas destinadas a este tipo de assistência e assim deixam pessoas como Arthur Fleck desprovidas de ajuda. A saída encontrada por ele nasce naturalmente dai. Do total descaso. Um caminho sem volta que lhe é imposto e leva ao caos e as reações do personagem serão sim julgadas, mas não esquecendo toda a sua humanidade.

As atuações coadjuvantes na produção são a base para a criação de Phoenix. De Niro tem pouquíssimas cenas, mas sua participação é sublime. É de seu apresentador canastrão que sentimos as máscaras da sociedade se mostrarem. E esta farsa quando se revela muda as feições de Fleck que até então via em seu ídolo uma escape para momentos felizes. 



Criado por Jerry RobinsonBill Finger e Bob Kane, o vilão já foi interpretado inúmeras vezes. Jack Nicholson, Heath Ledger e Jared Leto trouxeram ao público suas versões únicas de Coringa e Phoenix consegue atingir outro patamar. Talvez um que se iguale ao de Ledger, pois a performance do ator é brilhante e, apesar de fugir de comparações, consegue ser tão excelente quanto a do ator falecido. Certos takes até lembram os feitos de Ledger no passado e a caracterização de Joker tem certa semelhança.

Na primeira imagem, Phoenix como Coringa, e , na segunda, Ledger. 

Com belíssima técnica da fotografia, trilha sonora e uma lista de músicas (escute aqui) que esbanja elegância (ouvimos canções de Frank Sinatra, Nat King Kole, The Guess Who, Tony Bennett e muitos outros) o filme constrói muito bem seu tom de suspense. 

Por fim, vale dizer que CORINGA não dá só aos fãs um tão sonhado 'filme origem', mas a todos os cinéfilos boas horas de entretenimento com consistência.

Avaliação: Cinco passos rumo ao OSCAR (5/5)

HOJE NOS CINEMAS

See Ya!

B-

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