''Os Órfãos'' é exatamente aquilo que se espera dele. Seja através do trailer, da ambiência soturna e escura que já vem desde o início, ou até do título que chegou no Brasil. O filme de Floria Sigismondo é um compilado de técnicas bastante familiares do gênero de terror. O que, por si só, não é demérito algum quando utilizadas de modo original ou pelo menos de maneira mais sagaz. Os Órfãos, entretanto, acaba ficando na superfície e acredita que utilizar as armas conhecidas o salvará.
Na trama, Kate (Mackenzie Davis) aceita um emprego de tutora e educadora da órfã Flora (a incrível Brooklynn Prince, a criança protagonista de Projeto Flórida). Flora mora apenas com a governanta Sra. Grose (Barbara Marten) num casarão vitoriano comum em histórias sobre ricos e/ou almas penadas. Apesar de solitária, a criança é alegre, inteligente e brincalhona - algo importante para a trama quando esta adiciona o elemento Miles (Finn Wolfhard, de Stranger Things). O irmão de Flora, que diferente da irmã tem sua educação fora do casarão, num colégio interno. Seu retorno coincide com a chegada de Kate e desencadeia o ciclo de loucura que acompanhamos.
Trailer
Ficha Técnica
Título original e ano: The Turning, 2020. Direção: Floria Sigismondo. Roteiro: Carey W. Hayes, Chad Hayes - baseado no livro de Henry James. Elenco: Finn Wolfhard, Mackenzie Davis, Barbara Marten, Brooklynn Prince, Joely Richardson, Niall Greig Fulton, Denna Thomsen. Gênero: Terror. Nacionalidade: EUA. Trilha Sonora Original: Nathan Barr. Fotografia: David Ungaro. Edição: Duwayne Dunham e Glenn Garland. Distribução: Universal Pictures. Duração: 01h34min.
O roteiro estende-se mais que o necessário pela primeira metade do filme. Não entendemos muito o que está acontecendo e é notável a tentativa de construção em "banho-maria" de um leque de medos e inseguranças para a personagem da professora. Contar mais do que isso da trama, portanto, pode afetar a experiência que Sigismondo parece querer elaborar com seu filme. A lentidão da primeira parte, porém, é comprometida quando notamos todas as informações necessárias logo nas primeiras cenas na casa. Como dissemos, Os Órfãos se baseia em muitos truques do gênero para dar o clima de horror e ansiedade necessários. Dessa maneira, a repetição de jump scares, partes proibidas da casa e bonecos macabros, por exemplo, acabam cansando rapidamente sem mostrar muito a que vieram.
À medida que Kate vai encaixando as peças do quebra-cabeças que nem sabia que precisaria montar, acompanhamos mais pistas do ocorrido no passado e do que ocorre no presente. A trama avança e o filme parece dizer mais e alguma metáfora começa a se configurar sobre o gaslighting e a violência masculina. Vivendo numa casa quase abandonada, longe do mundo exterior, com crianças ricas e mimadas e uma governanta bitolada, é compreensível que Kate se sentisse acuada. O embate de poder social entre ela e Miles, assim que ele chega, demonstra que as coisas não serão tão fáceis em seu novo cotidiano. As abruptas mudanças de humor de Miles combinadas com a certeza de que pode fazer o que quiser desestabilizam Kate. E isso é só o começo do buraco em que a protagonista se meteu: se não se sente confortável para falar sem ser silenciada ou desmentida, como sair da espiral que seguirá o filme? É a partir dessa encruzilhada emocional que o terreno de Kate é armado e entra a metáfora (talvez mais direta que uma metáfora propriamente dita) da violência de gênero e do assédio.
O problema é que Os Órfãos fica no meio do caminho. Nem se foca na tentativa de uma analogia com um terror sobrenatural sobre o terror cotidiano do assédio, mas também não trabalha com o zelo necessário a maneira de contar essa história, abusando de clichês e truques, às vezes repetidamente numa mesma cena. O resultado disso soa confuso e pode passar como apenas mais um terror genérico com atores promessas.
HOJE NOS CINEMAS
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