quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Cracolândia | 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo


O filme dirigido por Edu Felistoque é realmente um documentário para se assistir e sair pensando sobre a situação crítica que se tornou a Cracolândia em São Paulo. Investigando, analisando comparando e tentando colocar na tela milhares de perspectivas, desde usuários e ex- usuários, a psicólogos, sociólogos, cientistas políticos, pesquisadores, ativistas, juízes, coordenadores de programas anti-drogas, policiais, chefes e assessores do departamento de saúde da capital paulistana a muito outros, a produção não só questiona, como também dá soluções e até exibe como casos internacionais similares foram resolvidos na Suíça e na Noruega, países com alta taxa de desenvolvimento econômico

Para aqueles que não estão ligados na programação da mostra, CRACOLÂNDIA tem exibição hoje, às 20 horas, direto da plataforma do Sesc Digital e merece muito a sua atenção.

Trailer


Ficha Técnica

Título original e ano: Cracolândia, 2020. Direção: Edu Felistoque. Diretora assistente: Marina Franzolim. Produtora e Assistente de direção: Antônia Levy. Gênero: Documentário. Diretora e diretores de fotografia conceitual: Elisa Souza, Willian Prado, Edu Felistoque. Operadoras e operadores de câmera: Elisa Souza, Bettina Hanna, Marina Franzolim, Victor Dias Willian Prado. Operador de câmera de frente: Oslaim Brito/Canal Brito.Técnico de Som Direto: Marcos Ventura. Editor Offline: Gab Felistoque. Montadora e montador – Corte final: Raffy Dias e Edu Felistoque.Montadoras – Primeiro e segundo cortes: Sarah Trevisan, Marina Franzalim. Supervisor de Color Grade: Marco Oliveira (Core). Colorista: Leco. Criador de trilha sonora original: Guilherme Picollo. Desenhistas de som e mixadores: Guilherme Picollo, Lucas Costabile. Finalizadora: Marina Franzolim. Produtora e Produtores Executivos: Denise Castelano, Júlio Meloni, Victor Dias, Sergio Martinelli, Edu Felistoque, Eduardo Cattai. Produção: Felistoque Filmes. Coprodução: Spcine. Distribuição: O2 PlayDuração: 87'

O filme se inicia comparando imagens que exemplificam o crescimento acelerado que essa terra de ninguém teve dos anos 80 até os dias atuais. Número que hoje chega a 3000 pessoas circulando pela área por dia, uma massa com um pouquinho de fermento que virou um problema enorme. O narrador então diz que o assunto sempre gera polêmica ou sempre é deixado de lado por ser um incômodo e deixar os ânimos das pessoas muito a flor da pele, o que faz muito sentido já que a sociedade se sente atacada, mas não faz nada para resolver.


Passamos por todo o documentário com a companhia do cientista político Heni Ozi Cuckier  e este nos leva a assistir suas conversas com profissionais da área da saúde ou do campo da educação, segurança pública, governo e afins. Ele revela que a situação tem dois lados claros o da assistência social a quem vive ali e o da repressão onde se pensa em bater, prender e punir tais pessoas. Porém ele aponta que é preciso pensar como um todo na segurança pública e então ouvimos um policial civil relatar como os oficiais ao tentarem fazer entradas na Cracolândia são atacados - e mais a frente é revelado que equipes de saúde também sofrem do mesmo mal. Fala-se também na questão do crime organizado comandar o local e até levar pessoas sequestradas para lá ou ainda drogas e armas e mesmo que uma base policial esteja ali perto a dificuldade de combater e erradicar a Cracolândia é óbvia pela perca do controle.


Ao vermos discursos políticos de ex-prefeitos da cidade de São Paulo ou até do atual governador, João Dória, sentimos como nenhuma daquelas falas realmente entende o problema e sabe como tratar dele. Sejam tais políticos de qualquer corrente ideológica. Na sequência, escritores, psiquiatras e sociólogos apresentam dados estatísticos sobre como o craque afeta uma quantidade grande de pessoas e não só os usuários como suas famílias sofrem com essa situação. Abordam também os problemas graves que ele cria a partir do tráfico da droga como o aliciamento desses usuários que até chegam a se prostituir para consumi-lo e como ele também atrai pessoas de distintas idades e sexos.




É explicado que a droga em si é uma variação da cocaína sendo que aquela se injeta ou se cheira e o craque se fuma. Este provoca uma sensação muito intensa e que tende a exigir daquele que o experimenta a necessidade de mais e mais, pois o escapismo que surge dali traz prazer. Por isso, a conversa chega ao ponto da prevenção e de como as pessoas a margem da sociedade precisam ter acesso a cultura, lazer e ainda orientações espirituais. Algo que muitos daqueles que ali estão talvez nunca tiveram. 


A Cracolândia despertou o interesse de muita gente e é interessante ver como algumas ONGs tentam trabalhar em prol da defesa daquelas pessoas e do seu direito a escolha, mentalidade que pode ser complicada de se relacionar ao falar de indivíduos que não tem mais o controle da própria vida. O ativista responsável pela ONG ''Craco Resiste'' também compara o uso do craque ao álcool e traz pontos controversos e muitas vezes difíceis de se salvar. 


Se temos todo um grupo preocupado e debatendo um assunto tão relevante, vez ou outra, ouvimos relatos escabrosos de usuários da droga e de como eles avaliam suas jornadas ou do que viram dentro da Cracolândia - abortos, prostituição, estupro, roubo, tentativa de assassinato e etc. Sua relação perdida com familiares também é pauta aqui.

E quando se fala no quadro jurídico do que acontece, é lembrado como as leis no país por anos começaram a suavizar a vida do traficantes, principais donos do lugar. Logo, se entende que impunidade virou moda e começou-se a alimentar essa rede até porque a droga é um negócio que gera lucro. Outro quadro que se comenta e se critica é o papel da mídia e do cidadão comum. A primeira sempre focando nas ações violentas realizadas ali e o segundo muitas vezes revelando se sentir mais protegido pelo crime organizado do que necessariamente pela polícia. O papel a primeira, é fácil. Vender jornal sempre foi importante e o trabalho da polícia nem sempre é tão estrategicamente pensando no social dai se vê o porquê a fala das pessoas comuns.


O filme tem uma visão bem detalhista e apresenta ideias práticas, fala de intervenção, apresenta dados de outros países onde foram criadas clinicas para o uso controlado de drogas e prevenção a doenças e surtiu um efeito positivo, até mesmo reduzindo o uso, porém lá o número de usuários também já era menor, diferente do que vemos aqui. Consegue discorrer ainda sobre como as mudanças constantes dos programas do governo não tem credibilidade e nem mesmo quem é atendido acredita nele e que só com uma politica integrada é que esse cenário pode chegar a ser menos aterrorizante.

Portanto, é importante refletir sobre como aquele usuário quando sai do seu lugar de escória e tenta retornar a sociedade é julgado e não se sente nem um pouco seguro ali. Nem menos tem uma mão amiga. Assim, seria necessário reconhecer a doença grave que temos em nosso país e humanizar aquelas pessoas. Saber de cada um ali o que eles realmente precisam. Além de olhar fundo e verificar se a sociedade também faz autoanálise da sua pouca ação diante disto tudo. 

Felistoque tem em sua filmografia os filmes: Zagati (2001, 26ª Mostra), Soluços e Soluções (2001), Musicagen (2007, 29ª Mostra), Trilhos Urbanos (2007), Inversão (2010) e Insubordinados (2013, 38ª Mostra). Também produziu o filme 400 Contra 1 - Uma História do Crime Organizado (2010), de Caco Souza, e dirigiu a série Bipolar (2010) e aqui com entrega um filme racional e equilibrao.


Serviço:

CRACOLÂNDIA – 44ª MOSTRA INTERNACIONAL DE CINEMA EM SÃO PAULO

ESTREIA 29 DE OUTUBRO, ÀS 20h

Um filme de Edu Felistoque

See Ya!
B-

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