Vitor Martins é escritor. E ilustrador. E tradutor. Mas para mim, mais do que nada, ele é especialista em deixar o coração da gente quentinho.
Recentemente, seu terceiro livro, “Se a Casa 8 Falasse”, foi lançado, e fui ler já certo de que faria do meu dia algo mais leve e colorido. É claro que a expectativa foi cumprida! O Vitor nunca decepciona. Terminei a obra e PRECISAVA escrever sobre ela. Minha ideia é também falar um pouco de outros trabalhos dele. Farei isso, porém será algo mais extra, pois a resenha da casa 8 ficou longa e não lembro de detalhes dos outros dois que ele já publicou para fazer algo do mesmo tamanho kkkk (eu não sei como funciona a memória de vocês, mas eu sempre lembro mais de como eu me senti vendo/lendo algo do que especificidades da história).
Mas primeiro....
Uma das maiores vozes que surgiram nos últimos anos quando se fala de literatura YA brasileira, especialmente LGBT. O Vitor não é só um dos meus autores preferidos como também me apresentou – via redes sociais, claro - a outros autores que hoje são também meus prediletos, como o Shaun David Hutchinson.
Ele cresceu em Friburgo, no Rio de Janeiro, onde estudou Jornalismo, mas hoje mora em São Paulo com seu namorado e dois gatos, Clarêncio e Sonic. Ele tinha um canal no youtube, que inclusive foi bastante importante para a divulgação inicial de 15 Dias, seu primeiro livro. Mas hoje infelizmente está desativado. Tudo bem, porque ele é super ativo nas redes sociais (eu o acompanho muito no twitter e goodreads) e super recomendo que o sigam porque vocês – assim como eu – vão ficar morrendo de vontade de serem amigos dele haha.
RESENHA – SE A CASA OITO FALASSE
Ano de lançamento: 2021
Editora ALT
336 Páginas
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O Vitor diz nos agradecimentos (e também falou uma vez no twitter) que ficou com medo dos leitores acharem que no livro os personagens só conversam e nada acontece. Mas, olha, assim como ele escreve que a casa na verdade somos nós, as melhores histórias para mim são aquelas em que os personagens movem a trama. E minha deusa, eu simplesmente me APAIXONEI por cada um dos personagens. A começar pela narradora da história, A CASA, que tem as melhores piadas que eu já vi serem contadas. A história se passa em três anos diferentes: em 2000, em 2010 e em 2020; e a dita cuja faz um recorte da vida de quem está morando lá naquele ano. É uma narrativa deliciosa e muito inventiva. Simplesmente amei a ideia de trazer o olhar de um imóvel e fiquei pensando o que minha casa diria de mim haha.
Em 2000, conhecemos Ana e seu pai, Celso. Celso trabalha com TI e é muito divertido ler sobre uma pessoa que apostava no futuro da computação enquanto a maioria olhava com uma visão cética. Ele é pai solo, pois sua esposa faleceu no parto da filha deles, Ana. A menina carrega a culpa pelo que aconteceu com a mãe e também alguns segredos: não devolveu um CD do Blink-182 que foi emprestado a ela, meio que canta Backstreet Boys no banho e tem uma namorada. Eu adorei o relacionamento da Ana com o Celso. Eles sempre tiveram um grande afeto um pelo outro, mas mantinham muitas palavras não ditas, o que acabava os afastando. Ao começar o livro, achei que o arco da Ana seria mais sobre o “armário” e tal e felizmente fui surpreendido. É muito sobre aproximações e partidas. Tudo o que Leticia fala para Ana é maravilhoso e me deixou bem reflexivo, já que eu sempre fui alguém quem deu mais peso para o “perder” do que para o “já ter tido”.
Em 2010, acompanhamos Greg, que foi passar uns dias na casa 8 porque seus pais não queriam que ele presenciasse a bagunça do divórcio do casal. Greg não sabe muito bem o que esperar, pois não tem tanto contato com a tia, mas acaba encontrando um lugar que o faz se sentir acolhido. O romance nessa parte também é bem fofo, mas o que mais gostei foi a construção de uma noção de lar e a descoberta de um afeto acolhedor por parte do Greg
Além disso, se tem uma coisa que o Vitor Martins consegue fazer muito bem é colocar referências na trama. Elas são tão pontuais que nos aproximam ainda mais dos personagens sabe? Não é difícil, por exemplo, se apegar à Catarina, uma mulher que apoia os amigos, luta para manter viva uma locadora em 2010 e é amada pela vizinhança. Mas é ainda mais fácil amar essa personagem quando o nome do cachorro dela é Keanu Reeves! O livro todo tem ótimas referências e sacadas, mas as de 2010 em especial são fantásticas.
De todos os personagens, aquele com o qual eu mais me identifiquei foi o Beto, o protagonista da trama de 2020. Ele mal pode esperar para se mudar para São Paulo, pois sente que finalmente sua vida vai COMEÇAR (eu sempre lembro de Enrolados quando penso isso, e “I keep wondering and wondering when will my life begin” começa a tocar na minha mente). Só que a pandemia aconteceu, então ele ficou preso na casa 8 com sua mãe e sua irmã, que volta de São Paulo para passar a pandemia com a família. Mais uma vez, o desenvolvimento dos relacionamentos é maravilhoso. Adorei o propósito do Beto e da Lara em fazer uma coisa nova por dia (e é algo que estou pensando em aplicar na minha vida. Inclusive se eu aparecer de cabelo azul ou roxo culpem o Vitor Martins).
Eu gostei bastante também do desenrolar do relacionamento do Beto com o cursh virtual, Nicolas (algo que é bem 2020). Eu tenho um grupo enorme de amigos (e também um crush) que moram longe e acho que é muito bem possível manter esses relacionamentos sem a presença física da pessoa. Continua sendo real e intenso. Mas eu entendo todos os conflitos do Beto e a conduta do Nicolas. Na real, achei que ao longo do livro, todos os personagens tiveram atitudes muito maduras.
Já devem ter percebido que para mim, desta vez o forte do livro não são exatamente os romances, mas os relacionamentos como um todo e a construção dos personagens. Fiquei tão apegado a todos que acho que vai demorar até eles saírem do meu imaginário! Queria real ter um grupo no whatsapp com todos para continuar recebendo update da vida deles. E queria mais histórias dos moradores da casa 8!
Mais uma vez Vitor Martins nos presenteia com um livro aconchegante, apaixonante, emocionante e muito divertido. Mal posso esperar pelo próximo! O Vitor disse no twitter que o plano dele é que as lombadas de seus livros formem um arco-íris e eu MAL POSSO ESPERAR PARA TER TODOS ELES NA MINHA ESTANTE.
QUINZE DIAS
Ano de lançamento: 2017
Editora ALT
208 Páginas
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Quinze dias começou como uma releitura de A Bela e a Fera, mas aos poucos foi ganhando vida própria e se dissociando da inspiração inicial. Mas alguns elementos do conto de fadas permaneceram na história: um protagonista que se enxerga como uma fera, um interesse romântico belo e uma situação de convivência forçada.
Felipe é um adolescente gordo, que tem uma longa lista de inseguranças, autoestima baixíssima e perseguidores que fazem da sua vida um inferno na escola. Por isso, ele está bem animado para passar as férias em paz no seu quarto vendo suas séries preferidas. Seus planos são abalados quando o vizinho (e crush) Caio vai passar duas semanas na sua casa, enquanto os pais dele viajam. Felipe acha que alguém como Caio jamais vai se interessar por ele, mas vai descobrir que muitas vezes enxergamos a nós mesmos com uma lente manchada e que ele tem muito mais valor do que se dá crédito.
“Quando comecei a escrever Quinze dias, tudo o que eu tinha era a vontade de escrever uma história de amor com um protagonista gordo. Queria que fosse um livro divertido, como uma comédia romântica que a gente assiste para esquecer que o mundo é horrível”
E é esse mesmo o feeling do livro. Eu li de uma sentada só, em uma madrugada que não conseguia dormir. A história trata de temas sérios e delicados, mas de uma forma tão dinâmica que a leitura se torna leve. E muito prazerosa. Eu me identifiquei muito com o Felipe, pois sempre me senti “indesejável” e minhas inseguranças são muito parecidas com as dele. Me senti muito acolhido por esse livro!
A obra foi um grande sucesso. Foi traduzida e lançada em outros países e já teve seus direitos vendidos para uma adaptação audiovisual!
UM MILHÃO DE FINAIS FELIZES
Ano de lançamento: 2017
Editora ALT
208 Páginas
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Também carinhosamente conhecido como piratas gays!
Arrisco em dizer que a maioria das histórias gays juvenis que existem por aí são histórias focadas no “armário”. É claro que é uma fase muito impactante na vida da boa parte dos jovens gays, mas não acho que seja tão positivo resumir a experiência gay em só isso, sabe? E muitas vezes é isso que acontece: ser gay é visto somente como sinônimo de dor e sofrimento. Eu gosto bastante que os livros do Vitor trazem leveza e felicidade e fogem um pouco da narrativa dos traumas do armário. Porém, seria desleal só fingir que é algo que não existe. Afinal, quantas pessoas não foram profundamente marcadas pelos anos se escondendo e com medo de rejeição? (eu incluso, por muuuito tempo).
“Um Milhão de Finais Felizes” traz um contexto bem dramático e comovente. Jonas, o protagonista do livro, vive em um ambiente conservador e sabe que não vai ser aceito por sua família. O que é injusto, doloroso e nocivo. A verdade é que o armário funciona muito como um mecanismo de defesa. Mas também te fere. Felizmente, “família” não é só onde a gente nasce, mas também quem a gente escolhe e o Jonas tem um sistema de apoio maravilhoso na figura de Karina, A MELHOR AMIGA EVER! Que personagem incrível.
É claro que o livro não é só drama. Tem um romance fofíssimo do Jonas com Arthur, um moço de barba ruiva que é um sonho e leva Jonas a perceber que não quer ficar para sempre refém das expectativas dos pais.
ESCRITO EM ALGUM LUGAR
Ano de lançamento: 2019
48 Páginas
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Pera. Cadê os piratas gays que você falou no começo? Acontece, meu caro leitor, que Jonas é escritor e encontrar Arthur o inspira a escrever uma história de aventura de piratas apaixonados. E aí a gente tem uma história dentro de uma história! Não achei que acrescenta tanto ao plot principal, mas é bem divertido (e merecia seu próprio spin off a la “Carry On”, da Rainbow Rowell)
Ano de lançamento: 2019
48 Páginas
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Esse aqui é um conto curtinho, mas muito fofo. O conto mostra o encontro de Antônio e Gustavo na fila para comprar ingressos do retorno de uma boyband da época da adolescência deles. A inspiração para a história veio com o anúncio da volta dos Jonas Brothers. Eu nunca fui fã dos Jonas, mas me identifiquei muito porque eu fui fã de literalmente toda moda adolescente: Sandy & Jr (fui no show em 2019 e quase MORRI do coração de felicidade), Spice Girls, RBD, Floribella, Harry Potter, Rouge... e eu sou pisciano, então sou uma pessoa muito nostálgica. Eu também tenho gostos muito teens no geral até hoje haha. Às vezes sinto um pouco de vergonha tendo 30 anos na cara e assistido Chiquitas com minha irmã, mas é minha vida e me faz feliz haha.
E é isso, gente! Esse post é não só uma recomendação, mas também uma verdadeira carta de agradecimento ao Vitor Martins. Eu acho lindo que hoje em dia o público mais jovem LGBT consegue se ver representado; e enxergar possibilidade de futuro em ser quem são. Eu queria tanto ter tido histórias assim na adolescência. Iria me poupar muito trauma! Os livros do Vitor (tanto os que ele escreve quanto os que traduz ou divulga) são muito importantes nesse sentido. Espero que aqueçam o coração de vocês tanto quanto aquecem o meu!
Love, Vitor
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