Ficcionalização em cima das reais ocupações de estudantes secundaristas acontecidas no ano de 2015, Selvagem aposta em protagonistas neutros para apresentar a questão central ao público. Ao invés de focar em Mirela (Érica Ribeiro), Bruna ou Janaína (Juliana Gerais), estudantes que abraçam a causa da ocupação com unhas e dentes, o longa-metragem foca em Sofia (Fran Santos) e Ciro (Kelson Succi), jovens que a princípio não são politizados e são convencidos a fazer parte do movimento aos poucos, enquanto entendem a importância das demandas estudantis.
Embora tal abordagem ganhe pontos com o espectador também "neutro", a narrativa poderia ganhar mais brilho com personagens mais carismáticos. E não é só à Sofia e Ciro que falta carisma, mas também a suas performances. A direção se mostra inexperiente na condução de um elenco também inexperiente e o resultado é a falta de unidade nas atuações. Enquanto as já citadas Mirela, Bruna e Janaína e até Josué costumam mostrar controle de cena e naturalidade, os protagonistas penam para consegui-lo. Mas mesmo os atores que de forma geral estão bem, sofrem com a direção inexperiente em alguns momentos. Um exemplo é justamente a primeira cena. A abertura, que deveria causar impacto, mostra o close de diversos alunos que, cada um à sua maneira, tentam sem sucesso passar a ideia de revolta ao dilatar as narinas e contrair a testa.
No entanto, o apreço pelos protagonistas tende a aumentar ao longo da trama enquanto estes amadurecem. E a direção, a despeito do que foi pontuado, mostra-se primorosa na construção de sequências complexas de ação e também da batalha de rap. Momentos como esse saltam aos olhos a ponto de nos fazer desejar que fossem mais numerosos. Porém, Selvagem nunca se entrega de vez a uma linguagem mais ousada e escolhe focar no didatismo como fio condutor.
Outro acerto da obra consta na representatividade da juventude. Não apenas na variação de corpos e tons de pele, mas também na exposição de realidades sociais diversas e, principalmente, na composição de diferentes tipos comportamentais. O roteiro contorna bem o erro de mostrar adolescentes como uma massa homogênea ou dividi-los apenas entre extrovertidos descolados e tímidos oprimidos. Isto ajuda a tornar os personagens e, consequentemente, a própria ocupação, algo crível e verossímil.
Ainda que o filme tropece em alguns momentos na falta de ritmo, o final surpreende positivamente nesta questão. O retorno à sequência inicial, agora com a consequência dramática de se conhecer a história a fundo, traz uma densidade bem vinda. A cena final de Sofia com o novo professor de física é poética e passa a mensagem de que o desejo de revolução não morre com a repressão policial. É louvável que Diego da Costa traga à tona um período tão importante da nossa história recente que jaz já tão esquecido por grande parte da sociedade e da mídia.
Trailer
Título original e ano: Selvagem, 2021. Direção e roteiro: Diego da Costa. Elenco: Vilma Melo, Lucélia Santos, Dagoberto Feliz, Rincon Sapiência, Fran Santos, Kelson Succi, Juliana Gerais, Paulo Pinheiro, Érica Ribeiro, Rafael Imbroisi, Everson Anderson, Jady Maria Bandeira. Gênero: Drama. Nacionalidade: Brasil. Fotografia: vanna Pezzo. Edição e mixing: Eduardo Barbosa e Fernando lanni. Direção de Arte: Patrícia Passos. Distribuição: Pietà Filmes. Duração: 01h35min.
Saiba onde assistir:
· São Paulo-SP - Espaço Itaú de Cinemas Frei Caneca
· Rio de Janeiro-RJ - Espaço Itaú de Cinemas Botafogo
· Porto Alegre-RS - Espaço de Cinema Bourbon Country
· Salvador-BA - Cine Metha Glauber Rocha
· Belo Horizonte-MG - Una Cine Belas Artes
· Brasília-DF - Espaço Itaú de Cinemas Casa Park
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