quarta-feira, 27 de julho de 2022

Um Herói, de Asghar Farhadi


Depois do longa Todos Já Sabem (2018) filmado na Europa e falado em espanhol e inglês, Asghar Farhadi retorna à sua língua, sua terra natal e ao seu tom costumeiro de contar histórias em Um Herói. Neste último filme, que será lançado comercialmente neste dia 28 de julho, o diretor relembra aos cinéfilos o gostinho de tensão e suspense trazido anteriormente em O Apartamento (2016) e A Separação (2011).

O longa se inicia com uma sequência em que o protagonista deixa a prisão e caminha longamente até uma grande obra onde trabalha seu cunhado. Em silêncio e sob um sol escaldante, Rahim gasta um tempo considerável de seus dois dias de indulto da cadeia neste trajeto, que é apenas o começo de uma jornada para tentar anular sua pena.

Preso por dever dinheiro a um familiar de sua ex-esposa (algo que, no país, é um crime que se procede mediante queixa), Rahim tentou convencer seu credor a aceitar o pagamento da dívida de forma parcial e parcelada. Mas o homem já está farto das promessas do agregado e está convicto de que ele deve cumprir sua pena a menos que devolva o valor integralmente e com juros.

Rahim precisa de um milagre. Algo como encontrar uma bolsa perdida cheia de moedas de ouro. E é isso que lhe acontece. Porém, o personagem se compadece da pessoa que perdeu os pertences e os devolve (não sem antes titubear um pouco e tentar negociar com o credor). Ao saberem do ato de bondade, os diretores da prisão informam a mídia, que logo faz uma matéria com Rahim. A situação se escalona rapidamente. Logo o protagonista recebe outro indulto, uma promessa de liberdade, oferta de emprego, diploma de mérito, é reconhecido na rua por ter passado na TV e é ajudado por uma instituição filantrópica a levantar fundos para abater seu déficit. É como um segundo milagre, ainda maior que o primeiro.


Rahim é alçado ao posto de herói nacional. Porém, a mídia e as redes sociais agem como costumam agir: se aproveitam da história, exploram seus detalhes, mastigam-na até não sobrar mais nada e então, antes que os 15 minutos de fama do homem acabem e ele desapareça novamente no anonimato, é levantada a hipótese de que o herói na verdade seja um pária, um mentiroso. Novamente a situação escalona-se rapidamente. Deslizes do personagem são usados contra ele. Conflitos de terceiros envolvem-se na trama.

Soma-se às acusações, a carga que a honra e a moral têm na sociedade iraniana. Os parentes de todos os envolvidos preocupam-se com a imagem de suas famílias. Rahim passa a temer mais a humilhação que o retorno à prisão. Os dilemas que as figuras enfrentam transformam-se também em um dilema para a audiência.


No que acreditamos ser o clímax, nos sentimos impotentes, nos bastando apenas torcer para que as coisas se resolvam e tudo dê certo. Mais adiante, deixamos de torcer. Não há para quem. Não há solução correta. A situação é como um lençol curto, que se é puxado de um lado, deixa o restante descoberto. Não há como contemplar as necessidades de todos os personagens. E, ainda, não conseguimos escolher com assertividade quem apoiar, visto que são todos muito humanos. Dúbios, falhos e extremamente propensos a identificação.

Trailer


Ficha Técnica

Título original e ano: Ghahreman, 2021. Direção e roteiro: Asghar Farhadi. Elenco: Amir Jadidi, Mohsen Tanabandeh, Sahar Goldust, Fereshteh Sadre Orafaiy, Sarina Farhadi, Ehsan Goodarzi, Alireza Jahandideh, Maryam Shahdaei. Gênero: Drama, suspense. Nacionalidade: Irã, França. Trilha Sonora Original:  Rymin e Ariyan Islam Rafi.Edição: Hayedeh Safiyari. Direção de Fotografia: Ali Ghazi. Montagem: Haydeh Safiyari Produção: Alexandre Mallet-Guy, Asghar Farhadi. Distribuição: Califórnia Filmes. Duração: 127 minutos.

A película recebeu 37 indicações em diversas premiações e festivais e saiu vencedora em 12 delas. Foi ganhadora do Festival de Cannes, em 2021, na categoria do "Grande Prêmio do Júri" e também levou o "Prêmio François Chalais", conferido a filmes com valor afirmativo sobre a vida e o jornalismo. O longa teve exibição na última edição da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo e no Festival de Cinema do Rio e foi a escolha do Irã para a submissão do país na categoria de "Melhor Filme Internacional" no Oscar deste ano

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