APRESENTAÇAO ESPECIAL
Exibido no Festival de Cannes
Baseado tragicamente em fatos do passado, "A Esposa de Tchaikovsky" é uma sofrida história sobre abandono, irresponsabilidade afetiva, homofobia e amor não correspondido. Mais um grande filme do diretor Kirill Serebrennikov, este filme soma-se a Verão (2018) e A Febre de Petrov (2021) como exemplos da pujança e coragem do cinema russo, mesmo que sob a mira de lideranças políticas autoritárias.
Tchaikovsky (Odin Lund Biron), o grande compositor russo do século XIX, é um homossexual enrustido nos salões da nobreza de São Petersburgo e Moscou. Antonina (Alyona Mikhailova), ingênua e religiosa estudante de música, apaixona-se perdidamente pelo gênio da música. Tchaikovsky, após muita insistência da enamorada, casa-se com ela por causa do dote e para fugir da maledicência da sociedade. Como já era de se esperar, o casamento nunca foi consumado e após algumas semanas, o compositor, após um colapso nervoso e bloqueio criativo, abandona para sempre a esposa.
Estas poucas semanas de casamento consomem a vida de Antonina. Incapaz de aceitar a verdade sobre o marido, consumida por um amor infinito, recusa-se a se divorciar, dedicando o resto da vida a tentar reconquistar o seu amado. Tchaikovsky continua sua carreira brilhante, tornando-se um dos pilares da música clássica ocidental, enquanto Antonina definha, consumida pela dor e pelo amor não correspondido. Amasiada com seu advogado, gera crianças mas as abandona em orfanatos, com a vida sempre em compasso de espera, no aguardo de alguém que nunca retornará.
Ficha Técnica
Título original e ano: Zhena Chaikovskogo, 2022. Direção e Roteiro: Kirill Serebrennikov. Elenco: Alyona Mikhailova, Odin Lund Biron, Miron Fedorov, Yuliya Aug, Filipp Avdeev, Andrey Burkovskiy. Gênero: Biografia, Drama. Nacionalidade: Rússia, França e Suiça. Trilha Sonora Original: Daniil Orlov. Departamento de Som: Vasiliy Fedorov. Montagem: Yuriy Karikh. Fotografia: Vladislav Opelyants. Design de Produção: Vladislav Ogay. Produtoras: Hype Film, Charades Productions, Logical Pictures, Bord Cadre Films. Produtor: Ilya Stewart. Distribuição: Imovision. Duração: 02h23min.
A atriz Alyona Mikhailova interpreta brilhantemente a esposa. Em um roteiro multifacetado, presenciamos a ingenuidade, determinação, ninfomania e paranoia desta personagem histórica, que foi tratada pelos biógrafos do marido como uma louca obsessiva, insistente perseguidora do amado famoso.
Com as licenças poéticas de um roteiro de ficção, Antonina, nestas duas horas e meia, desce aos infernos da existência humana, assombrada por paranoias, depressões e doenças. A fotografia belíssima emoldura estas cenas em sequências surreais e alegóricas. Há muito de erotismo masculino em pauta, inclusive com muitos nus frontais, ainda raros nas telas de cinema. As sequências com os mendigos nas portas da igreja lembram bastante o humor e empatia com que Buñuel os representava em suas obras-primas. A cena final de dança, com muitos homens despidos e uma Antonina desaparecendo no escuro de uma viela, após a morte do amado Tchaikovsky, é trágica e belíssima.
A verdadeira Antonina, após a morte de Tchaikovsky por cólera, passou vinte anos em um asilo para loucos. Como até hoje, o sofrimento feminino ainda é rebaixado à loucura. Culpada por amar demais alguém que não poderia lhe corresponder, a esposa tem aqui uma biografia ficcional à sua altura. Uma trágica história de amor, sonorizada pela trilha genial das peças imortais do grande compositor russo Tchaikovsky.
Nota: 9/10.
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