“Podemos conhecer muito sobre uma pessoa com base no
que encontramos no dreno da piscina dela”…
Definitivamente, Jennifer Lawrence é uma atriz que não precisa provar mais nada para ninguém: com pouco mais de trinta anos de idade, ela já foi indicada ao Oscar quatro vezes, recebeu um desses troféus, ganhou diversos outros prêmios e participou tanto de superproduções de ação quanto de dramas independentes. Neste sentido, a sua eventual associação a esse segundo tipo de filme não tem a ver com testes de validação pela Crítica, mas sim com uma afeição pessoal. Por ser uma das atrizes mais eloqüentes de sua geração hollywoodiana, ela dispõe de uma considerável capacidade de escolha, de modo que são compreensíveis os motivos que levaram-na a não apenas protagonizar “Passagem”, de Lila Neugebauer, mas também a participar como produtora.
Trata-se de um filme com algumas similaridades produtivas em relação a “Inverno da Alma” (2010, de Debra Granik), que rendeu-lhe a primeira indicação ao Oscar, ainda muito jovem. Tanto num como no outro, a atriz interpreta uma moça solitária, lidando com as agruras do ambiente ao seu redor. Se, lá, a abordagem era rural, aqui, a perspectiva é suburbana, pois sua personagem cresceu numa cidade pequena e sente-se deslocada em relação à sua mãe (Linda Emond), que a trata com relativa frieza.
Após sofrer uma lesão grave no Afeganistão, onde servia como militar, essa personagem, Lynsey, submete-se a várias sessões de fisioterapia e precisa testar diariamente as suas capacidades de memória. Inicialmente, ela é acolhida por Sharon (Jayne Houdyshell), uma espécie de enfermeira voluntária que ajuda soldados com necessidades de recuperação. Obrigada a medicar-se com freqüência, Lynsey faz de tudo para convencer o seu médico (Stephen McKinley Henderson) que está apta a voltar para as Forças Armadas. Motivo: ela não se sente nem um pouco à vontade na cidade onde morava…
Depois de conseguir um emprego como limpadora de piscinas, Lynsey faz amizade com um mecânico de nome James (Brian Tyree Henry, numa atuação excepcional), que também enfrenta uma chaga relacionada a um acidente: ele perdeu uma das pernas numa colisão automobilística que causou-lhe também a perda de um parente. Pouco a pouco, eles aproximar-se-ão mais e mais, até que uma revelação acerca da sexualidade de Lynsey redefine os contatos entre eles. Como não se apaixonar por Jennifer Lawrence, afinal?
Créditos: Divulgação
A produção foi rodada no verão de 2019
Apesar de este ser o longa-metragem de estréia da diretora, ela já possui uma carreira consolidada como realizadora teatral e conduziu alguns episódios em seriados televisivos com temáticas feministas. Em “Passagem”, ela permite ao público uma comunhão muito próxima com os dilemas da protagonista, que tenta desesperadamente fugir de si mesma, até encontrar alguém que precisa muito reencontrar a si mesmo. Os diálogos entre Lynsey e James são leves e graciosos, a despeito das cicatrizes que ambos possuem. Entretanto, notamos forçação actancial de barra em dois momentos específicos: um envolvendo a queda de um sorvete; outro, um beijo casual. Em ambos os momentos, a atriz protagonista abandona a delicadeza de sua composição e exagera na dramaticidade planejada para arrebatar prêmios. Mas são instantes isolados. Afora eles, o tom da interpretação de Jennifer Lawrence é contido e mui elogiável.
O título original do filme, ‘Causeway’, refere-se às pontes ou ferrovias construídas sobre lagos ou mares. Foi onde aconteceu o acidente que vitimou James e serve como metáfora para os esforços de Lynsey em recuperar a forma física, visto que ela trabalhava numa divisão aquática. Em dado momento, ela confessa a seu amigo que, desde pequena, acostumou-se a prender a respiração debaixo d’água. Gradualmente, compreendemos que a sua angústia familiar tem a ver com um irmão que viciou-se em drogas. Somente no desfecho compreendemos tudo, quando a sutil trilha musical de Alex Somers instala-se definitivamente em nossas mentes, confirmando o charme delicado desse filme pequeno, mas cheio de anseio pela vida. Recomendamos, inclusive terapeuticamente!
Trailer
Ficha Técnica
Título original e ano: Causeway, 2022. Direção: Lila Neugebauer. Roteiro: Ottessa Moshfegh, Luke Goebel e Elizabeth Sanders. Elenco: Jennifer Lawrence, Danny Wolohan, Jayne Houdyshell, Neal Huff, Han Soto, Natalie Pilie, Linda Emond, Frederick Weller, Brian Tyree Henry, Sean Carvajal e Stephen McKinley Henderson. Gênero: Drama. Nacionalidade: EUA. Trilha Sonora Original: Alex Somers. Fotografia: Diego García. Edição: Robert Frazen e Lucian Johnston. Design de Produção: Jack Fisk. Figurino: Heidi Bivens. Produtora Executiva: Patricia Clarckson. Produtora: Jennifer Lawrence. Produtoras: A24, IAC FILMS, Excellent Cadaver e IPR.VC. Distribuidor Internacional: AppleTV+. Duração: 01h32min.
Assista no APPLETV+
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