“O que tu achas que aprendeste vendo pornografia é exatamente o contrário do que causa prazer em uma mulher”
Uma leitura rasteira da sinopse faz com que teçamos alguns paralelismos com o longa-metragem britânico “Boa Sorte, Leo Grande”, de Sophie Hyde (leia texto aqui), visto que ambos lidam com as questões referentes à redescoberta do prazer sexual em mulheres com mais de cinqüenta anos de idade. A perspectiva adotada por este filme australiano é diferente, visto que enfoca o controle empresarial dos garotos de programa. E, ainda que percebamos uma tônica indubitavelmente feminista, essa está atrelada ao empoderamento monetário. Ao menos, isso não é escamoteado…
Na primeira seqüência, a protagonista Gina Henderson (Sally Phillips) interage com suas amigas num vestiário, depois de nadarem num lugar paradisíaco, porém infestado por águas-vivas. É o seu aniversário e, quando perguntam o que ela deseja fazer nesse dia, a resposta é taxativa: “não ter mais aniversários”. Ela percebe que, em seu ramo empregatício, quanto mais velha uma mulher se torna, mais ela é desprezada por seus colegas de equipe. E, de fato, é o que ocorre.
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Quando é chamada ao escritório de seu chefe Brett (Oliver Wenn), Gina pensa que receberá uma congratulação por sua data natalícia, algo que ele nunca fez. E continua sem fazer, afinal: ele pede que ela vá buscar alguns documentos numa firma de mudança com as finanças ameaçadas. Gina trabalha como assessora corporativa e, por isso, tem o poder de decidir quais empresas terão ou não continuidade, a depender de seus rendimentos e contribuições fiscais. Mas ocorrerá uma guinada surpreendente, na rotina então sufocada pelo trabalho desta mulher…
Enquanto presente-supresa de suas amigas, Gina recebe a visita de um ‘stripper’, Tom (Alexander England), que trabalha justamente na empresa de mudanças em que ela estivera mais cedo. Como não está interessada nos favores eróticos que ele oferece, ela pede que Tom limpe a sua casa, o que faz com que, após ficar subitamente desempregada, ela tenha uma idéia que fará imediato sucesso entre as suas amigas. Para saber mais, só mesmo vendo o filme!
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Não obstante a condução da estreante Renée Webster deixar evidente a sua familiaridade com a linguagem televisiva, o filme possui alguns momentos efetivamente divertidos, depois que ele supera a abordagem inicialmente tímida de um entrecho que exige desinibição: há uma cena, por exemplo, em que Gina experimenta um vibrador, graças à colaboração involuntária de um colega de trabalho – e esta é hilária. Mas que também demostra que o roteiro, escrito pela própria diretora, não está preocupado em evitar os clichês típicos das comédias românticas, ainda que o filme não seja romântico em si.
À medida que Gina constata que é bem-sucedida em sua nova ocupação como gerenciadora de prostitutos faxineiros, ela enxerga a profissionalização do sexo como um produto a ser ofertado como qualquer outro e, gradualmente, abandona os seus pudores iniciais. Entretanto, não tem-se a intenção de ultrapassar a barreira do consumo sexual mediante pagamento: exceto pela própria Gina e por um casal de lésbicas recém-encontradas, as demais personagens não recebem uma atenção individualizada. Existem enredisticamente em função de suas contribuições como clientes e/ou treinadoras de orgasmos. Uma das amigas de Gina chega a comentar que os serviços que ela gerencia são “melhores que cocaína, apesar de ter quase o mesmo preço”. Até que ponto o prazer sexual convertido em mercadoria pode ser equiparado a uma droga?
Pena que haja ao menos um elemento mui decepcionante deste filme: o modo como é apresentado o personagem Ben (Josh Thomson), que foge dos padrões masculinos de beleza e, como tal, é direcionado para uma cena vexatória, envolvendo o marido de Gina, Adrian (Cameron Daddo). Enquanto contraponto afirmativo, temos a confissão de uma colega de escritório de Gina, Chloe (Asher Yasbincek), cujas capacidades intelectuais são subestimadas pelo fato de ela ser muito bonita. Porém, a despeito de seus seios volumosos, reclama que possui mamilos insensíveis. Em sentido geral, “Como Agradar uma Mulher” é um filme que não se desvencilha de cacoetes classistas, mas possui aquele charme típico dos filmes independentes australianos. É uma pedida razoável em nosso calor tropical, portanto!
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Ficha Técnica
Título original e ano: How To Please a Woman, 2022. Direção e Roteiro: Renée Webster. Elenco: Sally Phillips, Caroline Brazier, Erik Thomson, Tasma Walton, Alexander England, Hayley McElhinney, Cameron Daddo, Josh Thomson. Trilha Sonora Original: Guy Gross. Fotografia: Ben Nott. Edição: Merlin Eden. Figurino. Lisa Galea Gunning. Design de Produção: Emma Fletcher. Distribuição: A2 Filmes. Duração: 1h47min.
O filme foi ganhador da categoria de ''Melhor Narrativa'' no Toronto International Women Film Festival e também levou um prêmio de mais de um milhão de doláres no West Australian Screen Culture Awards na categoria de inovação. Renée Webster chegou a ser indicada por seu trabalho no filme ao Australian Directors Guild Awards. A película chega esta quinta-feira (29) aos cinemas de São Paulo, Rio de Janeiro, Campinas, Brasília, Belo Horizonte e Bahia.
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