quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Gato de Botas 2 - O Último Pedido | Sessões de Pré Estréia


Considerado um dos contos mais antigos, Gato de Botas foi escrito pelo francês Charles Perrault e publicado pela primeira vez em 1697. A bela história, que tem diversas variações, caiu no gosto popular, e foi recriado em múltiplos formatos nos séculos seguintes. Ganhou fama mundial ao ser incluído no universo Shrek e surgir como personagem no Reino Distante. A DreamWorks Animation transformou o gatinho em um herói fascinante, galanteador, com um sotaque irresistível e aquele inconfundível olhar “pidão”, que esbanja fofura. Impossível não se apaixonar!

O sucesso foi tamanho que em 2011 ele ganhou um spin-off nas telonas só dele que contava sua vida desde quando ainda não usava as famosas botas, sua marca registrada juntamente com a espada certeira que enfrenta qualquer perigo. Gato de Botas 2 - O Último Desejo chega agora para reavivar a eterna chama da infância que existe em cada um de nós. Um sopro de magia, necessário depois de tantas turbulências nestes anos recentes. Um conto de fadas em sua melhor essência! 

Assistir o filme anterior não é pré-requisito para compreender a história atual, mas ajudaria a situar o espectador sobre alguns personagens e situações. Aliás, este consegue a incrível façanha de ter um melhor desenvolvimento que o primeiro, pois tem um viés emocional que é muito bem trabalhado. Com roteiro de Paul Fisher, baseado na história de Tommy Swerdlow e Tom Wheeler, a direção ficou a cargo de Joel Crawford, conhecido por Kung Fu Panda e Os Croods.

Na versão original, temos as vozes de: Antonio Banderas (Gato), Salma Hayek (Kitty), Harvey Guillen (Perrito), Florence Pugh (Cachinhos Dourados), John Mulaney (João Trombeta), Wagner Moura (Lobo), Ray Winstone (Papai Urso), Sansão Kayo (Bebê Urso) e Olivia Colman (Mamãe Ursa). No Brasil, a versão dublada, que por sinal, está excelente, conta com as vozes de: Alexandre Moreno (Gato), Miriam Ficher (Kitty), Marcos Veras (Perrito), Guilherme Briggs (João Trombeta), Giovanna Ewbank (Cachinhos Dourados) e Marco Ribeiro (Lobo).

Trailer

Ficha Técnica
Título original e ano: Puss in Boots 2 - The Last Wish. Direção: Joel Crawford e Januel Mercado. Roteiro: Paul Fisher e Tommy Swerdlow com argumentos de Tommy Swerdlow e Tom Wheeler. Gênero: Aventura, Comédia, Animação. Nacionalidade: EUA. Vozes originais de: Antonio Banderas, Salma Hayek, Harvey Guillen, Florence Pugh, John Mulaney (João Trombeta), Wagner Moura, Ray Winstone, Sansão Kayo e Olivia Colman. Dublagem: Alexandre Moreno, Miriam Ficher, Marcos Veras, Guilherme Briggs, Giovanna Ewbank e Marco Ribeiro. Trilha Sonora Original: Heitor Pereira. Design de Produção: Nate Wragg. Edição: James Ryan. Supervisão de animação: Julien Bocabeille, Larent Caneiro, Willy Harber. Distribuidora: Universal Picutures Brasil. Duração: 01h40min.

Nosso amado gatito continua sendo procurado pela justiça, vivo ou morto. Ainda assim, se transformou em um herói popular, enfrentando vilões e salvando o povo do vilarejo. As cenas de lutas lembram os embates dos “Cavaleiros do Zodíaco”, entregando um dinamismo e colorido característico, que coloca o espectador dentro da cena, como em um vídeo game. 

Como um bom gato, seu ego é maior que o mundo. Seu amor próprio chega às alturas tornando- o seguro e arrogante. Ele é (e sabe disso!) simplesmente “o máximo”!! A lenda se tornou tão grande que não havia espaço para amigos ou amor. Kitty Pata Mansa ficou no passado.

Segundo a crendice popular, gatos têm nove vidas e portanto seriam praticamente imortais. Mas a realidade é bem outra. Um dia até as nove vidas chegam ao fim. O mote deste roteiro se baseia na premissa da finitude da vida e como esse final é encarado. Foram vidas bem vividas ou desperdiçadas? Um tema adulto que leva à reflexão. Mas que aqui é tratado com a leveza necessária para um público infantil.

                                            Créditos: Universal Pictures
Segundo os realizadores de Gato de Botas 2 - O Último Pedido, o longa ''Três Homens em Conflito'', de Sergio Leone (1966) foi uma das influências para os rumos que a animação toma

Subitamente, nosso herói se vê diante da dura realidade. O fim está próximo. Suas oito vidas escorreram por suas patas e agora, diante da nona e última oportunidade, ele terá que colocar um freio nas aventuras, se quiser continuar vivo. Um lobo caçador de recompensas sinistro anda à sua procura, causando arrepios de terror no valente gatito. Ele não aceita bem o fato de ter que enterrar suas vestes e se despir da vida de herói e cai numa espécie de depressão ao se transformar no desconhecido gato idoso “Pepino”. Para completar, ele terá que unir forças com seu desafeto do passado, Kitty Pata-Mansa, e encarar um futuro incerto.

Uma boa surpresa é a cena de um dos personagens mais fofos no filme e este se mostra frágil, carismático e cheio de sabedoria: Perrito. O cão sem dono ou raça definida dá uma lição de vida em todos nós! É de arrancar lagriminhas!!

                                   Créditos: Universal Pictures
“Uma única vida pode ser suficiente se você souber vivê-la plenamente!”

Além de encarar o medo da morte e do desconhecido, Gato terá que honrar sua última vida e partir em uma jornada épica através da Floresta Negra juntamente com o “time amizade” para realizar seu último desejo. Mas essa tarefa não será tão simples já que para encontrar o mapa que leva à localização da mítica estrela cadente do desejo eles terão que enfrentar outros personagens dos contos de fadas. Cachinhos Dourados e os três Ursos e o colecionador de objetos mágicos João Trombeta e seus capangas também querem o famoso mapa.

O roteiro está repleto de mensagens sobre valores como amizade, superação, confiança, finitude da vida e conceitos de família. Temos uma narrativa rítmica, dinâmica e envolvente que mescla a veia cômica e o sarcasmo arrogante característico do Gato de Botas com o perfil amoroso e ingênuo de Perrito.

A trilha sonora traz canções animadas e bem humoradas que se encaixam naturalmente em cada situação. O que nos leva a acreditar que o público infantil irá amar a animação e os adultos vão curtir ainda mais. Desde a primeira história esperamos onze anos para nos deliciarmos com esta obra. Mas a visão de um reino distante nos dá indícios que muito em breve teremos novamente a companhia do “time amizade”.
Sessões de Pré Estréias a partir de 29 de dezembro.

Decisão de Partir, de Park Chan-wook | Sessões de Pré Estréia


Quem achava que o subgênero cinema noir não tinha mais nada a oferecer, aqui temos Decisão de Partir, nova obra-prima do diretor e roteirista Park Chan-wook, realizador de Oldboy (2003) e A Criada (2016). Park Chan-wook é um exímio criador de estórias e esta película faz jus à sua fama, ganhando o prêmio de melhor diretor do Festival de Cannes 2022. Aliás, ela já tem mais vinte nove premiações na prateleira e outras setenta e quatro nomeações, entre estas, a de ''Melhor Filme em Língua -Não Inglesa'' no bombado Globo de Ouro® que ocorre no próximo ano. O filme também é o escolhido da Coréia do Sul para uma vaga no Oscar. 

Jang (Park Hae-il) e Song (Tang Wei) são um Tom e Jerry adulto e cruel, num jogo de caça onde ambos se machucam e se seduzem o tempo todo. O gato “Tom” é o policial coreano Jang, detetive insone que não descansa enquanto não resolve seus crimes insolúveis. A rata “Jerry” é a chinesa Song, migrante suspeita do assassinato de seu marido coreano.

O marido de Song aparentemente se suicidou, pulando de uma montanha que ele escalou. A polícia coreana suspeita da esposa, pois ela tem um outro crime nas costas, o de ter matado sua mãe na China. Entre narrativas distintas dos acontecimentos, o policial e a suspeita se vigiam, apaixonando-se nesse jogo de voyeurismo, expectativas e desconfianças.

Trailer

Ficha Técnica
Titulo original e ano: Heojil kyolshim, 2022. Direção: Park Chan-wook. Roteiro: Park Chan-wook e Chung Seo-kyung. Elenco: Park Hae-il, Tang Wei, Go Kyung-Pyo, Lee Jung-hyun, Teo Yoo, Shin-Young Kim, Jeong Min Park, Jung Young Sook, Seung-mok Yoo, Seo Hyun-woo, Jeong Ha-dam e Hak-joo Lee. Gênero: Drama, Crime, Misterio. Nacionalidade: Coréia do Sul. Trilha Sonora Original: Jo Yeong-wook. Fotografia: Kim Ji-yong. Edição: Kim Sang-beom. Design de Produção: RYU Seong-hie. Distribuidora: Diamond Films Brasil. Duração: 2h19min.  
Com várias viradas de roteiros, as versões de inocência e culpa da chinesa vão se alternando. Jang perde-se entre as várias narrativas, cada vez mais embriagado pelos mistérios dessa femme fatale. Até que resolve se afastar, declarando a inocência de Song e mudando de cidade, voltando a morar com sua esposa, com a qual tinha um relacionamento à distância.

Mas Song volta a encontrá-lo nessa nova cidade. E mais uma vez assassinatos se sucedem, com a chinesa como principal suspeita e Jang como o policial no seu encalço. Os fatos vão se sucedendo, até o grand finale, trágico, cruel e romântico, coroando o filme como uma das grandes obras da sétima arte de 2022.
                                                                                                                                   Créditos: Divulgação
Decisão de Partir é a submissão oficial da Coréia do Sul ao Oscar 2023

Este é o tipo de filme em que não se pode perder um minuto. O roteiro é cheio de surpresas e a versão dos fatos vai se alternando, num jogo de gato e rato surreal, onde não se sabe quem está caçando quem. Este longa-metragem é uma das provas de que nenhum gênero do cinema está esgotado. Grandes diretores, graças ao bom Deus, ainda conseguem nos surpreender e maravilhar! Nos cinemas de todo o país, a partir de 05 de janeiro, assistam e se deliciem com essa estória romântica cruel e fascinante. 

Nota: 9/10.

Como Agradar Uma Mulher, de Renée Webster | Assista nos Cinemas


“O que tu achas que aprendeste vendo pornografia é exatamente o contrário do que causa prazer em uma mulher”

Uma leitura rasteira da sinopse faz com que teçamos alguns paralelismos com o longa-metragem britânico “Boa Sorte, Leo Grande”, de Sophie Hyde (leia texto aqui), visto que ambos lidam com as questões referentes à redescoberta do prazer sexual em mulheres com mais de cinqüenta anos de idade. A perspectiva adotada por este filme australiano é diferente, visto que enfoca o controle empresarial dos garotos de programa. E, ainda que percebamos uma tônica indubitavelmente feminista, essa está atrelada ao empoderamento monetário. Ao menos, isso não é escamoteado…

Na primeira seqüência, a protagonista Gina Henderson (Sally Phillips) interage com suas amigas num vestiário, depois de nadarem num lugar paradisíaco, porém infestado por águas-vivas. É o seu aniversário e, quando perguntam o que ela deseja fazer nesse dia, a resposta é taxativa: “não ter mais aniversários”. Ela percebe que, em seu ramo empregatício, quanto mais velha uma mulher se torna, mais ela é desprezada por seus colegas de equipe. E, de fato, é o que ocorre.
                                                                                                                                    Créditos: Divulgação

Quando é chamada ao escritório de seu chefe Brett (Oliver Wenn), Gina pensa que receberá uma congratulação por sua data natalícia, algo que ele nunca fez. E continua sem fazer, afinal: ele pede que ela vá buscar alguns documentos numa firma de mudança com as finanças ameaçadas. Gina trabalha como assessora corporativa e, por isso, tem o poder de decidir quais empresas terão ou não continuidade, a depender de seus rendimentos e contribuições fiscais. Mas ocorrerá uma guinada surpreendente, na rotina então sufocada pelo trabalho desta mulher…

Enquanto presente-supresa de suas amigas, Gina recebe a visita de um ‘stripper’, Tom (Alexander England), que trabalha justamente na empresa de mudanças em que ela estivera mais cedo. Como não está interessada nos favores eróticos que ele oferece, ela pede que Tom limpe a sua casa, o que faz com que, após ficar subitamente desempregada, ela tenha uma idéia que fará imediato sucesso entre as suas amigas. Para saber mais, só mesmo vendo o filme!
                                                                                                                                                   Créditos: Divulgação

Não obstante a condução da estreante Renée Webster deixar evidente a sua familiaridade com a linguagem televisiva, o filme possui alguns momentos efetivamente divertidos, depois que ele supera a abordagem inicialmente tímida de um entrecho que exige desinibição: há uma cena, por exemplo, em que Gina experimenta um vibrador, graças à colaboração involuntária de um colega de trabalho – e esta é hilária. Mas que também demostra que o roteiro, escrito pela própria diretora, não está preocupado em evitar os clichês típicos das comédias românticas, ainda que o filme não seja romântico em si.

À medida que Gina constata que é bem-sucedida em sua nova ocupação como gerenciadora de prostitutos faxineiros, ela enxerga a profissionalização do sexo como um produto a ser ofertado como qualquer outro e, gradualmente, abandona os seus pudores iniciais. Entretanto, não tem-se a intenção de ultrapassar a barreira do consumo sexual mediante pagamento: exceto pela própria Gina e por um casal de lésbicas recém-encontradas, as demais personagens não recebem uma atenção individualizada. Existem enredisticamente em função de suas contribuições como clientes e/ou treinadoras de orgasmos. Uma das amigas de Gina chega a comentar que os serviços que ela gerencia são “melhores que cocaína, apesar de ter quase o mesmo preço”. Até que ponto o prazer sexual convertido em mercadoria pode ser equiparado a uma droga?

Pena que haja ao menos um elemento mui decepcionante deste filme: o modo como é apresentado o personagem Ben (Josh Thomson), que foge dos padrões masculinos de beleza e, como tal, é direcionado para uma cena vexatória, envolvendo o marido de Gina, Adrian (Cameron Daddo). Enquanto contraponto afirmativo, temos a confissão de uma colega de escritório de Gina, Chloe (Asher Yasbincek), cujas capacidades intelectuais são subestimadas pelo fato de ela ser muito bonita. Porém, a despeito de seus seios volumosos, reclama que possui mamilos insensíveis. Em sentido geral, “Como Agradar uma Mulher” é um filme que não se desvencilha de cacoetes classistas, mas possui aquele charme típico dos filmes independentes australianos. É uma pedida razoável em nosso calor tropical, portanto!

Trailer

Ficha Técnica
Título original e ano: How To Please a Woman, 2022. Direção e Roteiro: Renée Webster. Elenco: Sally Phillips, Caroline Brazier, Erik Thomson, Tasma Walton, Alexander England, Hayley McElhinney, Cameron Daddo, Josh Thomson.  Trilha Sonora Original: Guy Gross. Fotografia: Ben Nott. Edição: Merlin Eden. Figurino. Lisa Galea Gunning. Design de Produção: Emma Fletcher. Distribuição: A2 Filmes. Duração: 1h47min.
O filme foi ganhador da categoria de ''Melhor Narrativa'' no Toronto International Women Film Festival e também levou um prêmio de mais de um milhão de doláres no West Australian Screen Culture Awards na categoria de inovação. Renée Webster chegou a ser indicada por seu trabalho no filme ao Australian Directors Guild Awards. A película chega esta quinta-feira (29) aos cinemas de São Paulo, Rio de Janeiro, Campinas, Brasília, Belo Horizonte e Bahia.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

A Farsa, de Nicolas Bedos | Assista nos Cinemas


A dica para fechar 2022 com chave de ouro é ir conferir “A Farsa” (Masquerade), nova produção do escritor, ator e diretor francês Nicolas Bedos, conhecido por Monsieur & Madame Adelman (2017, disponível na  AppleTV para aluguel) e Belle Époque (2019, disponível no HBOMAXBR).

O elenco é abrilhantado pela diva Isabelle Adjani (Martha Duval), que estreou seu primeiro filme em 1970 (Le Petit Bougnat) e já apareceu em mais de trinta filmes desde então, tendo recebido o ''César'' de Melhor Atriz por Possessão (1981), Verão Assassino (1983), Camille Claudel (1981) e A Rainha Margot (1984). O tempo passou, mas a artista continua belíssima! Se juntam a ela: Pierre Niney (Adrien Saillard), Marine Vacth (Margot Hansen), François Cluzet (Simon Laurenti), Emmanuelle Devos (Carol Laurenti), Laura Morante (Giulia Margoni), entre outros.

A película é um daqueles deliciosos dramas que, com humor ácido e perspicácia, consegue traçar o perfil de uma sociedade abastada e hipócrita, onde o dinheiro fala tão alto, que consegue comprar relações e sentimentos. Poderia até ter palco em Brasilia, mas é ambientado na encantadora Riviera Francesa, um “lugar ensolarado para pessoas sombrias”. Aliás, o filme já pode receber um prêmio por sua fotografia que consegue enaltecer belas paisagens francesas. O público vai sonhar em conhecer aquelas locações. 

Trailer


Ficha Técnica 
Título original e ano: Mascarade, 2022. Direção e Roteiro: Nicolas Bedos. Elenco: Pierre Niney, Marine Vacth, François Cluzet, Emmanuelle Devos, Laura Morante, Marie Febre, Christiane Millet, Nicolas Briançon, James Wilby,Charles Berling, . Gênero: Drama, Comédia, Romance, Crime. Nacionalidade: França.  Trilha Sonora OriginalAnne-Sophie Versnaeyen. Fotografia: Laurent Tangy. Edição: Anny Danché e Clément Selitzki. Design de Produção: Stéphane Rozenbaum. Figurino: Emmanuelle Youchnovski. Distribuidora:  Diamond Films Brasil. Duração: 02h14min. 

Os personagens intrigam pelos preenchimentos de cada um. Adrien, jovem, bonito e extremamente sedutor, tinha uma carreira promissora como bailarino. Mas o destino assim não quis, e um acidente interrompeu sua trajetória. Agora ele leva a vida como gigolô. O homem é ''garoto de companhia'' de senhoras ricas e entediadas. O que parece ser uma vida fácil não é tão glamorosa assim. Adrien tem que se submeter aos caprichos femininos e cumprir seu papel, sem sentimentos. Sem perspectiva de futuro, finge estar escrevendo um livro para preencher sua vida medíocre. Atualmente ele é acompanhante de Martha, atriz idosa, decadente e amarga, que luta arduamente para manter as aparências e o status de outrora. O papel é brilhantemente interpretado por Isabelle Adjani.

 Créditos: Divulgação       
Isabelle Adjani e François Cluzet estão no filme de Nicolas Bedos que ganhou exibição no Festival de Cannes deste ano.

Em uma das festas na residência de Martha, Adrien conhece a linda e sensual trambiqueira Margot, que sobrevive roubando homens ricos e mal amados. Margot sonha com uma boa vida para sua filha, “sem homens para atrapalhar”. Marine Vacth está incrível na personagem. Ambos estão acostumados a dar golpes em parceiros mais velhos, mas vivem solitários. Obviamente, se tornam amantes. Juntos arquitetam um esquema amoral e requintado para dar o golpe perfeito.

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Na foto, os atores Pierre Niney e Mariana Vacth

Além de Martha, o outro alvo da trapaça será o corretor de imóveis de alto luxo Simon e sua esposa Carol. O casamento morno e rotineiro será alvo fácil. Como parceira na tramóia ainda está Giulia, a manipuladora da ex- amante de Adrien, que se torna muito próxima de Margot. A história caminha entre uma narrativa linear e alguns flashbacks, entregando uma trama tortuosa e bem amarrada. Embora o roteiro possa parecer simples, a maneira como a narrativa é conduzida, de forma dinâmica e divertida, surpreende até os instantes finais.

Há tempos não se via um filme tão envolvente. O tempo passa despercebido. E olha que são mais de duas horas de projeção. Personagens bem construídas e boa atuação fazem toda diferença. A trilha sonora contribui com a dinâmica da película. Aquele tipo de filme que é melhor assistir que tentar traçar comentários que irão estragar as boas surpresas.

Distribuído pela Diamond Films, “A Farsa” chega aos cinemas nesta quinta- feira (22) e merece sua atenção.

HOJE NOS CINEMAS

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Filho da Mãe, de Susana Garcia | Assista no Prime Vídeo


Às vezes parece que a gente só reconhece um fenômeno, quando o perdemos. Ainda mais quando tivemos tão pouco tempo, mas no breve período em que o cometa Paulo Gustavo atingiu a terra, ele deixou sua marca, e fez muita gente chorar de rir, para no fim, chorar de emoção com o tanto que ele nos fez sentir.

Dirigido por Susana Garcia, realizadora responsável por Minha Mãe é Uma Peça 3 e Minha Vida em Marte, cujo a familiaridade com o trabalho do comediante torna o projeto ainda mais especial. A produção era uma ideia do próprio ator e foi adaptada por Susana. O longa também é co-dirigido por Juliana Amaral, irmã de Paulo.

Créditos: Amazon Studios     
O espetáculo com a mãe enaltece o tempo de cantora de Déa e o espectador tem a chance de acompanhar os bastidores do show pelo Brasil.

Filho da Mãe não quer ser um longa-metragem pós morte a ver que se trata de uma produção do dia a dia do artista e dos bastidores do espetáculo que estava fazendo com a querida Déa Lúcia, a mãe que conquistou o Brasil. Mesmo assim, com o passar do filme, somos atingidos pela falta que ele faz na vida de todos que trabalharam ou conviveram com ele e somos consumidos pelo poder de toda a arte e vida de Paulo.

Os relatos da família, e de rostos conhecidos, como Ingrid Guimarães (De Pernas Para o Ar) e Mônica Martelli (Os Homens São de Marte…. E É Para Lá Que Eu Vou), que nos fazem ter vontade de ter sido parte da vida deste ator sem igual. Mas é um trecho de Pedro Bial que nos faz compreender o tamanho do fenômeno que foi Paulo. A gente vê entre o dia a dia da turnê de Filho da Mãe, pedaços da história, desde o surgimento da famosa e querida Dona Hermínia. E o jornalista aponta para o fato de que o filme Minha Mãe É Uma Peça não precisou de um veículo de mídia grande para se vender, ele é esse veículo, e depois, com o sucesso, emprestou seu nome ao Canal Multishow e a Rede Globo, onde fez muito de seus programas de humor. Pedro também destaca que Paulo olhou para dentro, e viu na mãe, uma personagem que ia falar com o grande público.

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Ficha Técnica 
Titulo original e ano: Filho da Mãe, 2022. Direção. Susana Garcia. Co-direção: Juliana Amaral. Com participações de: Paulo Gustavo, Déa Lúcia, Juliana Amaral, Thales Bretas, Susana Garcia, Pedro Bial, IZA, Marcus Majella, Regina Cazé, Mônica Martelli, Júlio Marcio Monteiro de Barros. Gênero: Documentário, biografia. Nacionalidade: Brasil. Produção ExecutivaSusana Garcia, Luiz Noronha, Cecília Grosso, Samanta Moraes. Produção: Amazon Studios, A Fabrica. Disponível no Amazon Prime Video em 16 de Dezembro. Duração: 01h47min.
A gente vê que a trilogia de Minha Mae é Uma Peça tomava de conta dos cinemas, enfrentando de igual para igual, a Marvel e a Disney. Paulo Gustavo e sua arte de rir como um ato de resistência foi e é um herói nacional. Com toda a inspiração que teve no dia a dia da família, soube levar para o público, pautas importantes com amor.

Também no longa, Paulo cita que ''não é militante, mas é um ser político''. A produção aborda que Paulo conseguiu mudar a vida de muita gente. A participação de um fã com o relato sobre como Paulo o ensinou a amar quem ele era, a ser quem ele era, é só um exemplo do que ele fez na sutileza do dia a dia dele, e na forma como abordava temas importantes na comédia. Sabendo falar com o povo brasileiro de uma maneira empática.

     Créditos: Amazon Studios       
O filme relembra o período em que o ator e o marido decidiram ser pais de duas crianças, Romeu e Gael

O documentário traz de volta para as telas um pouco de Paulo Gustavo para que a gente se lembre do fenômeno que ele é, porque a estrela que foi em vida, continua e nunca vai deixar de brilhar depois que partiu. A produção deste filme é uma biografia do grande homem que foi e sempre será Paulo Gustavo. Ele que teve a família como inspiração, porque com todas as dificuldades que eles carregavam, acreditaram no sonho de Paulo de ter uma carreira artística.

Paulo foi um grande contador de histórias. E nesse longa, Susana, relembra um pouco da caminhada de vida e carreira dele. Mais para o final do filme, acompanhamos a jornada de Paulo e seu marido Thales Bretas, se tornando pais de Romeu e Gael. E depois disso, a trágica perda de Paulo, que morreu em maio de 2021, em decorrência da covid-19, deixando um buraco, que nas palavras de Bial: “Não vai e não pode ser tapado”. E fica a saudade do grande nome da comédia brasileira desta década.

16 DE DEZEMBRO NO PRIME VIDEO.

Avatar: O Caminho da Água, de James Cameron | Assista nos Cinemas


Após treze longos anos de espera, os fãs do mundo cinemático de Avatar finalmente são agraciados com uma sequência da obra que revolucionou a maneira como entendemos o cinema. O filme acabou mudando totalmente a relação dos realizadores com os estúdios e também com a audiência, pois foi com o famigerado 3D que o longa de James Cameron apresentou a forma de apresentação dos filmes passou a ser repensada nas salas. Não só isto gerou impacto no modo de filmar o cenário, os personagens e também no departamento de fotografia. Tudo porque o ecossistema de Pandora introduzido no filme é de uma realidade muito natural e magnânima.

O peso que O Caminho da Água traz consigo quando comparado a seu antecessor é incomensurável. Ademais, o filme que dá sequência a história daqueles personagens é tão grandioso quanto sua primeira caminhada. Isto se deve ao fato de que quando voltamos nossos olhos para a fotografia da produção, assistimos esta dar um passo gigantesco rumo a magnificência gráfica que a atual indústria cinematográfica é capaz de produzir. Avatar 2 é dos mais belos filmes do ano exatamente por tais departamentos, visuais e gráficos, estarem ainda mais desenvoltos.

Para as filmagens de Cameron, a Sony construiu a câmera ''Venice'' com tecnologia ''Higher Frame Rate'' 

O enredo mais uma vez aborda questões ambientais. contudo, desta vez o foco é na família que Jake Sully, personagem do ator Sam Worthington, construiu após os eventos do filme de 2009. E é maravilhoso ver toda a sua família interagindo entre si e com outros personagens. Jake nos apresenta seus filhos e a aldeia e o espectador para para observá-los a vida acontecendo ali. Porém, quando um conflito acontece, todos são forçados a seguir para a vila da água onde aprendem sobre o Caminho da Água: “O mar é vida, o mar é morte”. Assim, junto a sua esposa Neytiri, vivida pela incrível Zoe Saldana, o nosso ex-militar se encontra novamente em um ambiente desconhecido, o que traz a memória semelhança com a trama do filme anterior onde o homem deve aprender a se portar naquele novo habitat e, por fim, se adaptar à ele. Com uma casa nova, a família Sully adquire problemas novos e ainda maiores que os anteriores, algo que a primeira vista poderá soar algo simplório, no entanto, a maneira como Cameron consegue trazer grandiosidade as mais simples situações é algo que merece ser elogiado. 

Se juntam ao elenco, nomes como Kate Winslet, Edie Falco e Cliff Curtis. E retornam aos seus papéis Sigourney Weaver, Stephen Lang, Joel David Moore, CCH Pounder e Giovanni Ribisi.

Trailer

Ficha Técnica
Título original e ano: Avatar, The Way of Water, 2022. Direção: James Cameron. Roteiro: James Cameron, Rick Jaffa, Amanda Silver com argumentos de James Cameron, Rick Jaffa, Amanda Silver, Josh Friedman e Shane Salerno. Elenco: Sam Worthington, Zoe Saldana, Sigourney Weaver, Stephen Lang, Joel David Moore, CCH Pounder, Giovanni Ribisi, Kate Winslet, Edie Falco, Cliff Curtis, Jemaine Clement, Britain Dalton, Brendan Cowell, Trinity Jo-li Bliss, Bailey Bass, Jack Champion, Duane Evans Jr., Filip Geljo. Gênero: Fantasia, Aventura, Ação. Nacionalidade: Eua. Trilha Sonora Original: Simon Franglen. Fotografia: Russell Carpenter. Edição: David Brenner, James Cameron, John Refoua, Stephen E. Rivkin. Design de Produção: Ben Procter e Dylan Cole. Supervisão de Direção de arte: Kim Sinclair, Sarah Delucchi, Aashrita Kamath. Distribuição: 20th Century Studios. Duração: 03h12min. 
O longa é acompanhando por uma trilha sonora musical grandiosa, que também revive algumas das composições trilha de Avatar, mas temos também novas ritmos e batidas que conseguem fazer com que o espectador tenha uma imersão quase que imediata com tudo que acontece em tela. O que torna filme e trilha sonora em um amálgama tão perfeito que ainda nos primeiros segundos do longa é difícil distinguir se estamos em Pandora ao lado dos Na'vi ou em uma sala de cinema.

Entretanto, nem tudo são rosas para continuação de uma obra tão emblemática e inovadora. Uma das, senão a maior dificuldade do longa, e que pode incomodar alguns dos espectadores, é que sua trama vem extremamente arrastada. Em outras palavras o diretor faz questão de explicar e demonstrar cada detalhe da jornada que quer contar. Então, imaginem assim, se há a uma sequência onde uma pedra cai, tenha a certeza de que James Cameron vai lhe mostrar como e porquê aquela pedra foi parar naquele local. Neste contexto, vale lembrar também que tais detalhes minuciosos pode sim agradar uma parcela dos fãs, mas é apelativo por demais entregar uma obra que se explique em demasia já que acarreta ainda mais na lentidão dos acontecimentos e não só isto, traz uma edição ainda mais demorada. 

As sequências de Avatar que chegam aos cinemas em 2022 e 2024 custaram em conjunto um bilhão. O Caminho da Água, inclusive, entra para a marca de ser o sétimo filme da história a custar mais de trezentos milhões de dólares.

O veredito, ainda assim, é positivo. Sim, vale totalmente a pena pegar sua pipoca e sentar no escurinho do cinema com aquele ar condicionado bem gelado e conferir Avatar O Caminho da Água. Pela dimensão gráfica do filme, como evidenciado no texto, escolha inclusive a melhor sala do melhor cinema possível, pois desta maneira a experiência será tão única quanto a primeira vez que seus olhos visualizaram Pandora anos e anos atrás.

HOJE NOS CINEMAS

sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

Sol, de Lô Politi | Assista nos Cinemas


Filmes brasileiros que se desdobram sobre temáticas familiares onde houve o abandono de um filho e a fuga de um pai são sempre bem vindos visto que em nosso país tem-se uma estatística enorme do dito ''aborto paternal'' e ainda que mães e mulheres guerreiras ganhem muito mais representações nas telas, deixar de lado o papel masculino dentro das formações das famílias faz com que a audiência não pense tanto no assunto. Em ''Sol'', longa com direção de Lô Politi que chega esta semana aos cinemas, apresenta-se a trajetória de Theo (Rômulo Braga) que é forçado a reencontrar um pai que nunca antes tivera contato, mas quando este (Everaldo Pontes) cai doente, são para ele que as ligações são direcionadas. O homem é pai da sabida Duda (Manu Landim) e não exatamente sabe como se conectar com a filha, afinal, ele não passou por tal momento na  própria infância.

Recém separado, Theo vem tentando ficar perto da filha, se comunicar, mas tem um grande desafio, ele mesmo. Quando decide viajar para encontrar esse pai ausente, leva a menina em uma roadtrip pelo interior do país. A sua ideia é tentar resolver de alguma forma rápida a situação do seu progenitor e retornar para casa com a menina a tempo de seguir com sua vida, mas este pai de primeira viagem não está preparado para o que o caminho a ser percorrido o trará. Seu velho, um senhor frágil de cabelos brancos, calado, assim como ele, teve uma perda recente e sua casa também está sofrendo o risco de ser tomada por outros. A vizinha, a mesma que liga para Theo, faz de tudo para acomodá-lo com a filha e informa que é bom que eles estejão ali, depois de tantas ligações não atendidas ou negativas de parentesco com o doente.

O pai de Theo e avô de Duda está muito debilitado. Quando ganha a visita, ainda no hospital, tem um olhar seco, vazio, longínquo e sem qualquer afeto por aqueles que estão a sua frente tentando entender porquê ele está ali e se teve algum quadro de melhora. Os visitantes seguem então para a casa vazia do velho senhor. A vizinha traz explicações sobre a vida no lugar e orientações da casa enquanto a porta se abre e o enfermo adentra seu lar. Consternado, ele fugiu do hospital e pretende fazer de tudo para não perder a moradia. Por ser agora tido como responsável pelo homem, Theo então quer levá-lo a uma casa de idosos onde poderá ficar por um tempo e será bem cuidado. Inicia então outra viagem e uma que envolve não só a companhia da filha, mas deste pai que pouco conhece ou sente amor. 


Com um roteiro que tenta esmiuçar as relações e as conexões entre três gerações de uma família que teve laços cortados em certo momento de suas vidas, Sol não tem um resultado perfeito de suas tentativas, mas entrega uma forte atuação de Rômulo Braga. O ator foi, inclusive, premiado pelo papel no Festival do Rio e outros. A pequena Malu Landim se esforça para não soar muito robótica e até que convence. Seu bate bola com Braga faz o espectador pensar em como muitas vezes os homens tentam ser protetores, mas não conhecem suas fragilidades. Everaldo Pontes nos traz um personagem perturbado, com estrada e que mais observa do que tenta construir alguma conexão. Este papel quem faz no trio é Duda. A menina se apega ao avô muito rápido e faz o pai perceber a imensidão e a força dos laços de sangue, ainda que a superação de mágoas seja algo necessário, se é que isto é possível em situações do gênero.

Trailer

Ficha Técnica
Título original e ano: Sol, 2022. Direção e Roteiro: Lô Politi. Elenco: Rômulo Braga, Everaldo Pontes e Malu Landim. Gênero: Drama. Nacionalidade: Brasil. Trilha Sonora Original: Guilherme Garbato, Gustavo Garbato e Janecy Nascimento. Direção de Fotografia: Breno César. Montagem: Helena Maura, AMC. Direção de Arte: Mariana Hermann. Edição de Som: Beto Ferraz. Mixagem: Paulo Gama. Figurino: Teresa Abreu. Maquiagem: Nayara Homem. Som Direto: Ana Luiza Penna. Pós Produção: Psycho n' Look. Direção de Produção: Cláudia Reis. Produção Executiva: Eliane Ferreira. Produtores: Eliane Ferreira, Pablo Iraola e Lô Politi. Empresas produtoras: Dramática Filmes, Muiraquitã Filmes. Distribuidora: Paris Filmes. Duração: 100min.

Lô Politi dirigiu ''Jonas'' (disponível na menina Netflix) e também co-dirigiu ''Alvorada'' (leia texto aqui do filme que se encontra no Telecine para o play). Tem uma visão cinemática forte e seus filmes não passam batido. Sol tem muito teor de ''roadmovie'' e não é um dramalhão, mas se fortalece nesse olhar diferenciado da diretora em alavancar seus personagens e deixá-los construir um enredo compassado dando tempo e respiro para os conflitos apresentados se resolverem não de uma vez, mas com o tempo justo.

A produção é distribuída pela Paris Filmes e é um bom investimento da mesma, após um ano de lançamentos dos mais diversos, mas com um leque repleto de filmes de terror trash. Produzem o filme a Dramática Filmes e a Muiraquitã Filmes

EM CARTAZ

quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Uma Mulher do Mundo, de Cécile Ducrocq | Assista nos Cinemas

 
Em dezembro de 2022, a conceituada revista inglesa Sight and Sound anunciou sua lista de 100 Melhores Filmes de Todos os Tempos. Atualizada a cada década, desta vez ocorreu uma modernização digna de alarde, prenúncio de uma bem-vinda renovação do cânone cinematográfico: Jeanne Dielman, 23, quai du Commerce, 1080 Bruxelles, da diretora belga Chantal Akerman, foi considerado por uma lista de críticos de cinema como o melhor filme da história do cinema. Esta foi a primeira vez que um filme dirigido por uma mulher conseguiu o primeiro lugar nesta lista. De 1975, esse filme feminista conta a estória de uma dona de casa entediada com seus afazeres domésticos que, às vezes, é prostituta e assassina. Como qualquer obra de arte de muita qualidade, este longa-metragem, devido sua influência, gerou filhotes, e Uma Mulher do Mundo, de 2021, é uma destas crias.

Dirigido e roteirizado por Cécile Ducrocq, este filme francês conta, de maneira muito realista, a estória de uma prostituta de rua, já próxima de seus quarenta anos, que faz de tudo para ajudar o filho adolescente rebelde a conseguir entrar numa conceituada escola de culinária e se tornar um chefe de cozinha. A profissional do sexo Marie, vivida brilhantemente pela atriz Laure Calamy, é uma personagem complexa: mãe amorosa, ativista dos direitos das prostitutas, xenófoba, racista, ladra. O filho Adrien (Nissim Renard) também não é fácil, rebelde, transfóbico, com baixa autoestima e drogado. Do embate desses personagens tão humanos, sai uma bela estória de resistência e tentativa de mudança.

Adrien foi expulso da escola pública de culinária onde estudava porque colocou maconha no doce que fez na sala de aula. Marie, para salvar o futuro do filho, incentiva-o, apesar do seu derrotismo, a fazer a seleção de uma cara escola particular. Para surpresa de todos, o adolescente passa e a mãe corre atrás de conseguir o dinheiro para pagar a escola.

Esta é a segunda colaboração entre Cécile Ducrocq e Laure Calamy. Elas trabalham antes no curta ''La contre-allée''.

Sem acesso a empréstimos bancários, sem ajuda da família, com poucos clientes, a única saída para Marie é entrar num prostíbulo, onde entra em contato com a dura realidade das prostitutas estrangeiras que foram para a Europa Ocidental melhorar de vida. Replicando atitudes xenófobas e racistas, Marie engana, rouba, faz de tudo para conseguir o dinheiro da escola.

Para saber o resultado dessa busca angustiante por dinheiro e oportunidades, os caros leitores deste texto terão que assistir a película. Mas o produto final é muito humano. É agregador e impactante assistir a filmes com pautas feministas que exibem as profissionais do sexo sem clichês. Marie e seu filho são personagens fascinantes, viajar pela alma humana é fantástico. 

A produção é o lançamento da distribuidora Imovision para esta semana nos cinemas de Brasília, Nitéroi, Rio de Janeiro, e São Paulo. 

Nota: 8/10.

Trailer


Ficha Técnica
  • Título original e ano: Une Femme du Monde, 2021. Direção: Cécile Ducrocq. Roteiro: Cécile Ducrocq e Stéphane Demoustier. Elenco: Laure Calamy, Nissim Renard, Béatrice Facquer, Romain Brau, Maxence Tual e Sam Louwyck. Gênero: Drama. Nacionalidade: França. Fotografia: Noé Bach. Montagem: Sophie Reine. Produtor: Stephanie Bermann e Alexis Dulguerian. Distribuição: Imovision. Duração: 97 min.

HOJE NOS CINEMAS

Ela Disse, de Maria Schrader | Assista nos Cinemas


Ela Disse: a reportagem que ajudou a dar voz a um movimento

Na tentativa de dar voz a diversas mulheres que foram silenciadas a vida toda em seus trabalhos, surgiu em 2017, com o apoio de grandes nomes da indústria de Hollywood, e do mundo inteiro, contra o assédio sexual e a agressão, um movimento de forte teor crítico. Em Ela Disse, da diretora Maria Schrader, vemos o impulsionamento disso, com a jornada de duas repórteres do The New York Times, para produzir um artigo revelando casos verídicos de assédio, este que acabou sendo vencedor de vários prêmios. A produção é baseada no livro ''Ela Disse: Os Bastidores da Reportagem que Impulsionou o Movimento #MeToo'', escrito pelas jornalistas Jodi Kantor e Megan Twohey.

Quando o cinéfilo mais assíduo se dá conta da existência deste filme e lê a sinopse, é muito provável que vá pensar em Spotlight - Segredos Revelados (Tom McCarthy, 2015, texto aquiou ainda em Todos Os Homens do Presidente (Alan J. Pakula, 1976). E, sem qualquer julgamento prévio, afinal, esses longas foram realmente muito relevantes em suas propostas. Mas incomoda a narrativa romantizada que muitas destas produções sobre jornalismo investigativo, ainda mais sobre um assunto que parece nunca se esgotar, onde os problemas vão sempre o tornando cada vez mais extensos. Contudo, ‘Ela Disse’ não romantiza o trabalho destes profissionais, muito pelo contrário.

Na trama, vemos Megan e Jodi esgotadas com o peso das pautas que perseguiram. Sugadas pelo trabalho e pelo dia a dia. E mesmo que, às vezes, soe forçado, em algumas cenas, o filme trata de mostrar que aquelas jornalistas também eram diretamente afetadas pela investigação. Não só por ser perigoso abordar o assunto, e os homens em questão serem figuras de poder, mas por serem mulheres, terem dupla jornada, sentirem que mesmo que consigam publicar a matéria, nada concreto vai se resolver.

Créditos: Universal Studios    
Carey Mulligan e Zoe Kazan, interpretes de Megan e Jodi, são amigas há 14 anos. Zoe, inclusive, foi madrinha de casamento de Carey.

Megan Twohey, interpretada pela brilhante atriz Carey Mulligan (Bela Vingança, As Sufragistas, O Grande Gatsby) - que sempre está em projetos ligados a pautas feministas - é uma jornalista responsável pela difícil reportagem sobre os assédios ligados ao ex-presidente Donald Trump. Na época, Twohey estava grávida, e chegou a ser ameaçada não só de morte, como também de ser estuprada, através de uma ligação. Quando ela dá a luz, passa a ter depressão pós-parto. Já Jodi Kantor, representada pela atriz Zoe Kazan (Doentes de Amor e Será Quê?), é uma repórter e mãe de duas meninas, que fica encarregada de investigar o caso Harvey Weinstein. Ela acaba se envolvendo emocionalmente, pensando no impacto da cultura machista em suas filhas. O que acontece com a cética Megan, que em sua depressão, sente que tudo implodiu. 

Com o roteiro de Rebecca Lenkiewicz, o filme se baseia em fatos reais, para entregar um produto que pretende mostrar que as vidas dessas repórteres se mistura com a produção da reportagem. O elenco de peso, com Patricia Clarkson (A Mentira) e Andre Braugher (Brooklyn 99), como os editores do jornal, Rebecca Corbett e Dean Baquet. Adicionando ainda Samantha Morton, Angela Yeoh e Jennifer Ehle como algumas das antigas assistentes de Weinstein. O longa consegue dizer a que veio, mas não convence o suficiente, ainda que em certos momentos, conquiste o público.

O problema está em adaptar uma história que ainda é muito recente. Ou em abordar um tópico que envolve muitas atrizes de Hollywood, e quando mencionadas no longa, ou quando aparecem, distraem como se estivessem fazendo cameos divertidos. Quando na realidade, o filme não é sobre algo de tom alegre. Há um momento específico, em que a produção resolve assumir um certo mistério se Gwyneth Paltrow irá ou não aparecer em cena. Mas assim como a possível presença de Harvey, a diretora escolhe mostrar somente as costas das atrizes assediadas. E fica o sentimento de que mesmo que a participação de famosas, como Ashley Judd ou Judith Godrèche, que foram diretamente impactadas pelos crimes de Harvey, cheguem a ser explicitas, não gera tanta credibilidade ao filme, assim como o que acontece a reportagem evidenciada, às vezes, soando robótica demais. Outras atrizes desrepeitadas pelo produtor, como Rose McGowan, que foram primordiais a investigação, tem sua voz interpretada por outra pessoa.

Trailer

Ficha Técnica
Título original e ano: She Said, 2022. Direção: Maria Schrader. Roteiro: Rebecca Lenkiewicz - adaptação do livro homônimo de Megan Twohey e Jodi Kantor (veja aqui). Elenco: Carey Mulligan, Zoe Kazan, Patricia Clarkson, Andre Braugher,  Samantha Morton, Angela Yeoh, Jennifer Ehle, Sean Cullen, Maren Heary, Anastasia Barzee, Keilly McQuail, Hilary Greer. Gênero: Drama, história. Nacionalidade: Estados Unidos da América. Trilha Sonora Original: Nicholas Britell. Fotografia: Natasha Braier. Edição: Hansjörg Weißbrich. Design de Produção: Meredith Lippincott. Figurino: Brittany Loar. Produtores Executivos: Brad Pitt,  Megan Ellison, Sue Naegle, Lila Yacoub. Distribuição: Universal Pictures Brasil. Duração:  02h09min.

O ator Brad Pitt, que tem investido muito na sua carreira de produtor, é listado como produtor executivo. O que deixará muita gente com a pulga atrás da orelha, visto que ele já se relacionou com algumas das atrizes que foram afetadas por Harvey (Gwyneth Paltrow e Angelina Jolie). Não só isto, ambas deram entrevistas públicas sobre o assunto. E isto anterior a Pitt comprar os direitos do livro para produzir o filme, logo, ele foi informado por suas 'ex's'' dos ocorridos. O ator também está no meio de uma polêmica com a ex-mulher, Angelina Jolie, pois contratou um dos ex-advogados de Harvey para o defender nos processos que ambos estão associados em relação ao fim do casamento. Logo, todo seu empenho aqui soa como um ato mecânico, para mostrar que ele é um ''aliado''. Além da ligação de Pitt com Harvey em vários trabalhos cinematográficos, vale ressaltar que por anos a editoria do jornal The New York Times evitou falar negativamente do magnata. Não só por visitas de Harvey ao prédio do folhetim como também por ter um ciclo de amigos poderosos dentro na direção da NBC Universal, NBC News e da MSNBC. Muitos deles envolvidos também em casos de assédio sexual, mas nunca punidos como revela o livro do jornalista Ronan Farrow "Catch and Kill: Lies, Spies, and a Conspiracy to Protect Predators''.

O longa tem seus momentos, como por exemplo, prefere não simular as cenas dos crimes, apesar de escolher fazer cenas conceituais demais no lugar. No entanto, pelo menos, escolhe por não chocar ao apelar para cenas mais gráficas. O apelo da obra fica todo em perceber a aflição de Megan e Jodi ao perseguir a trilha de sofrimento deixada por Harvey e todo o poder dele. Porque no final das contas, existem muitos Harvey Weinstein espalhados pelo mundo. E como as duas protagonistas do longa se perguntam, se mulheres com a plataforma que essas atrizes tinham, foram silenciadas por décadas, o que impede que mulheres comuns continuem sendo silenciadas ainda hoje? É desvendar um caso, enquanto muitos outros estão acontecendo, ou sendo acobertados ao redor do globo. 

O tom reflexivo e até certo ponto, pessimista do filme, não é negativo. Ele não traz um desfecho que resolve todas as pontas da história, até porque, ela está longe de ser resolvida. O caso deste produtor pode ter obtido resultados, mas o que parece é que depois do ápice do movimento #MeToo, o mundo retrocedeu os poucos passos que havia dado.

HOJE NOS CINEMAS

quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

Emancipation – Uma História de Liberdade, de Antoine Fuqua | Original Apple TV+

 
“Eu posso caminhar sozinho!”

O cineasta afro-americano Antoine Fuqua consagrou-se em Hollywood pela habilidade na condução de tramas de ação protagonizadas por astros negros. Foi sob a sua direção que Denzel Washington recebeu um Oscar de Melhor Ator, por causa do filme “Dia de Treinamento” (2001), e foi graças a ele que o mesmo Denzel Washington envolveu-se com a saga ‘Equalizer’, cujo terceiro capítulo está programado para estrear em 2023. Neste sentido, é interessante que tenha ficado a cargo desse realizador a reabilitação pública de Will Smith, após uma situação extra fílmica que gerou bastante polêmica.

Situado no ano de 1863, quando foi abolida a escravidão nos Estados Unidos da América, “Emancipation – Uma História de Liberdade” (2022) apresenta-nos a Peter, um escravo de origem haitiana, que após trabalhar numa fazenda de algodão, é forçado a desempenhar atividades de guerra, separando-se de sua família e lidando com agressões cotidianas e fortuitas, de cariz cada vez mais violento. No percurso de Peter para a área onde ele é obrigado a erigir trilhos ferroviários, vemos vários corpos desmembrados e pessoas enforcadas, entre escravos e desertores de guerra. Até que ele consegue fugir.

As duas horas e doze minutos de duração deste longa-metragem são agrupadas em três blocos: no início, testemunhamos a brutalidade de um contexto em que a escravidão é reforçada através da repetição de versículos bíblicos. Os possuidores de escravos repetem trechos da Bíblia enquanto espancam os homens, declarando que a obediência aos mestres é uma condição do cristianismo. Quem tenta escapar do ferro quente no rosto é mastigado por cachorros ferozes ou alvejado por tiros e jogado aos animais selvagens.

No desenvolvimento, somos cúmplices audiovisuais das agruras enfrentadas por Peter, enquanto corre e nada pelos pântanos da Louisiana, demonstrando possuir uma inteligência sobressalente, além de um intensificado desejo de sobrevivência. A cena em que ele luta com um crocodilo é particularmente fascinante, dentro do escopo de filmes de ação no qual o cineasta especializou-se.

Créditos: Apple Tv+
Imani Pullum, Will Smith, Jeremiah Friedlander, Landon Chase Dubois, Charmaine Bingwa and Jordyn McIntosh em "Emancipation - Uma História de Liberdade," estréia esta sexta-feira (09) no Apple TV+.

Na conclusão, o filme recai nos clichês típicos do triunfalismo estadunidense, freqüentes nas tramas de guerra. Nesse trecho final, conhecemos a inspiração verídica do personagem, quando descobrimos que o protagonista é um ex-escravo que, ao deixar-se fotografar, expondo as cicatrizes chocantes em suas costas, virou um símbolo dos horrores da escravidão, ao redor do mundo. Paradoxalmente, essa mesma fotografia, no filme, gera um diálogo cínico, por parte de um general, que, ao encarar Peter, expõe a sua reação negativa à “Grande Questão Negra”, de maneira intimidadora: “tu és um lutador ou um fugitivo?”. Para ele, aquelas cicatrizes são símbolos de desobediência, ao invés de metonimizar os maus tratos absurdos associados à falsa idéia de que uma raça é superior às demais. 

Entre erros (o uso um tanto pleonástico da trilha musical de Marcelo Zarvos) e acertos (a fotografia espertamente desbotada de Robert Richardson), o filme é exitoso em suas intenções sinópticas: o espectador é levado a torcer para que Peter continue vivo, por mais que o enredo force a barra ao mostrá-lo como um pai de família cuidadoso e como um homem que desafia quaisquer pessoas, a fim de ajudar quem está sendo espancado. Eficientemente submetido a uma maquiagem envelhecedora e esforçando-se na adoção de um sotaque estrangeiro, Will Smith não consegue dotar a sua interpretação da pujança necessária, visto que a caracterização do mesmo é estereotípica, não fazendo jus à importância da pessoa real que o inspirou. 

Trailer

Ficha Técnica
Título original e ano: Emancipation, 2022. Direção: Antoine Fuqua. Roteiro: Bill Collage. Elenco: Will Smith, Ben Foster, Charmaine Bingwa, Gilbert Owuor, Aaron Moten, Ronnie Gene Blevins, Jabbar Lewis, Michael Luwoye, Steven Ogg, Grant Harvey, Grant Harvey, Paul Ben-Victor, Jesse C. Boyd. Gênero: Ação, suspense. Nacionalidade: Estados Unidos da América. Trilha Sonora Original: Marcelo Zarvos. Fotografia: Robert Richardson. Edição: Conrad Buff IV. Design de Produção: Naomi Shohan. Direção de Arte: Tom Frohling. Figurino: Francine Jamison-Tanchuck. Produtoras: Apple TV+, CAA Media Finance, Escape Artists e McFarland Entertainment. Disponível no Apple TV+ em 09 de Dezembro (link aqui). Duração: 02h12min. Classificação: 16 anos. 
No elenco, Peter é antagonizado pelo implacável capataz vivido por Ben Foster, que num testemunho revoltante, narra um episódio familiar de extrema crueldade, quando o seu pai esfaqueou uma escrava que ele tratava como amiga, durante um almoço. A justificativa para o ódio aos negros é convertida em lógica econômica: “se começarmos a oferecer-lhes lugares à mesa, logo eles desejarão também os nossos empregos e, por fim, tomarão as nossas terras”. Nenhum preconceito é gratuito, afinal, pois serve para financiar o poderio de outrem, geralmente sob o jugo do Capitalismo.  

Apesar do desfecho bastante clicherosos e de algumas contradições insuficientemente exploradas na narrativa (a mencionada lógica religiosa, por exemplo), este filme maneja de maneira eficaz as convenções de gênero, possuindo muitos aspectos em comum com o oscarizado “12 Anos de Escravidão” (2013, de Steve McQueen), mesmo não possuindo a mesma dramaticidade. Em mais de uma situação, os personagens questionam o significado da palavra liberdade, frente às variegadas interpretações para ela. Em dado momento, um dos escravos que foge junto com Peter recusa os seus conselhos bem-intencionados, afirmando raivosamente: “tu não és o meu proprietário”. As belezas e perigos do cenário natural são muito bem explorados e o ritmo do longa é  entretenedor, mas as discussões concernentes às mazelas da escravidão e aos eventos históricos são incipientes, a despeito dos letreiros que aparecem na tela. No que tange à reabilitação da imagem do ator, o filme é positivo, portanto. Merece ser visto, discutido e, quiçá, premiado!

09 DE DEZEMBRO NA Apple TV+