Transformers : O Despertar das Feras| Assista nos Cinemas


Transformers nunca foi uma franquia muito preocupada em construir coerência ou complexidade narrativa a partir de sua cronologia. E talvez este seja um dos principais segredos de sua longevidade no Cinema. Filme após filme, plots semelhantes são reciclados sem o menor pudor e a prioridade parece ser a criação de cenas de destruição explosivas e barulhentas nas quais as duas facções rivais de Transformers, os benevolentes Autobots e os ameaçadores Decepticons, se engalfinham por mais de duas horas. Premissas simples e maniqueístas misturam os impressionantes efeitos visuais com o âmago desta franquia multibilionária baseada numa linha de brinquedos: a diversão. No decorrer das sequências, novos ingredientes foram sendo adicionados à receita: novos protagonistas humanos, novas raças de robôs, novos vilões e tramas que revelam que a relação entre humanos e Transformers remonta ao período das lendas arturianas. Mesmo com tantos elementos, a franquia Transformers nunca se tornou exatamente proibitiva ao público. O temor de expectadores “civis” de precisar assistir dúzias de filmes e séries da Marvel antes de comprar o ingresso do próximo filme dos Vingadores, por exemplo, não se aplica aqui: toda nova aventura dos robôs de Cybertron soa como um soft-reboot, uma ligeira reinvenção que apresenta seus próprios conceitos e regras, mas sem deixar de fazer menção à mitologia desenvolvida nos capítulos anteriores. Esse desprendimento narrativo, infelizmente, acabou afetando diretamente a construção e o desenvolvimento dos protagonistas humanos deste universo. Por 10 anos, a franquia foi protagonizada por personagens de papelão que eram basicamente arquétipos que beiravam o estereótipo. Foi só em 2018, com a fofíssima aventura de amadurecimento Bumblee, que um roteiro de Transformers se preocupou não apenas em desenvolver uma protagonista com um arco dramático genuinamente interessante, mas também em construir uma relação de amizade convincente entre ela e o ser metálico com quem contracena, neste caso o adorável robô-fusquinha amarelo que fala através de gravações do rádio. O spin-off ambientado nos anos 1980 foi tão bem-recebido pelo público e pela crítica (ao menos em comparação às sequências anteriores) que o mais recente capítulo da franquia, Transformers: O Despertar das Feras, pegou emprestado dele um pouco de sua alma.

Conceitualmente, este 7º filme da saga pode soar como mais do mesmo. “Transformers e humanos formam uma aliança para combater uma ameaça que busca um artefato antigo que pode causar a destruição da Terra, mas que também é a chave dos Autobots de volta pro seu planeta-natal.” Esta descrição básica poderia se referir perfeitamente ao live-action original de 2007 dirigido por Michael Bay. Mas O Despertar das Feras se destaca por injetar uma dose extra de humanidade numa trama que, sem ela, poderia soar engessada e batida. Em 1994, Noah Diaz (Anthony Ramos) é um jovem ex-soldado especialista em Tecnologia que vive na correria do Brooklyn. Filho de família de descendência latina, ele procura um emprego para ajudar sua mãe (Luna Lauren Vélez) com as despesas de casa e, principalmente, pagar o tratamento médico de seu irmão Kris (Dean Scott Vazquez), que sofre de anemia falciforme. Confrontado pela situação de sua família, ele relutantemente aceita participar do furto de um Porsche pra ganhar algum dinheiro, alheio ao fato de que o veículo é, na verdade, o disfarce de um Autobot chamado Mirage (dublado por Pete Davidson). Paralelamente a isso, a genial e esforçada pesquisadora estagiária Elena (Dominique Fishback), vive frustrada pelos créditos das descobertas que faz no museu onde trabalha serem frequentemente usurpados por sua chefe. Ao analisar uma escultura de origem desconhecida, Elena acaba por descobrir dentro da peça o fragmento de uma chave Transwap, artefato capaz de abrir portais para outras dimensões. O sinal emitido pela chave chama a atenção de Optimus Prime (dublado pelo veterano Peter Cullen), mas também atrai os Terrorcons, os novos vilões-robôs da vez. Enquanto os Autobots querem a chave Transwap para retornar a seu planeta de origem, após 7 anos presos na Terra, os Terrorcons buscam pelo caos: são lacaios de uma entidade de proporções colossais devoradora de planetas chamada Unicron. É aí que entram em cena os Maximals (as feras do subtítulo). Eles são animais robóticos cujo planeta de origem foi destruído por Unicron e que se abrigaram na Terra, escondendo os dois fragmentos da chave Transwap para evitar que caiam em mão erradas. Noah e Elena se juntam aos Autobots e os Maximals e usam suas habilidades para tentar impedir a destruição da Terra.

Trailer


Ficha Técnica

Título original e ano:  Transformers - The Rise of the Beast, 2023. Direção:  Steven Caple Jr. Roteiro: Joby Harold, Darnell Metayer, Josh Peters, Erich Hoeber e Jon Hoeber - Argumento original de Jobu Harold. Baseado nos bonecos Transformers da Hasbro. Elenco: Anthony Ramos, Dominique Fishback, Tobe Nwigwe, Peter Cullen, Ron Perlman, Peter Dinklage, Michelle Yeoh, Liza Koshy, John DiMaggio, David Sobolov, Michaela Jae Rodriguez, Pete Davidson, Cristo Fernández. Gênero: Aventura, Ação. Trilha Sonora Original: Jongnic Bontemps. Fotografia: Enrique Chediak.  Figurino: Ciara Whaley. Edição: William Goldenberg e Joel Negron.  Distribuidora: Paramount Pictures Brasil. Duração: 02h07

Dirigido por Steven Caple Jr., mais conhecido pela direção de Creed II, O Despertar das Feras apresenta uma atmosfera um pouco diferente dos filmes da franquia dirigidos por Michael Bay. Enquanto o diretor veterano responsável por Armageddon, Pearl Harbor e o recente Ambulância imprimia os vícios de sua já conhecida identidade visual nos filmes de Transformers com flares, o frequente uso do ângulo holandês, closes dramáticos na bandeira dos Estados Unidos e pores do sol hipersaturados, Caple Jr. traz pra O Despertar das Feras, seu 3º crédito de direção no Cinema, um olhar muito mais sóbrio e bem menos estilizado. Ao invés de priorizar closes com intenções quase inexplicavelmente eróticas mas superfícies brilhantes de carros e caminhões de marcas caras, como se fosse um showroom de exposição automotiva, Caple foca em elementos mais corriqueiros. O 1º ato inteiro do filme é no Brooklin noventista, mostrando o cotidiano nada glamuroso, mas cheio de vida de Noah e sua família. A falta de uma identidade visual estabelecida do diretor resulta em cenas que talvez possam ser consideradas um tanto genéricas, em especial as cenas de ação com muitos efeitos visuais. Mas ninguém pode negar que Caple Jr. faz um excelente trabalho dirigindo seu elenco.

                                                                                                                  Créditos: Divulgação 
Parte da trama é inspirada em "Beast Wars: Guerreiros Virtuais (1996)", os Maximals aparecem e podem se transformar em animais e ainda viajar pelo tempo


O elemento humano é muito bem explorado neste início, apresentando uma realidade que faz o protagonista não ver um futuro muito brilhante adiante. Apesar de querer se sacrificar pela família, ser otimista pra ele soa quase infantil. "A vida não é um gibi", diz o Noah de Anthony Ramos ao irmão antes de se arrepender quase que imediatamente, com medo de matar as esperanças do garoto. Ainda que não seja lá muito profundo, é um oceano sem fim comparado as atrocidades que Michael Bay fazia o público engolir com os protagonistas vividos por Shia LaBeouf e Mark Wahlberg. Essa descrença de que heróis surgirão para salvar sua família que o motiva a embarcar na aventura ao lado dos Transformers. Ele resolve ser seu próprio herói. Elena, vivida por Dominique Fishback, não se deixa abalar pelas adversidades. Enfrentando seus medos com muito carisma, a personagem parece sempre disposta a encontrar uma saída, mesmo quando os problemas parecem insolúveis. Pena que sua personagem, tão vital em descobrir pontos-chave da trama e guiar o time mocinho até o Peru, acabe sendo deixada de lado no último ato, quando a inteligência já não é mais necessária e a força bruta se torna palavra de ordem. São estes protagonistas que encabeçam um elenco de rostos desconhecidos, mas com estrelas emprestando suas vozes para os personagens digitais. Além de Pete Davidson, temos também Ron Perlman, Michelle Yeoh e Peter Dinklage na dublagem.

                                                                                                                                         Créditos: Divulgação 
A ganhadora do Oscar deste ano na categoria de melhor atriz, Michelle Yeoh dubla Airazor, fazendo dela mais um oscarizado a dar voz a um Transformer, depois do cineasta Orson Welles ter aparecido como Unicron em Transformers: O Filme (1986). 

O último ato do longa acaba sendo bem menos empolgante, se resumindo a lutas convencionais feitas em computação gráfica, com direito a entradas triunfais, discursos motivacionais inspiradores e uma conclusão bastante previsível. Se passando mais de 10 anos antes do 1º filme, O Despertar das Feras se apoia demais no senso de perigo sofrido por seus personagens digitais, risco que é totalmente diluído já é sabido que estavam vivos nos filmes que cronologicamente se passa depois desse aqui.

Mesmo com alguns deméritos, muitos deles diretamente ligados a obrigatoriedades narrativas de uma obra conectada a uma franquia e que precisa se adaptar às demandas de um universo expandido (e que aparentemente não pretende se encerrar nem tão cedo), O Despertar das Feras se beneficia de sua trama bem estabelecida e de seus personagens bem-construídos, se firma como um dos melhores capítulos da saga.

Hoje nos Cinemas 

Escrito por Petterson Costa

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