O novo filme de André Ristum (Meu País, 2011) retrata os horrores cometidos no hospital psiquiátrico Colônia, em Barbacena - MG, tomando como protagonista Elisa, uma jovem filha de fazendeiros que é internada compulsoriamente por ter engravidado antes do casamento e - pior ainda - de um homem diferente do seu noivo prometido. Com um atestado de esquizofrenia conseguido por seu pai, Elisa passa a viver em negação na ala feminina do sanatório, acreditando que logo sairá dali. Logo, ela é “adotada” por uma interna, vivida por Rejane Faria (Marte Um, 2022), que foi parar ali pelo mesmo motivo décadas atrás.
A habilidade em criar uma atmosfera envolvente, permeada por uma tensão palpável, é digna de elogios. Outro ponto positivo é a direção de elenco, que garantiu ótimas atuações em um mesmo patamar de qualidade e de tom. No entanto, não podemos ignorar a falta de tato com que uma tragédia histórica tão grande foi abordada. Primeiramente, a escolha da protagonista é questionável. Por que acompanhar o drama de uma jovem branca e rica se a maior parte dos residentes eram negros e pobres? Além disso, a decisão de transformar uma história de genocídio em terror sobrenatural, gera por si só questionamentos éticos. Mas já que a intenção foi essa, por que evitar citar alguns dos maiores horrores acontecidos naquele local? A comida podre e cheia de larvas, a sujeira de urina e fezes, as crianças aprisionadas, os corpos amontoados… tudo isso geraria impacto que só ajudaria no funcionamento do gênero. A impressão que fica é a de que tentaram higienizar a narrativa.
Por exemplo, em um local que sofria de superlotação, em que pessoas já morreram sufocadas, cenas como a da festa junina simplesmente não fazem sentido. Aliás, todas as cenas passadas no pátio dão a sensação de que o hospital contava com poucas dezenas de pacientes. No mínimo, faltou figuração. A sequência final também carece de sensibilidade. Transformar uma tragédia de proporção nacional em uma trama de vingança individual tem um quê de mau gosto difícil de engolir. Para além de explorar uma dor real de maneira inadequada, o filme perde a oportunidade de abordar questões importantes de forma mais complexa e responsável.
Trailer
Título original e ano: Ninguém Sai Vivo Daqui, 2023 | Direção: André Ristum | Roteiro: André Ristum, Marco Dutra e Rita Glora Curvo - adaptação livre do livro ''Holocauto Brasileiro'', de Danela Arbex | Elenco: Fernanda Marques, Augusto Madeira, Andréia Horta, Rejane Faria, Naruna Costa, Aury Porto, Arlindo Lopes e Bukassa Kabengele | Nacionalidade: Brasil | Gênero: Drama, Terror | Direção de Fotografia: Hélcio Alemão Nagamine | Direção de Arte: Dani Vilela | Montagem: Bruno Lasevicius | Trilha Sonora Original: Patrick de Jongh | Produtora: Sombumbo | Distribuidora: Gullane. Duração: 96min.
Locais: Cine Brasília (106/107 Sul), Espaço Cultural Renato Russo (508 Sul), Complexo Cultural de Planaltina, Complexo Cultural Samambaia, Hotel Hplus Vision e Auditório II do Museu Nacional da República.
Ingressos da Cerimônia de Abertura: Gratuito com retirada na bilheteria do Cine Brasília a partir de duas horas antes da programação.
Ingressos da Mostra Competitiva Nacional a R$ 20,00 e R$ 10,00, à venda na bilheteria do Cine Brasília a partir de duas horas antes de cada sessão.
Ingressos da Mostra Competitiva Nacional no Complexo Cultural Samambaia tem entrada gratuita e retirada de ingresso uma hora antes da sessão.
Ingressos Mostra Brasília no Cine Brasília tem entrada gratuita e retirada de ingressos duas horas antes da sessão.
Demais exibições com entrada franca.
Programação completa: festcinebrasilia.com.br
Um comentário:
Concordo plenamente. Com cada linha. Observações mui acertadas: de fato, o filme é até envolvente no início, de ignorássemos as questões morais e a covardia na opção pelo protagonismo branco e rico. O desfecho, então.. aff! Parabéns pelo texto!
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