segunda-feira, 29 de julho de 2024

O Mal Não Existe, de Ryusuke Hamaguchi


O Mal Não Existe. Nem o bem. Não há um universo com uma consciência maniqueísta que compensa a balança dos acontecimentos conforme esse critério. Não há um deus bom que é responsável por tudo que é belo. Nem um demônio mau que clama por tudo aquilo que é ruim. O que existe é a natureza. Seres humanos. Instintos, sentimentos. Um sistema econômico social que tenta manter o controle pela racionalidade. Um sistema econômico que tenta controlar pela necessidade. O novo longa-metragem de Ryusuke Hamaguchi (Drive My Car) não explica seu título em nenhum momento. Não há sequer um diálogo sobre o tema. Mas pistas visuais e narrativas acusam esse caminho.

A primeira metade do filme versa sobre o cotidiano de um pequeno vilarejo de seis mil habitantes nas redondezas de Tóquio. O diretor não se apressa em estabelecer o clima através do protagonista Takumi: ele corta lenha; coleta água direto de uma nascente; passeia com sua filha Hana no meio da floresta enquanto explica para a criança sobre cada árvore pela qual passam; janta na companhia de seus amigos, tudo em um ritmo contemplativo de quem tem tão pouco compromisso com o tempo que constantemente se esquece do horário de buscar a criança na escola.

A paz local ameaça ser quebrada quando uma empresa pretende estabelecer um camping de luxo na região. A expectativa dos moradores é a de que o rio ficará sujo devido a uma fossa que será construída, de que os turistas irão tumultuar a vila e fazer fogueiras na floresta com seu costume de assar churrasco. A companhia responsável marca uma reunião para ouvir as preocupações e demandas da comunidade, mas trata-se apenas de uma formalidade para constar nos relatórios. Da parte dos manda-chuvas há pouca ou nenhuma intenção de negociar, visto que o empreendimento precisa ser construído o quanto antes para cumprir o prazo previsto no projeto e receber o fomento do governo.
                   
                                                               Crédito de Imagens: Divulgação/ Imovision/ Fictive/ NEOPA
A produção saiu vencedora de seis prêmios no Festival de Veneza em 2023. Entre os louros, ''Melhor Filme'', ''Melhor Filme segundo o Juri'', o ''FIPRESCI'' e mais três prêmios especiais.

O contraste entre o tempo de cada polo é nítido. Takumi e seus conterrâneos querem mais reuniões, um replanejamento, pois estão acostumados à calmaria de sua rotina. O diretor da empresa termina correndo um encontro com seus subordinados para atender a outro compromisso e exige que os funcionários voltem à vila ainda no mesmo dia. Por sua vez, os encarregados Mayuzumi e Takahashi se encontram no meio do caminho. Embora sejam ignorantes quanto ao ambiente silvestre, estão dispostos a aprender. Embora entendam o lado da comunidade, ainda querem que o camping seja construído. E embora sejam vistos com maus olhos pelos cidadãos locais, estão apenas seguindo ordens que não lhes rendem nenhum benefício.

Conforme acompanham Takumi em seus afazeres, tornam-se encantados por seu estilo de vida. Fica cada vez mais claro o quanto estão mais próximos de Takumi que de seu patrão. No entanto, ainda são intrusos naquele habitat e sua ingenuidade os coloca em perigo. Seja por meio do espinho das plantas, seja pelo instinto animal.
 
 
Trailer 

 Ficha Técnica
 
Título original e ano: Aku wa sonzai shinai, 2023. Direção: Ryûsuke Hamaguchi. Roteiro: Eiko Ishibashi, Ryûsuke Hamaguchi. Elenco: Hitoshi Omika, Ryo Nishikawa, Ryuji Kosaka, Ayaka Shibutani, Hazuki Kikuchi, Hiroyuki Miura. Gênero: Drama. Nacionalidade: Japão. Direção de fotografia: Yoshio Kitagawa. Direção de arte: Yoshio Kitagawa. Música: Eiko Ishibashi. Montagem: Azusa Yamazaki. Design de Produção: Masato Nunobe. Produção: Satoshi Takada. Empresas Produtoras: Fictive e NEOPA. Duração: 106 min. Classificação: A definir
EM EXIBIÇÃO NOS CINEMAS

Um comentário:

Pseudokane3 disse...

Vi ontem, e fiquei impressionado. Li o texto e, se por um lado, estranhei a maneira abrupta com que ele termina, por outro, isso tem tudo a ver com o desfecho da obra em si e com nossas responsabilidades a partir dela: continuemos!

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