quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Bernadette, de Léa Domenach


“Nem todos os homens costumam telefonar para as suas esposas, com tanta freqüência”…  


O estilo despojado da diretora Léa Domenach, ainda principiante, chama a atenção pela maneira como presta reverência a um ícone feminista de direita sem que, para isso, seja necessário santificá-la, ao contrário do que se teme, quando percebemos que a narração de abertura é conduzida por um coral de igreja. Por mais que agradeça explicitamente, nos créditos de encerramento, pela inspiração advinda da mulher que foi primeira-dama francesa entre 1995 e 2007, a diretora, que é também co-roteirista de seu filme, não hesita em expô-la como oportunista, o que é justificado pelas ações filantrópicas que ela desenvolveu e apoiou. Política é, admitamos, uma opção pelo “mal menor”, muitas vezes!

Não obstante o tom satírico desta biografia – que possui muitos aspectos inventados, tal qual antecipa a narração supracitada –, a diretora não converte o seu filme numa comédia unilateral: a dramaticidade inequívoca de algumas situações é mantida, visto que o que interessa à realizadora é o contrário do que a verdadeira Bernadette Chirac declarava em entrevistas, ou seja, que “sempre obedecia ao seu marido”. Tendo crescido num mundo com valores conservadores, em que as mulheres devem se manter fiéis aos homens – ainda que eles não façam o mesmo –, a personagem real ousa trilhar um caminho paralelo para si mesma, de maneira que, assim, serve como estímulo ativo para as jovens audiências.

Ampliando as conotações empoderadas da personagem-título do filme “Potiche – Esposa Troféu” (2010, de François Ozon) – este sim, uma comédia sardônica! –, Catherine Deneuve, ela própria considerada “a primeira-dama do cinema francês”, está completamente à vontade enquanto protagonista, dominando todos os instantes em que está em cena, conquanto seus coadjuvantes serem integrantes da prestigiada instituição Comédie-Française: no início, ela é mostrada como uma dondoca brega e, encontrando a orientação adequada, assume a alcunha de ‘vintage’, tomando por modelo a subitamente falecida Diana Spencer [1961-1997], duquesa de Windsor.

Trailer



Ficha Técnica

  • Título original e ano: Bernardette, 2023. Direção: Léa Domenach. Roteiro: Clémence Dargent, Léa Domenach. Elenco: Catherine Deneuve, Denis Podalydès, Michel Vuillermoz, Sara Giraudeau, Laurent Stocker,  Artus,  Françouis Vicentilli, Olivier Breitman, Jacky Necerssian. Gênero: Comédia Dramática. Nacionalidade: França. Direção de fotografia: Elin Kirschfink. Música: Anne-Sophie Versnaeyen. Direção de arte: Jean-Marc Tran Tan Ba. Edição: Christel Dewynter. Produção: Nora Chabert, Fabrice Goldstein, Marco Pacchioni, Antoine Rein. Empresas Produtoras: Karé Productions,  France 3 Cinéma,  Marvelous Productions,  Umedia,.Distribuição: Imovision. Duração: 95 min

Para a transformação positiva de Bernadette Chirac, foi de vital importância, segundo o que vemos no filme, a contribuição do assessor Bernard Niquet (muitíssimo bem interpretado por Denis Podalydès), que, partindo de uma pesquisa de opinião sobe a popularidade da primeira-dama, ajuda-a a modificar as impressões desencadeadas na população francesa, como uma mulher antiquada, austera e fria ou mal-humorada. O sobejo de breguice em suas vestimentas (um sobretudo cor-de-rosa, por exemplo) favorece as impressões em pauta, de modo que ela passará por uma transformação radical, após a intervenção de um conceituado estilista.

Mas vamos do princípio: quando conhecemos a personagem Bernadette Chirac, ela está conversando com um padre (Jacky Nercessian), que elogia a sua intuição geralmente acertada. Bernadette reza para que seu marido, Jacques Chirac (Michel Vuillermoz), seja eleito presidente da França, o que efetivamente ocorre, mas ela é ignorada em diversos eventos comemorativos, geralmente por causa das orientações de sua filha Claude (Sara Giraudeau), que é secretária do pai político e insiste na difusão pública de um ideário de dama servil para a sua mãe. Relegada aos “papéis tradicionais de mulher”, a Bernadette Chirac resta ajudar o marido a dar o nó em sua gravata ou escolher o jantar…

Créditos de Imagens: Divulgação / Imovision
A produção se manteve afastada da família para conseguir ter liberdade criativa. E, portanto, A filha de Bernadette, Claude, falou explicitamente contra o projeto em meados de 2022.

Extremamente incomodada pelo modo como é posta de lado em ocasiões importantes, incluindo uma reunião com o presidente dos EUA e sua esposa (à época, o casal Clinton), Bernadette toma a decisão cabal de desobedecer quando descobre mais uma traição de seu marido, que finge estar numa reunião secreta quando, em verdade, estava com uma amante italiana. A partir daí, ela utiliza a sua influência enquanto personalidade local e, em cidades do interior francês, arregimenta a sua carreira enquanto ativista de causas sociais – nem todas bem-sucedidas, conforme destacará a narração final. Bernadette Chirac, portanto, torna-se uma figura-chave não apenas para a reeleição de seu esposo como também para a escolha de seu sucessor, Nicolas Sarkozy (Laurent Stocker), em relação ao qual mantinha um ressentimento pessoal de longa data. Soma-se a isso a maneira como o casal Chirac lida com a outra filha, Laurence (Maud Wyler), constantemente internada numa casa de repouso, por causa de crises anoréxicas. Este será o diferencial comovedor no livro autobiográfico que ela escreve. 

Entremeando situações ficcionais com reportagens reais, a diretora faz com que admiremos o reconhecimento identitário desta mulher, outrora submissa e desperdiçada em suas volições. Para que não nos sintamos culpados pela empolgação diante de uma personalidade filiada aos valores da direita política, convém enfatizar que os seus principais opositores são a extrema-direita (então presidida pelo racista Jean-Marie Le Pen), de modo que, mais uma vez, opta-se pelo “menos pior”. A montagem é ágil, a trilha musical é empolgante e os eventos mostrados no roteiro evitam o polemismo noticioso, optando por dilemas familiares (o instante em que Jacques urina na tartaruguinha de Bernadette é revoltante) e por uma identificação proveitosa entre a personagem real e a estrela que a interpreta. Que este filme seja lançado num ano eleitoral, aqui no Brasil, é um detalhe ainda mais proveitoso: antes de escolhermos os nossos representantes, além de analisar as suas propostas, seria interessante também averiguar o que ocorre nos bastidores, quando possível. Este filme, além de muito divertido, é também elucidativo! 

HOJE NOS CINEMAS

Burger KingⓇ realiza ação de troca de peça queimada por Whopper(R) para comemorar o Dia do Gamer esta quinta-feira (29/08)

Burger King® vai trocar peça queimada por Whopper® para comemorar o Dia do Gamer
 
Basta levar uma peça de computador ou videogame queimada nas lojas selecionadas apenas, hoje, no dia 29 de agosto
 
Se seu PC Gamer superaqueceu e está com alguma peça que foi de base, não se desespere, o BK® vai te recompensar! Neste ano, o Burger King® vai tornar o Dia do Gamer mais saboroso e dar um WHOPPER® para todos os fãs de videogames, presenteando aqueles que tiveram aquela decepção de ter uma peça do seu setup que queimou.
 
O Burger King® está mais uma vez entrando no universo gamer após parcerias de sucesso voltadas para esse público. “Temos muita aproximação com e-Sports e queremos recompensar, de alguma forma, aqueles fãs de BK®, que estão no universo gamer. Esta foi a forma divertida de trazer mais sabor, mesmo depois do game over de seu equipamento”, afirma Igor Puga, CMO da ZAMP®, master-franqueada do Burger King® e Popeyes® no Brasil. “As collabs com Call of Duty, Free Fire e Loud são provas de que o BK tem grande fit com este público, e desta vez vamos retribuir a fidelidade dos gamers com o BK, oferecendo nosso famoso WHOPPER® a eles”.
 
Apenas, hoje, no dia 29 de agosto, quem aparecer nas lojas participantes do Burger King® e mostrar a peça PC gamer ou videogame que foi de arrasta pra cima ao atendente no balcão, vai poder pedir um WHOPPER®. Depois disso, o gamer vai ser orientado a depositar a peça em uma caixa de coleta específica para descarte deste tipo de material, e então retirar seu sanduíche para comemorar a data.
 
Além de fazer esse agrado ao público gamer, a iniciativa do BK® é uma parceria com a Associação Brasileira de Reciclagem de Eletroeletrônicos e Eletrodomésticos (ABREE), que realiza a logística reversa desses produtos no país, para garantir sua destinação final ambientalmente adequada. No Dia do Gamer, caixas de coleta da ABREE serão colocadas em 23 lojas do Burger King® para coleta de resíduo eletrônico de pequeno porte, que posteriormente serão recolhidos pela instituição. Você pode conferir as lojas participantes no link.
"Estamos muito felizes em colaborar nesta ação, pois ela populariza a cultura do descarte correto de produtos eletroeletrônicos e contribui para mitigar uma série de problemas para o meio ambiente e a saúde pública. Por isso, na ABREE, investimos em educação ambiental, realizamos campanhas itinerantes pelo Brasil e disponibilizamos mais de 3,4 mil pontos de recebimento, espalhados por mais de 1,3 mil municípios, que podem ser localizados em nosso site", destaca Helen Brito, Gerente de Relações Institucional da ABREE.
Sobre Burger King®
 
O Burger King® é uma das maiores operações de fast food do Brasil, presente em todos os estados do país. O primeiro restaurante da rede foi inaugurado no Brasil em 2004, passando a ser operado oficialmente pela máster franqueada brasileira ZAMP® em 2011. Com mais de 1.000 estabelecimentos, entre lojas próprias e franqueadas, a marca foi considerada uma das mais criativas do mundo por três anos consecutivos em Cannes. Para saber mais sobre Burger King® no Brasil, acesse o site ou acompanhe a marca no Facebook, Twitter, Instagram e YouTube.
Sobre a ABREE
Fundada em 2011, a ABREE – Associação Brasileira de Reciclagem de Eletroeletrônicos e Eletrodomésticos – é uma entidade gestora sem fins lucrativos, que define e organiza o gerenciamento da implementação do sistema coletivo de logística reversa de produtos eletroeletrônicos e eletrodomésticos, promovendo economia de grande escala. Com 54 associadas que representam 182 marcas, a ABREE é responsável pelo gerenciamento através da contratação, fiscalização e auditoria dos serviços prestados por terceiros, além de contribuir com informações para todos os envolvidos da cadeia, responsáveis pela viabilização da logística reversa de eletroeletrônicos e eletrodomésticos no país. Para mais informações, acesse http://abree.org.br/

Longlegs, de Osgood Perkins


O plano-sequência misterioso do início do aguardado ''Longlegs'', do diretor Osgood Robert Perkins (ou apenas "Oz" Perkins), estabelece bem o tom de terror investigativo, com elementos do sobrenatural, proposto pela trama. Nesse contexto, a produção acerta na escolha pelo formato reduzido de tela (impressão 16mm) - recurso, aliás, nada novo - pois se encaixa bem na proposta visual e estética do filme, claustrofóbica e memorialista, que conta a história centrada na busca da agente do FBI, Lee Harker, a um serial killer.

O longa de Oz Perkins constrói o mistério de forma crescente, pois Harker, bem interpretada por Maika Monroe, guarda características intuitivas/dedutivas com a propriedade de uma vidente nata. Assim, na medida em que a investigação avança, as pistas ficam mais pessoais e enigmáticas para a policial. Já o ator Nicholas Cage, talvez a aparição mais aguardada aqui, não ganha tanto tempo de tela, mas desenvolve um personagem claramente afetado pela loucura (meio palhaço, meio performer).

Não há como ignorar as semelhanças de Longlegs com filmes como o clássico dos anos 90, O Silêncio dos Inocentes (Jonthan Demme), ou mesmo com obras de David Fincher, especialmente Seven (1995) e Zodíaco (2007). No entanto, ao enfatizar bastante a atmosfera de perturbação e agonia que enclausura a protagonista, Longlegs se vincula a filmes como A Bruxa (Robert Eggers, 2016) ou ainda Invocação do Mal (James Wan, 2013). Certas sequências realmente enfatizam o sensorial, dando uma dimensão de "cerco fechado" à situação de Lee Harker.

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Ficha Técnica
Título Original e Ano: Longlegs, 2024Direção e Roteiro: Oz Perkins. Elenco principal: Nicolas Cage, Maika Monroe, Alicia Witts e Blair Underwood. Gênero: Terror. Nacionalidade: EUA e Canadá. Trilha Sonora Original: Elvis Perkins. Direção de Fotografia: Andres Arochi. Montagem: Graham Fortin e Greg Ng. Produção:  Nicolas Cage, Dave Caplan, Dan Kagan e Brian Kavanaugh-Jones. Design de Produção: Danny VermetteDireção de Arte: Brendan Megannety. Figurino: Mica Kayde. Empresas Produtoras: C2 Motion Picture Group, Cweature Features, Oddfellowes Entertainment, Range Media Partners,  Saturn Films,  Traffic., Waypoint Entertainment. Distribuidora: Diamond Films Brasil. Duração: 101 min.
Embora seja possível identificar tais referências, Longlegs consegue se afirmar por uma curiosa abordagem estabelecida pelo viés do diretor, além de apresentar boas atuações (especialmente da protagonista Maika Monroe e realçar as particularidades de Nick Cage). Entretanto, a película não é tão bem resoluta em alguns aspectos e o plot twist acaba por esclarecer os rumos da trama e se apresentando como um facilitador excessivamente ilustrativo. Outras saídas para o mistério encontradas pelo filme, como o vínculo com o ocultismo ou a simbologia proposta, poderiam ser mais aprofundadas.

Para quem não se recorda, Oz Perkins é filho de Anthony Perkins, o ator reconhecido pela icônica e emblemática performance no clássico Psicose (1960), Obra-prima de Alfred Hitchcock, como Norman Bates. Seguindo o mesmo gênero cinematográfico em que atuou o pai, Oz Perkins fez diversos filmes de suspense e terror, dentre os quais é possível destacar, pela sua semelhança com Longlegs, A Enviada do Mal (em inglês February), de 2014. Posteriormente, em 2020, Oz Perkins iria realizar Maria e João: O Conto das Bruxas (2020), longa que gerou reações negativas de público e crítica.

                           Créditos de Imagens: ©MMXX. NEON Rated, LLC. All rights reserved.
Rodado no Canadá, entre janeiro e fevereiro de 2023,  a película é dedicada as mães de Perkins e Cage

Pode-se ressaltar que em Longlegs, o mistério é criado pela expressão enigmática de Maika Monroe, fator que acaba por levantar suspeitas sobre a sua proximidade com os crimes do filme. Interessante também é a sutileza com a qual a história, na maioria do tempo, é conduzida, fugindo ao excesso de ações de perseguições e jump scares baratos.

Entre os méritos do filme está, ainda, a participação de Nick Cage, com um papel apropriado para ele. O ator, que desde 2020 já esteve em mais de 10 produções, segue numa veia menos cômica e bem mais séria desta vez. Ademais, a qualidade do filme, mesmo com problemas, é sua efetividade em produzir desconforto e perturbação. Nem sempre é a história que se deve entender, apresentar explanações e respostas, mas cabe ao espectador tirar conclusões diante das sensações e emoções geradas pela obra.

Avaliação: Três charadas e meia (3.5/5)

HOJE NOS CINEMAS

sexta-feira, 23 de agosto de 2024

Tipos de Gentileza, de Yorgos Lanthimos


Um Yorgos Lanthimos em seu estado mais alucinante e provocativo debuta nos cinemas esta semana em quase toda a América Latina (Argentina, Brasil, Peru, Venezuela e México) com o aguardado e ilustre ''Tipos de Gentileza''. O filme conta com performances de Emma Stone, Willem Dafoe, Jesse Plemons, Hong Chau, Margaret Qualley, Joe Alwyn, Ja'Quan Monroe-Henderson, Hunter Schafer, Merah Benoit e apresenta três atos totalmente distintos um dos outros e que se conectam pela presença de um único personagem, este vivido por Yorgos Stefanakos. O elenco, por sua vez, é o mesmo em todos os seguimentos, porém reaparecendo com novos enredos. As temáticas são as mais curiosas e inusitadas possíveis como canibalismo, relações matrimoniais, seitas religiosas, e etc. As cenas são pinceladas a momentos sexuais entre os personagens, justificando ainda mais a classificação recebida de ''obra para maiores de 18 anos''.

Indicado a cinco prêmios em festivais de cinema ao redor do mundo (Cannes Film Festival, Munich Film Festival, Sidney Film Festival, Cinefest - Miskolc International Film Festival e Brussels International Film Festival) e ganhador do prêmio de ''Melhor Ator'' para Jesse Plemons em um deles, o renomado Festival de Cannes, o roteiro tem assinatura de Lanthimos e seu parceiro de longa data Efthimis Filippou. Os dois trabalharam juntos também nos magistrais e profundos ''Dente Canino'' (2009), ''A Lagosta (2015) e ''O Sacrifício do Cervo Sagrado'' (2017) e aqui retornam com o mesmo sabor e tom único que a parceria apresentou no passado. 

O longa, que foi rodado quando o oscarizado ''Pobres Criaturas'' ainda estava sendo editado, é produzido pela Searchlight Pictures e também Element Pictures, FILM4 e TGM Entertainment. A distribuição fica por conta da 20th Century Studios / The Walt Disney Company. Emma Stone abrilhanta um filme de Lanthimos pela quarta vez e já está alinhada para o seu próximo longa, ''Bugonia''.

Trailer


Ficha Técnica

Título Original e Ano: Tipos de Gentileza, 2023. Direção: Yorgos Lanthimos. Roteiro: Yorgos Lanthimos e Efthimis Filippou. Elenco: Emma Stone, Willem Dafoe, Jesse Plemons, Yorgos Stefanakos, Hong Chau, Margaret Qualley, Joe Alwyn, Ja'Quan Monroe-Henderson, Hunter Schafer, Merah Benoit. Gênero: Comédia, Drama, Dark Comedy. Nacionalidade: Irlanda, Estados  Unidos da América, Rreino Unidoe Grécia. Trilha Sonora Original: Jerskin Fendrix. Fotografia: Caroline Champetier. Edição: Yorgos Mavropsaradis. Design de Produção: Anthony Gasparro. Direção de Arte: Chris Cornwell e Andrew Carnwath. Figurino: Jennifer Johnson. Empresa Produtora: Element Pictures, FILM4, Searchlight Pictures e TGM Entertainment. Distribuição: 20th Century Studios. Duração: 02h44min.  
A primeira parte da narrativa se inicia ao som do clássico ''Sweet Dreams (Are Made Of This)'', do duo britânico Eurythmics, como uma forma de encantamento para que o espectador se atente ao que vem por ai e tente perceber que está descendo as escadas de um universo de histórias que causará estranheza por serem um pouco absurdas. Assim, um assassinato é encomendado de patrão a subordinado e este último, Robert (Jesse Plemons) não necessariamente consegue seguir em frente com o pedido do poderoso Raymond (Willem Dafoe). Robert tem levado, aliás, uma vida regrada por comandos de Raymond. Desde a escolha da esposa, Sarah (Hong Chau), que o abandona quando descobre, até a necessidade de que o homem fale ao chefe o que come, onde vai, o que faz. Logo, a relação fica tumultuada quando solicitações não são cumpridas. Robert, contudo, sentindo o afastamento do chefe, dá seu jeito e consegue finalizar suas tarefas, pois ele não se vê sem a presença de Raymond em sua vida e tem uma ligação muito afetiva a este. O nome do homem que Raymond solicita o extermínio é R.F.M (Yorgos Stefanakos) e sua presença será percebida nos outros dois seguimentos. 

A segunda história diz respeito ao policial Daniel (Jesse Plemons agora sem bigode) e o desaparecimento de sua esposa Liz (Emma Stone), após um passeio para mergulhar. Os colegas de trabalho acreditam que ele talvez tenha esperança do retorno da mulher, mas que não seria bom continuar acreditando que ela está bem. Recebe Neil (Mamoudou Athie) e Martha (Margareth Qualley) para um jantar e cenas dos quatro em outros momentos vem a tona enquanto conversam sobre a mulher desaparecida. O grupo de amigos se conecta por uma intimidade sem igual e o momento entrega detalhes da relação que os quatro tem. No entanto, certo dia, do nada, Liz retorna ao lar deixando a todos menos infelizes, mas assustados por seu comportamento contraditório. Daniel até a questiona o que ela estava comendo enquanto estava perdida e a resposta vem rapidamente ''frutas, animais, peixe'', mas cenas emergem e deixam a entender de que talvez tenha sido algo a mais. Os conflitos surgem a partir desta chegada. Assistimos o comportamento de Daniel mudar bruscamente e fazer pedidos a esposa que ela atende sem qualquer racionalidade. O homem começa a se questionar então se realmente ela é a Liz que ele conhecia. Há muito contexto sexual, violência e até de canibalismo no recorte e tudo se finaliza com fantasia, deixando mais perguntas que respostas a quem assiste.

O terceiro arco narrativo gira em torno de uma seita moderna que está em busca de seu messias. Fala-se que este, ou melhor, esta seria uma jovem com poderes de cura e que teria nascido gêmea, mas a irmã não estaria mais viva. O lider da seita, Omi (Willem Dafoe), solicita que seus seguidores deixem suas famílias e vivam somente para o grupo. O que fica claro que é feito por Emily (Emma Stone) que abandona a filha pequena (Merah Benoit) e o marido Joseph (Joe Alwyn). Emily tem como parceiro Andrew (Jess Plemons) e os dois tem buscado de todas as formas encontrar esta líder religiosa. Todavia, o marido e a filha de Emily pedem a ela que venha jantar com eles, pois sentem sua falta e ela, mesmo contra a indicação do líder de não ter mais contato familiar, retorna a sua casa para passar alguns momentos com eles. A mulher acaba sendo levada inconsciente e a força para cama pelo marido, pois ele a droga. Ao acordar, Emily percebe o erro, mas já é tarde demais. Quando retorna a seita, é posta à prova se está ''contaminada'' e se poderá continuar vivendo em comunidade e infelizmente seu mundo desmorona. O ato é um dos maiores e que lida com temáticas religiosas, abusos dos mais diversos tipos, sexualidade e que delineia características profanas dos personagens. O longa chega aos créditos com R.M.F retornando a cena sentado em um fast food deixando mais duzentas mil perguntas na cabeça do público. 

                                        Crédito de Imagens: © 2024 Searchlight Pictures All Rights Reserved.
''Tipos de Gentileza'' é o filme mais longo de Yorgos Lanthimos, com duração de 2h44min.

O roteiro vem em contraposição aos últimos trabalhos em que Yorgos dirigiu como ''Pobres Criaturas'' e ''A Favorita''. Ainda assim, a estranheza, o choque e a maluquice que se evoca é algo muito conhecido de obras anteriores dele (Dente Canino ou até O Sacrifício do Cervo Sagrado). Há desabor, agonia, medo, horror, e muitos sentimentos que surgem a partir do absurdo que os atos apresentam. Para um público mais conservador, a criatividade que a trama busca passar não terá nenhum sentido, mas para o cinéfilo que é aberto a pensar e digerir com mais calma o filme, mesmo não sendo o melhor do diretor, será ainda um tempo muito rico e proveitoso.

É glorioso o trabalho do elenco quando este interpreta três ou mais personagens em cada ato. O que Yorgos expurga de cada um de seus colaboradores artísticos é sim de tirar o fôlego. Nos dois primeiros momentos principais do filme, Jesse Plemons talvez tenha mais importância em todos os cenários e sua atuação é espectacular. Quando no terceiro, Emma Stone toma a frente da narrativa e é maravilhosa, por sua vez. Os coadjuvantes como Willen Dafoe, Hong Chau, Mamoudie Athie e Margareth Qualley somam sempre que estão em cena e também conseguem se desvencilhar de personagens e vestir outros com facilidade. 

A trilha sonora é permeada de sons de piano em notas graves, ou que dão o tom para ambientes de classe alta. Também ouve-se aqui e ali sons de vozes femininas e masculinas, como um coral paralelo, sintetizando momentos de tensão. O figurino vai se adequando a cada quadro e enredo, cabelo e maquiagem vão se alternando e também se modificam. Os takes são emblemáticos por focarem em mãos e corpos e, muitas vezes, não evidenciar os rostos dos personagens. A fotografia brinca com a própria trama e intercala o colorido com o PB.

Avaliação: Três orgias cerebrais (3/5).

Em Exibição Nos Cinemas

Pisque Duas Vezes, de Zöe Kravitz.


Com o ganho de assertividade para as minorias na sociedade, uma das temáticas que tomou pauta cada vez mais está ligada ao papel da mulher negra em um mundo racista. Posicionada, em sua juventude, como um objeto sexual, ou doméstica, e em sua velhice, como cuidadora ou conselheira, a mulher negra nunca antes teve o valor para relacionamentos afetivos ou até mesmo procriação, em contraposição ao lugar que a mulher branca esteve desde sempre (ver ''Mulher Negra. Afetividade e Solidão'', de Ana Claudia Lemos Pacheco, de 2013). A partir deste raciocínio, o primeiro filme de Zöe Kravitz, na direção e roteiro, apresenta Frida, uma jovem mulher negra, vivida por Naomie Ackie (I Wanna Dance With Somebody), que tem o ofício de garçonete e resolve trocar o uniforme para entrar de penetra na festa que está trabalhando com a ajuda de sua amiga Jess, interpretada por Alia Shawkat. A moça esbarra por acidente e cai de frente com o homenageado da noite, Slater King (Channing Tatum). Do encontro inusitado surge um convite para ir com o ricaço à sua ilha por alguns dias. Os amigos do rapaz, Vic (Christian Slater), Cody (Simon Rex), Tom (Haley Joel Osment) e  Lucas (Levon Hawke), e mais algumas convidadas, entre elas, Sarah (Adria Arjona), Camila (Liz Caribel) e Heather (Trew Mullen), também estão na lista de presentes, além do segurança (Chris Costa) e da assistente pessoal do homem, Stacy (Geena Davis). As duas decidem por aceitar a oferta e embarcam com eles para o paraíso. Por lá, ganham roupas, comida, bebidas e tem dias floridos na piscina e em conversas grupais. Jess, contudo, começa a achar estranho a atitude de todos nos lugar, desde os funcionários da casa, até mesmo aos homens que vieram com elas. A moça acaba sendo mordida por uma cobra e na sequência, Frida percebe que a amiga sumiu. Tenta então investigar o que está acontecendo e até arranja uma aliada em Sarah, está última veio ao lugar com o intuito de fisgar o multimilionário e perdeu espaço, mas percebe que todas as mulheres na ilha estão em risco, pois andam aparecendo com roxos no corpo sem lembrar exatamente o que rolou direito nas últimas noites. As duas encontram itens importantes, com o auxilio de uma das funcionárias da casa, e conseguem rememorar situações passadas ali. Logo, a dupla irá enfrentar uma corrida contra o tempo para se safar dos abusos de Slater, Vic, Cody e Tom e ajudar as amigas a perceberem o que tem ocorrido na viagem.

Zöe esteve em mais de quarenta produções como atriz e é conhecida pelas séries Big Little Lies (HBO) e Alta Fidelidade (Hulu, 2020). Seu último papel de destaque foi no filme ''The Batman'' (Matt Reeves, 2022), como a mulher Gato, Selina Kyle. É responsável pelo roteiro, que começou a escrever em 2017, ao lado de E.T. Feigenbaum, seu parceiro também na escrita de alguns dos episódios da adaptação para tevê do livro de Nicky Hornby - a série Alta Fidelidade acabou ganhando um novo recorte, pois seu personagem principal não é mais um homem branco e sim uma mulher negra, esta vivida por Zoe. Em ''Blink Twice'', ou traduzindo para o bom português, ''Pisque Duas Vezes'', se constrói uma trama para que uma mulher negra tenha protagonismo e, desta vez, sem romantizar ou exatamente abordar relacionamentos românticos, mas tocando nos abusos e na sexualização dos seus corpos ou ainda de mulheres latinas e brancas. 

O longa tem produção da renomada Metro-Goldwyn-Mayer (MGM), além de Bruce Cohen Productions, Free Association, e Redrum. Zöe Kravitz e o noivo o ator Channing Tatum também são produtores aqui. A distribuição do filme é da Warner Bros Pictures Brasil.

Trailer


Ficha Técnica
Título Original e Ano: Blink Twice, 2024. Direção: Zöe Kravitz. Roteiro: Zöe Kravitz e E.T. Feigenbaum. Elenco: Naomie Akie, Channing Tatum, Adria Arjona, Alia Shawkat, Christian Slater, Simon Rex, Haley Joel Osment, Liz Caribel, Levon Hawke, Geena Davis, Cris Costa. Gênero: Thriller, Suspense psicológico. Nacionalidade: México, EUA. Trilha Sonora Original:  Chanda Dancy. Fotografia: Adam Newport-Berra. Edição: Kathryn J. Schubert. Design de Produção: Roberto Bonelli. Direção de Arte: Derek A. Hecker Diaz. Figurino: Kiersten Hargroder. Empresas Produtoras: Bruce Cohen Productions, Free Association, Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) e Redrum. Distribuição: Universal Pictures Brasil. Duração: 01h42min. 
Frida demonstra interesse em Slater desde o inicio e somente com as revelações dos conflitos o espectador entenderá o porquê. Quando o bonitão coloca os olhos nela e não tira mais, ela fica maravilhada e até fala para a amiga Jess ''ele me percebeu! eu! uma pessoa invisível!''. O encanto, o charme e toda a sedução que Slater aplica na moça é extremamente convincente e seu cavalheirismo e boas intenções, a principio, são tidos como atitudes de um ''príncipe encantado e muito sexy'' e algo que esteja no subconsciente de Frida, o desejo de ter um relacionamento, ainda mais com alguém que a tire de sua vida de ''classe trabalhadora''. No grupo de mulheres, percebe-se que Sarah, de todas ali, é a que menos ''vai com a cara'' de Frida, já que ela queria estar no lugar desta última e não saindo com Cody, o super chef de Slater. As outras meninas parecem também gostar dos parceiros e não notar nada de diferente na ''viagem para uma ilha isolada''. O terapeuta do milionário, Rich (Kyle MacLachlan), aparece volta e meia para falar com Slater, pois é dito que este está em ''recuperação'' e também põe fagulhas na cabeça do espectador do que seria ''esse tratamento'' na realidade.

O filme vai entoando o suspense com a chegada do grupo a ilha e definindo um tom de estranheza quando funcionários do lugar expressam com sorriso simpatia e com o olhar a mensagem de ''perigo''. A assistente pessoal, e quase babá, de Slater, Stacy, é vista colocando cadeiras como ele quer, o lembrando de compromissos e sempre parece estar inerte para a situação, o que vem a calhar, já que ela segue ordens. Seu momento de destaque virá exatamente para mostrar isto, inclusive. Bichos soltos pelo casarão, como cobras, ou o take de uma planta vermelha específica, serão o alicerce para descobertas e sustentarão e muito as ideias narrativas da trama quando responderem o porquê diabos ninguém lembra ou lembra das situações. 

A cereja do bolo é a sororidade que se assiste em tela quando as mulheres entendem que "ou é união ou o fim de uma por uma". Isto porquê a libertação dos traumas vividos acaba revelando que nenhuma delas tinha noção do que acontecia e o choque é tamanho que só mesmo usando táticas que Sarah aprendeu em um reality show de sobrevivência para sair viva dali. 

                         Créditos de Imagens: TM & © 2024 Warner Bros. Entertainment Inc. All rights reserved.
A produção foi rodada em Yucatán e Quintana Roo, no México, em junho de 2023.


O destaque performático do filme é todo de Naomie Ackie em parceria com Adria Arjona, Channing Tatum e Alia Shawkat. Os atores renomados que aparecem tem forte presença, mas as protagonistas conseguem segurar o filme e empolgar a platéia a desvendar o mistério para que vidas de mulheres sejam salvas. A inglesa Naomie Ackie participou de inúmeras séries (Small Axe e Master of None) e viveu recentemente Whitney Houston em um filme biográfico. Aqui é uma mulher negra que entende de sobrevivência e não deixa barato todo o mal sofrido. Seu final é apoteótico, diria. Adria Arjona esteve no maravilhoso ''Assassino Por Acaso'', com o astro do momento Glen Powell, e arrasou. É uma das forças motivadoras da película e sua virada de chave é o passo inicial para a sustentação do poder feminino. Alia Shawkat, sempre é vista em papéis de amiga nas produções e em filmes independentes, aqui ganha força para continuar a aparecer em películas maiores. Channing Tatum tem investido em uma carreira impressionante e mais uma vez surpreende pela escolha do papel. Atrelado quase sempre a mocinhos, aqui joga com o oposto e se sai fenomenalmente bem. 

Zöe Kravitz aparece na indústria meio a uma alavancada de novas diretoras, novas histórias, novas personagens e todas fazendo sentido por estarem exibindo na tela diversidade, além de, finalmente trazerem mulheres sendo escritas por mulheres, o que era raro na indústria norte-americana e mundial. Seu primeiro filme é requintado, jovial, colorido, multifacetado e que nos motiva a imaginar o que mais ela nos dará no futuro por ter produzido um trabalho tão magnânimo já em sua estreia. Cria de uma família de artistas, afinal, é filha do cantor Lenny Kravitz com a atriz Lisa Bonet, teve como padrasto Jason Momoa, e sua madrinha é a atriz Marisa Tomei, as veias artísticas cresceram naturalmente e é uma ''nepobaby'' cool e sem muitas amarras no estrelato por sempre ter lidado com ele de forma de berço. Assim, seu talento chega por igual ao sobrenome que carrega.

A trilha musical vem carregada a James Brown em diversos momentos, que inicia e finaliza os créditos. 

''Pisque Duas Vezes'' se estou em perigo! A brincadeira é real, mas não, caro espectador, você está em ótimas mãos. E se sentir alguma referência a ''Corra!'', de Jordan Peele (2017), estará no caminho certo mesmo.

Avaliação: Quatro Venenos de Cobra Poderosíssimos (4/5).

EM EXIBIÇÃO NOS CINEMAS

A Viúva Clicquot, de Thomas Napper

 
Barbe-Nicole Posardin era filha de um comerciante de indústrias têxtil e político. Nascida em 16 de dezembro de 1777, na cidade de Reims, no nordeste da França, a mulher se casou com François Clicquot aos 21 anos. Do casamento nasceu a pequena Clementine, única filha do casal. François era responsável por bancos, comércio de Lã e também vinhedos que produziam bebidas. Assim, com sua morte, ainda jovem, deixou tudo no controle da esposa, aos 27 anos, e esta se tornou uma grande empresária internacional quando construiu um império de Champanhe levada por muita determinação e lutando contra uma sociedade inteiramente machista e controladora. A jornada da ''Veuve Clicquot'', ou em português, Viúva Clicquot, foi estudada pela historiadora Tilar J. Mazzeo e publicada no livro de 2008 ''A Viúva Clicquot: A História de Um Império de Champanhe e da Mulher Que O Construiu'' - a Editora Rocco comprou os direitos da obra da Harper Collins, traduziu e lançou no Brasil em 2009.

Em 2019, Madame Posardin ganhou um musical sobre sua vida e em 2023 um filme, baseado na publicação de Mazzeo, teve sua estreia no Festival de Toronto. A atriz Haley Bannett (A Garota no Trem e Cyrano) interpreta o recorte que o longa apresenta, o momento da morte do marido e a persistência da mulher em continuar a produção de vinhos e de champanhe, uma novidade que iria agradar muito a sociedade europeia e o mundo inteiro. O ator indie Tom Sturridge (Sandman, Netflix) vive o perturbado François Clicquot, Sam Riley (Malévola e Control) interpreta o vendedor das bebidas Louis Bohne e o sogro de Barb, Philippe é vivido por Ben Miles.  A produção é estado-unidense e falada em inglês. 

Com direção de Thomas Napper (A Roda do Tempo e Jawbone), produção de Bannet e do renomado diretor Joe Wright (Orgulho e Preconceito), A Viúva Clicquot chega aos cinemas brasileiros com distribuição da Paris Filmes.

Trailer


Ficha Técnica

Título Original e Ano: Widow Clicquot, 2023. Direção: Thomas Napper. Roteiro: Erin Dignam, com argumetos de Christopher  Monger e Erin Dignam - inspirado pelo livro ''   ''' de Tilar J. Mazzeo. Elenco: Haley Bennett, Tom Sturridge, Natasha O'Keeffe, Cecily Cleeve, Ben Miles, Paul Rhys, Ian Conningham, Christopher Villiers, Cara Seymour, Phoebe Nichols, Sam Riley. Gênero: Drama, época, biografia. Nacionalidade: Estados  Unidos da América. Trilha Sonora Original: Bryce Dressner. Fotografia: Caroline Champetier. Edição: Richard Marizy. Direção de Arte: Sthéphanie Sartorious. Figurino: Marie Frémont. Empresa Produtora: Fourth & Twenty Eight Films em associação com WME Independent. Distribuição: Paris Filmes. Duração: 01h30min.  
Quando a tela se abre François Clicquot está apresentando os vinhedos para a amada, Barbe.  O espectador assistirá então os dois divagarem sobre poesia, sobre amor, rolarem na terra, demonstrarem afeto, encontrarem o amigo e vendedor Luis Bohne e também viverem dias melancólicos, talvez por conta da instabilidade emocional do rapaz. De supetão, entra na tela a imagem de Barbe, a pequena Clementine, o sogro Philippe e diversas pessoas reunidas em um funeral. Não demora e é revelado que François faleceu. No entanto, a narrativa joga na tela a construção dos poucos anos que o casal vive junto, evidenciando ainda uma Barbe grávida e François conversando com a filha. 

Com a morte do marido, Barbe se vê tendo que lutar contra o poder controlador dos homens e precisa ser afirmativa que François a deixou tomando conta dos vinhedos, pois saberia que ela não venderia e consegue convencer o sogro de não vender o trabalho do filho, por enquanto. Retorna-se a cenas de como a moça apaixonada ajudava a cuidar dos campos e até diários para escrever suas descobertas ganha. Tem-se a finalização da história dos dois em tela quando a própria mulher encontra François morto em uma banheira (tanto nos dados históricos quanto no filme entende-se que por suicídio, mas na época também tentou-se abafar a causa da morte).

Luis Bohne se torna um aliado fiel de Barbe para sair vendendo as produções da moça, em especial o Champanhe. Algumas tentativas falham e todo o dinheiro que o sogro a havia emprestado acaba se perdendo, mas ela continua as produções e mesmo sem ter como pagar os trabalhadores, põe em risco sua reputação e mantém a promessa de que todos irão receber. A filha pequena acaba indo morar com os pais de Barbe (não se fala no filme, mas o pai da moça se tornou Prefeito de Reims pelas mãos de Napoleão). No período, as guerras Napoleônicas estavam a todo vapor, mas chegam ao fim, e o grupo liderado por Barbe consegue chegar a caminhos em outros cantos da Europa e assim vender o Champanhe. Assim, quando finalmente as vendas degringolam, ela tem a chance de recompensar a todos. Com Bohne, que sorrateiramente sempre evidenciou ter uma queda pela mulher, acaba tendo um caso e tudo vai bem até que a sociedade local, motivada por ambição em comprar os vinhedos e retirá-la da administração do local, pede a justiça uma audiência. É neste momento que até o tesoureiro Edouard (Anson Boon) vai a corte para defender a luta da viúva pela empresa do marido. O ato final do filme se torna então um julgamento em que Barbe verá sua vida e escolhas tendo destaque. 
            Crédito de Imagens: Paris Filmes / Divulgação / Fourth & Twenty Eight Films
A película foi rodada em diversos locais da França, em especial, Château de Béru, em Yonne.

Com uma duração curta, de uma hora e meia, A Viúva Clicquot tem tudo que o público dos dramas de época amam: empoderamento feminino, em uma época em que isto parecia ser impossível, tragédias, romances escondidos e uma jornada inspiradora. O elenco tem carinhas conhecidas das séries e filmes, Tom Sturridge e Sam Riley, por exemplo, abrilhantam o elenco. O diretor Thomas Napper, que está vindo de duas temporadas de ''A Roda do Tempo'' (Prime Video, 2021) esbanja talento por conta do seu tempo como assistente de direção, onde trabalhou em filmes como '"Orgulho e Preconceito'' (2005), ''Desejo e Reparação'' (2007) e ''Anna Karenina'' (2009), todos dirigidos por Joe Wright, aliás. Haley Bennett tem uma performance que cresce em tela, pois precisa demonstrar que Barbe não era especialista ou estudada, mas que voltou seu direcionamento para a empresa e focou nisto até conseguir seu objetivo. Então vemos uma menina doce em momentos íntimos com o marido e uma mulher forte e potente quando tem de lidar com a morte do mesmo e administrar os negócios. 

Ao inicio do filme se pergunta sobre posteridade e reconhecimento quando a própria Viúva diz: ''será que saberão que estivemos aqui?''. A jornada desta mulher instigante e tão empreendedora é a prova de que sim depois de quase um século o mundo inteiro saberá quem ela foi. E ao investigar ainda mais afundo, conhecerá também a neta Anne de Rochechouart de Mortemart, filha de Clementine, que se tornou artista, ativista política, envolvida em causas sociais e caridade. Como artista, foi escritora e escultora conhecida como ''Manuela''. Logo, a mulher não só realmente fundou um império, mas gerou uma semente inspiradora para as próximas gerações.

Avaliação: Três champanhes rose da melhor qualidade (3/5).

EM EXIBIÇÃO NOS CINEMAS

quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Os Inseparáveis, de Jérémie Degruson


A coprodução entre Bélgica, França e Espanha ''Os Inseparáveis'' chegou aos cinemas lá fora em dezembro de 2023. A animação passou por duas edições do renomado Annecy Film Festival, na França, e também foi exibida no Festival de Cinema de Shangai. Com direção de Jérémie Degruson (Bigfoot Family), o enredo tem inspiração no clássico de Miguel de Cervantes, ''Dom Quixote'', e apresenta uma trupe de bonecos que vivem a interpretar histórias em um teatrinho e ao fechar das cortinas tomam vida nos bastidores. Entre eles, está Don (voz de Hélio Ribeiro na versão dublada e de Eric Judor na original), o homem está cansado de performar o personagem do palhaço e queria, ao menos uma vez, viver aventuras de um herói, pois se sente um e acredita que pode ser multifacetado por conta de sua imaginação sem fim. A trupe não acredita muito no talento de Don, pois ali cada um já vive um papel predeterminado e estereotipado. Ele decide então partir em busca de seu próprio caminho meio a uma Nova York Caótica. No central parque, encontra um urso de pelúcia chamado DJ Doggy Dog (voz de Beto Macedo na versão dublada e Jean-Pascal Zadi na original) que tem uma caixinha de música e ao apertar a mão deste, ele solta canções predeterminadas. Don faz do ursinho com roupas de hip-hop seu parceiro de aventuras e saem salvando patinhos que estão no alto dos lugares ou filhotes de guaxinins que caem no rio e não sabem como retornar para casa.  
 

Roteirizado por Joel Cohen e Alec Sokolow (responsáveis por Toy Story) e adaptado do texto de Bob Barlen e Cal Brunker, a trama é curtinha, com quase uma hora e trinta, e muito colorida tendo ainda uma troca de estilos de animação dentro do próprio filme, afinal, Don se vê em histórias de aventura a todo o tempo. No Brasil a Paris Filmes distribui a película que chega para o público em época de retorno escolar, mas que mesmo assim, pode ser um bom investimento de entretenimento em família.

Trailer


Ficha Técnica

Título Original e Ano: The Inseparables, 2023. Direção: Jérémie Degruson. Roteiro:  Joel Cohen e Alec Sokolow - adaptação do texto de Bob Barlen e Cal Brunker inspirado no Livro de Miguel Cervantes ''Dom Quixote''. Vozes originais:  Eric Judor, Jean-Pascal Zadi, Ana Girardot, Chris Marques, Laurence Huby, Jean-François Lescurat, Bernard Bollet, Frédéric Philippe. Vozes brasileiras: Hélio Ribeiro, DJ Doggy Dog, Dee, Mônica Toniolo, Guilherme Conradi, Raquel Marinho, Ricardo Campos, Henrique Reis, Alexander Vestri, Stela Sayuri, Bruno Casemiro, Enrico Espada, Suzete Piloto, Mana Muniz, Marina Harund, Renato Marcio, Thiago Cordova, Claudio Victoria. Placas: Luiz Mota. Direção de Dublagem: Renato Marcio. Direção Musical: Nil Bernardes. Gênero: Animação, aventura, adaptação. Nacionalidade: Bélgica, França, Espanha. Trilha Sonora Original: Puggy. Animadores: Gerrit Behnken, Louis Besse, Evan Coolen, Lara Freise, Claudia Kleinheinz, valentin Legrand, Peter Oedekoven. Empresas Produtoras: A Contracorriente Films, Beside Productions, Octopolis nWave Pictures. Distribuição: Paris Filmes. Duração: 01h29min.
Para o público infantil, a produção traz mensagens incríveis como o da persistência e 'de que é sempre bom acreditar no seu potencial, pois ter uma boa intenção e ajudar o próximo é gratificante.  Don, que vem com a alma ilustrativa de Don Quixote, o famoso personagem de Miguel Cervantes, enfrenta cata-ventos gigantes para salvar patinhos ou ainda pula em um rio a todo vapor para salvar filhotinhos de guaxinins e vai parar no esgoto com eles. DJ Doggy Dog seria um ''sancho pança', fiel escudeiro de Dom Quixote, com uma vibe modernosa. Vem com um estilo hip-hop e cantante e alegra por tentar se libertar de suas limitações, deixar de só falar frases pré-gravadas. É bom no rap e sai fazendo alguns pelas cenas a incentivo do novo amigo. A aventura entrega emoção por colocar a arte a favor desses personagens, principalmente, por que são bonecos valiosos e uma dupla de crianças malvadas os tenta roubar e vender. Uma amiga de Don que não acreditou no potencial do aventureiro acaba se arrependendo e fica feliz quando ele aparece para salvar o dia e trazer todos de volta já que quem poderia o fazer, não o fez, mas aquele maluco sonhador sim teve a coragem de bancar a responsabilidade de ser herói de verdade.

    Créditos de Imagens: Paris Filmes, Divulgação -  A Contracorriente Films, Beside Productions, Octopolis nWave Pictures
O filme já alcançou pelo mundo bilheteria de 2.403.551 doláres

A produção dá uma ótima trilha temática a Don e coloca o clássico da banda Pixies ''Where's My Mind'' para entoar algumas vezes durante o segundo e terceiro ato. A música reflete sobre o ser e não ser, sobre o que vemos e não vemos, algum que encaixa perfeitamente com o arco de Don que até cai em si e sente que não é um herói de verdade, que tudo que imagina não é real, mas que no fim, sua boa intenção é o que vale.

Passeando por um ultra mega maravilhosa clássico da literatura como base da história e incrementando com elementos contemporâneos, a animação é uma ótima pedida pela inventividade cultural que apresenta. 

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