quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Deixe-Me, de Maxime Rappaz | Um Lançamento Imovision

 
“Tu aceitarias ter uma conversa íntima por telefone? Do tipo ‘gostaria que tu estivesses aqui…’?”

Proveniente do mundo da moda, o diretor suíço Maxime Rappaz conduz uma trama deveras sensível em seu primeiro longa-metragem: a ótima Jeanne Balibar tem uma interpretação sobremaneira delicada, como a protagonista Claudine, uma costureira que divide os seus dias entre o cuidado intensivo de seu filho Baptiste (Pierre-Antoine Dubey), que é portador de deficiência, e flertes com desconhecidos, num hotel montanhês, onde aproveita os contatos sexuais para obter histórias citadinas, que são convertidas em cartas imaginárias de um pai ausente, para Baptiste…

Bastante despojado na exposição das cenas de nudez, por parte de atores mais velhos, este filme constrói o dilema emocional da protagonista de um jeito cadenciado: tendo sido bem-sucedida em evitar que suas conquistas eróticas evitassem querer saber algo sobre ela, Claudine, de repente, vê-se diante de um possível interesse romântico, que chega a convidá-la a viajar consigo. Michael (Thomas Sarbacher) é um engenheiro eletricista alemão que faz com que, pela primeira vez em muito tempo, Claudine começasse a pensar em sua própria vida, no que tange a um recomeço comportamental, de caráter íntimo. Será que ela consegue?

Obcecado pela princesa Diana de Gales [1961-1997] e pelo cantor irlandês Johnny Logan, duas vezes vencedor do concurso Eurovision, Baptiste também dedica-se a estudos de piano, ofertados pela vizinha de Claudine, Chantal (Véronique Mermoud). Esta parece não enxergar com bons olhos as saidelas de Claudine e, em algum momento, faz insinuações a Baptiste, sobre as cartas que ele recebe de seu suposto pai. Tudo isso contribui para que Claudine cogite a possibilidade de emancipar-se familiarmente, de começar a aproveitar a inusitada segurança relacional ofertada por Michael.

Trailer 

Ficha Técnica
Título original e ano: Laissez-moi, 2023. Direção: Maxime Rappaz. Roteiro: Maxime Rappaz, Florence Seyvos, Marion Vernoux. Elenco: Jeanne Balibar, Thomas Sarbacher, Pierre-Antoine Dubey, Véronique Mermoud. Gênero: Drama. Nacionalidade: Suiça, França e Bélgica. Direção de fotografia: Benoît Dervaux. Direção de arte: Rekha Musale, Ivan Niclass. Música: Antoine Bodson. Montagem: Caroline Detournay. Produção: Gabriela Bussman, Yan Decoppet. Empresa Produtoras: GoldenEggProduction. Distribuição: Imovision. Tempo: 92 min. Classificação: 16 anos


Situado tramaticamente no final da década de 1990, os personagens deste filme folheiam revistas, recebem e lêem cartas pelo correio e ainda utilizam o videocassete. Estes atos hoje nostálgicos ajudam a balizar o ritmo lento – mas sempre agradável – do enredo, a cargo do próprio diretor e mais dois roteiristas. Os diálogos são muito simpáticos na maneira igualmente sincera e inconclusa com que se desenvolvem: Claudine não mente ao falar sobre o seu passado, mas, mesmo assim, sabemos pouco sobre o que levou o pai de seu filho a desaparecer. E ela não sente qualquer vergonha da condição debilitada de Baptiste, de modo que ele a faz companhia em seu ateliê, volta e meia sendo convocado para dar pareceres sobre os vestidos que ela costura. 

A fotografia do filme aproveita de maneira fascinante a beleza da região turística em que se passa a trama: Claudine geralmente passeia por lugares ermos, até subornar o funcionário Nathan (Adrien Savigny), que lhe conta quais clientes viajarão no dia seguinte, a fim de que ela possa se aproximar deles sem o receio de que eles queiram um contato mais demorado. Parece um tanto difícil se identificar com Claudine, no início, mas logo compreendemos as suas práticas conscienciosas e solidarizamo-nos em relação à sua busca por alguma felicidade. Quem se atreveria a julgá-la, por ao menos tentar?


Crédito de Imagens: Divulgação / Imovision / GoldenEggProduction
A produção foi ganhadora do prêmio ''Film in Focus'' no Zurich Film Festival e também levou para casa ''Escolha da Audiência'' na categoria de ''Vanguarda'' no Vancouver Film Festival. Ambos os prêmios foram recebidos em 2023.

Muitíssimo bem interpretado, este filme demonstra uma segurança benfazeja do diretor quanto aos seus intentos dramáticos: as cenas em que Claudine dá banho em seu filho são bastante delicadas, sobretudo quando ele reage de maneira hostil aos seus cuidados. O momento em que ela flagra-se cantarolando uma canção de amor em francês é também muito significativa, acerca daquilo que Claudine passa a experimentar depois que conhece Michael. Ela chega até a ler um artigo científico que ele escreve três vezes! 

No desfecho, a vida de Claudine é confrontada com algumas modificações: a rotina pitoresca que, até então, legou-lhe algum conforto, para o bem e para o mal, ao longo de anos, é substituída por uma estrada em aberto, em que ela precisará repensar o que fará, dali por diante. Isso, por conseguinte, afeta ternamente o espectador, no que diz respeito ao questionamento dos gestos automáticos do dia a dia, à insegurança que se instaura quando precisamos tomar decisões importantes. Um filme simples, mas assaz gracioso naquilo que propõe e expõe. Muito bom! 

Avaliação: Quatro encontros amorosos (4/5)

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