quinta-feira, 17 de outubro de 2024

Sinfonia da Sobrevivência, de Michel Coeli | Mostra SP


                                                                                Competição Novos Diretores 

As guerras que o Brasil anualmente enfrenta não afeta somente os brasileiros, mas o mundo inteiro no que diz respeito a vivência humana não dando a mínima para o crescente descaso com o meio ambiente. Mudam-se os governos e as forças não se redirecionam para preparar seus estados e cidades para enfrentar períodos sem chuva e de muita seca (ou o contrário). Além da ocorrência natural, também não se criam leis mais severas e com punições práticas para aqueles que causam incêndios e queimadas. As ações danosas interagem diretamente com uma fauna e uma flora indefesas e que são afetadas por muita covardia. Michel Coeli, diretor de séries e produções para a tevê, fotografo e roteirista, se embrenhou no pantanal para acompanhar equipes do Ibama, tropa de Bombeiros, civis e voluntários para apaziguar as queimadas anuais decorridas no Pantanal mato-grossense, ainda mesmo quando a COVID-19 estava contaminando a população. Da iniciativa nasceu seu primeiro longa-metragem, ''Sinfonia da Sobrevivência'', um documentário honesto e com uma belíssima edição de imagens, uma pena que não trazendo somente finais felizes e otimistas.

O recorte audiovisual de uma hora e dez minutos traz a tona os animais afetados por queimadas e uma seca violenta. Aves diversas, jacarés, antas, onças e muitos outros bichos sofrendo com o alastramento do fogo e iniciativas lideradas por órgãos federais e estaduais como o Ibama ou o Corpo de Bombeiros sendo as únicas com algum real poder de auxilio - e mesmo assim ainda enfrentando inúmeros desafios, como o envio de caminhões pipas, aviões, mais pessoal habilitado ou até mesmo servidores dedicados. Rodado em plano subjetivo e com uma câmera muito crítica para os acontecimentos, o filme é claro em trazer estatísticas, apontar culpados e enaltecer seus poucos heróis. O ativismo é forte, analítico e ao mesmo tempo que se concentra em detalhar as situações presenciadas também não esquece de quem está no palanque com um discurso hipócrita e religioso manipulando a nação para uma possível vitória nas eleições de 2022.

Com três sessões previstas na 48ª Mostra SP, uma delas no primeiro dia de festival, o filme serve como um grande documento de denúncia bem como um relato imprescindível de que o movimento de forças humanas pode ser útil aos que necessitam, mas é sempre preciso que uma estrutura ainda maior se instale nessas ocasiões.

                                                          Crédito de Imagens: Michel Coeli / Base 1 Filmes

Ficha Técnica

Título Original e Ano: Sinfonia da Sobrevivência, 2024. Direção: Michel Coeli. Roteiro: Gabriela Rabaldo, Michel Coeli e Renato Vallone. Com: Paulo Barroso, Luciana Cataldi, Carol Machado, Thiago Luiz, Leonardo Patrial, Thiago Sorriso, Lenon Lemos, Rogério Leonel, Arthur Tibério, Sergio Freitas, Romeu Benedicto, Roberto Cabral, Thago Luczinski. Gênero: Documentário. Nacionalidade: Brasil. Trilha Sonora Original: Fred Ferreira. Fotografia e câmera: Michel Coeli. Câmera adicional: Cesar Leite. Montagem: Michel Coeli. Colaboração de montagem: Renato Vallone. Design de som: Fernando Aranha. Mixagem: Bernardo Adeodato. Edição de efeitos sonoros: Jonas Louzada. Produção associada: Costa Blanca Films, Documenta Pantanal e Culture of Resistence. Produção executiva: Gabriela Rabaldo e Michel Coeli. Produção: Base 1 Filmes. Duração: 72 min.

Quando o filme se inicia, a câmera segue os profissionais pela mata. Ali buscam água e enchem o espectador com conhecimentos sobre o solo e a vegetação. Tão pouco estão tentando fazer algo, mas também precisam ficar atentos aos perigos da selva, jacarés rondam todas as partes. Um dos homens quase sofre um ataque meio a ação. Não só por conta da fumaça forte, mas por conta da contaminação de Covid19, todos andando sempre de máscara e sendo notificados que o não uso prejudica os trabalhos. Não demora e conhecemos Coronel Barroso, um valente militar que dá os comandos a turma dos grupos que estão dedicados a levar água aos animais. Agitado, altamente interessado em resolver a situação e muito dedicado, o bravo combatente mostra a insatisfação com atrasos de bombeiros e o desleixo com o trabalho sério que estão ali fazendo.

Grupos do Ibama são vistos andando para todos os lados para procurar os animais feridos. Muitos deles já estão mortos, mas alguns como aves e antas são levados para sala de cirurgia ou tem as patas tratadas devido a estarem queimadas. São imagens de cortar o coração, mas muito necessárias para o entendimento do horror que é saber que um ser humano qualquer possa incendiar as matas e não se dar conta das vidas que estarão sendo perdidas. Onças são encontradas presas e as equipes de veterinários e tratadores conseguem dar os cuidados necessários para o retorno dos animais. O filme retrata muito bem que o trabalho em equipe naquele momento era preciso e não importava o horário, as equipes estavam na mata buscando auxiliar os mais diversos bichos.

Michel Coeli consegue trazer cenas de desespero que atordoam muito quando se trata de acompanhar as equipes apagando os incêndios. Em muitos momentos, as cenas sofrem uma edição rápida e que perpetuam a idéia de como os animais devem se sentir meio a estarem presos no fogo.  Não há em si fala direta a câmera, mas sim um acompanhamento direto das missões de resgate e a atuação de captar as imagens é de muita coragem. O filme termina com mais dados e relatos que podem causar indignação, no entanto, a porrada que o espectador sofre é a pílula instantânea que ele terá que tomar para acordar de um conforto que o aliena. Afinal, todos deveriam estar debatendo a temática e propondo soluções práticas para punir os culpados de tanta crueldade.

Vinheta da Mostra 


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Horários de exibição

17/10

21:10

RESERVA CULTURAL - SALA 2

21/10

13:45

CINESYSTEM FREI CANECA 5

25/10

15:15

CINESYSTEM FREI CANECA 1

Para adquirir ingressos do filme, clique aqui.
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Betânia, de Marcelo Botta | 48ª Mostra SP

 
MOSTRA BRASIL                                                                                                          
                 Exibido nos Festivais de Berlin, Guadalajara, Rio e no Malaysia Golden Global Awards

“Aquilo piscando, lá na cozinha, é a internet?”


Nos créditos finais deste filme, há um letreiro entusiástico: “viva o Bumba Meu Boi do Maranhão!”. É a culminância de um percurso sobremaneira errático, mas de incontida paixão pela Unidade da Federação homenageada pelo diretor estreante em longas-metragens Marcelo Botta. Goste-se ou não de “Betânia” (2024), é mister admitir que a experiência de assistir a esta obra é sumamente peculiar, no sentido de que montagem e roteiro obedecem a uma cadência ímpar, de valorização dos elementos culturais dos lugares em que a trama foi filmada…

O título do filme possui dupla significação: é tanto o nome de um povoado no município de Santo Amaro do Maranhão quanto de uma sexagenária que realiza partos desde que tinha doze anos de idade. Interpretada por Diana Mattos, Betânia lamenta o falecimento de seu marido, “levado pelo sal”, como ela costuma dizer. Juntos, tiveram quatro filhos, sendo que a mais nova também é falecida. A despeito do que sofreu, Betânia valoriza a proximidade com seus entes familiares.

Construído através de vinhetas, que se organizam como um filme-painel, “Betânia” conta diversas estórias paralelas, em torno desta matriarca que, a princípio, relutava em morar na localidade homônima. Irritada pela proliferação de comidas industrializadas nos supermercados da região, Betânia tem a intenção de, nalgum momento, erigir o seu próprio restaurante. A mudança para a cidade de Santo Amaro do Maranhão será definitiva para a consecução de seus intentos.

Crédito de Imagens: © Salvatore Filmes
''Betânia'' recebeu 11 indicações a prêmios nos Festivais por quais passou (Berlim e Malaysia Golden Awards). No Festival do Rio, recebeu ''Menção Honrosa'' para a perfomance de Diana Mattos.


Uma das filhas de Betânia, Irineusa (Michelle Cabral) converteu-se radicalmente a uma igreja evangélica recém-chegada e, por conta disso, tornou-se bastante preconceituosa e proibitiva. Não permite que a sua filha Vitória (Nádia D’Cássia), que é lésbica e sonha em ser DJ de ‘reggae’, vista-se da maneira que quer e use o batom vermelho que ela tanto gosta. Mas Betânia, do jeito dela, também fará o possível para garantir o bem-estar de sua neta, torcendo para que ela consiga se destacar num ambiente que é extremamente machista, conforme atesta uma artista transexual (interpretada por Enme Paixão), de quem Vitória é fã. E é bastante interessante o modo como a trilha musical desta obra combina cantigas regionais com versões remixadas de canções como “Voyage, Voyage”, da francesa Desireless; “Chandelier”, de Sia; e “Summertime Sadness”, de Lana Del Rey, que é executada num instante no mínimo inusitado!

Enquanto senhoras idosas comentam a rudeza das características climáticas dos Lençóis Maranhenses, na cidade de Barreirinhas – em que as dunas mudam o curso dos rios e “onde há água durante a época chuvosa, crescem lagos floridos, durante a época seca” –, o genro de Betânia, Tonhão (Caçula Rodrigues), esforça-se para aprender inglês e francês e, assim consolidar as suas atividades enquanto guia turístico. Porém, num determinado passeio, acompanhado pelo casal estrangeiro Bernard (Tim Vidal) e Sofie (Anouk Mulard), ele perder-se-á em meio às dunas, carecendo da intervenção resgatadora de Antônio Filho (Ulysses Azevedo), neto querido de Betânia, e dos companheiros de profissão de seu pai.

Crédito de Imagens: © Salvatore Filmes


Ficha Técnica 


Título Original e Ano: Betânia, 2024. Direção: Marcelo Botta. Elenco: Diana Mattos, Tião Carvalho, Ulysses Azevedo, Nádia d'Cássia, Caçula Rodrigues, Michelle Cabral, Rosa Ewerton Jara, Vitão Santiago, Anouk Mulard, Tim Vidal e Caiçara Vibration. Gênero: Drama. Nacionalidade: Brasil. Fotografia: Bruno Graziano. Arte: Mariana Cristal Hui. Montagem: Marcio Hashimoto. Som: Raoni Gruber, Caio Guérin, Armando Torres Jr e Martin Grignaschi. Trilha sonora: Marcelo Botta, Tião Carvalho, Boi da Betânia, Edivaldo Marquita, Misael Pereira, A Barca, Henrique Menezes, Black Roots, entre outros. Produção: Salvatore Filmes. Produção: Gabriel Di Giacomo, Marcelo Botta. Coprodução: Canal Brasil. Produção associada: Marcio Hashimoto, Marcelo Campaner e Ventre Studio. Produção: Gabriel Di Giacomo, Marcelo Botta. Produção executiva: Maria Isabel Abduch, Luciana Coelho. Distribuição: O2 Play. Duração: 121min. 

Outros segmentos se imiscuem em meio às estórias supracitadas, como as frustrações de pescadores que lidam com a pletora de lixo internacional nas zonas reservadas ao seu ofício ou a própria saga de Antônio Filho para encontrar uma escola onde possa concluir o Ensino Fundamental. Apesar de ultrapassar as duas horas de duração, o ritmo deste filme é quase videoclipesco, denunciando as experiências prévias do realizador com as narrativas televisivas (ele teve uma passagem marcante pela emissora MTV, por exemplo). Mas a edição de Márcio Hashimoto merece um elogio pela audácia com que conjuga tantos nucléolos de convivência, todos em torno da protagonista Betânia, que declara que “a sua internet é a memória”…

Irregular em mais de um aspecto, “Betânia” consegue converter este apanágio numa demonstração de vigor, sendo mui exitoso na valorização das belezas regionais (para a qual, a fotografia de Bruno Graziano é assertiva) e no respeito pelas pessoas envolvidas neste projeto. As filmagens aconteceram na primeira metade do ano de 2022 e, como tal, representaram um esforço inaudito na consolidação da filmografia local, visto que Maranhão ainda é um Estado com pouca tradição em longas-metragens cinematográficos. Através de elipses temporais e ‘flashbacks’ recorrentes, esta produção abarca convenções de mais de um gênero fílmico: é cômico, por vezes; dramático, em sua maior parte; possui uma ou outra seqüência de aventura; e, em seu conjunto, é uma declaração de amor pelos habitantes maranhenses. Fazemos questão de aplaudi-lo, portanto!

Vinheta da Mostra 


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Horários de exibição

17/10

19:30

CINEMATECA ESPAÇO PETROBRÁS

24/10

15:00

CINESYSTEM FREI CANECA 1

Para adquirir ingressos do filme, clique aqui.
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quarta-feira, 16 de outubro de 2024

Sorria 2, de Parker Finn


Depois de uma agradável surpresa em 2022, onde Parker Finn estreou na direção e roteiro de seu primeiro longa (Smile/Sorria), a continuação segue o tom de seu antecessor, trazendo consigo um amadurecimento estético, mas repetindo alguns deslizes no percurso. Em uma cena inicial impactante, Sorria 2 prioriza fechar as arestas do primeiro, com uma espécie de epílogo, antes de começar sua história de verdade. É fato que seu início é digno de elogios, sendo capaz de cativar sua audiência e setar a expectativa quanto a narrativa de seu universo: cruel, gráfico e intenso.

Se no primeiro filme acompanhamos a psiquiatra Rose (Sosie Bacon) perseguida pela entidade maligna, e lidando com seus traumas anteriores, dessa vez o protagonismo é da estrela de música pop Skye Riley (Naomi Scott), que tem sua mente perturbada pela criatura sobrenatural sorridente que assume a forma de pessoas a sua volta. Estruturalmente similar, é possível traçar paralelos com os conflitos do anterior: As relações de médica/paciente dão lugar aos bastidores da carreira de cantora. Os problemas de relacionamento se transformam em uma desconexão familiar e de isolamento social, e o que antes era associado ao trauma da infância voltando para assombrar a protagonista, agora se traduz em um medo do julgamento midiático e seu envolvimento em um acidente automobilístico trágico de meses atrás.

Seguir a cartilha da sequência, que tenta repetir o sucesso maximizando a base do primeiro filme, não é necessariamente uma decisão ruim, no entanto, deixa um gosto amargo para o espectador que espera por uma quebra ou desenvolvimento de novas ideias. Veja bem, isso não quer dizer que o filme não traga novos elementos e que não tenha substância nas suas temáticas. Inclusive, as novas propostas funcionam até certo ponto, e propõem críticas e comentários interessantes sobre o cenário estabelecido, porém, a sensação que fica sobre o material final, é da falta de polimento no roteiro para equilibrar os delírios e o real. Sorria 2 aposta muito na capacidade de sua protagonista e Naomi Scott faz um ótimo trabalho. Ângulos fechados, closes no seu rosto e as cenas introspectivas da personagem funcionam muito bem. Vale ressaltar que a direção e a montagem são eficazes em dinamizar os planos, valorizar a tensão e intensificar os sustos. O trabalho de maquiagem é impressionante e pode chocar no uso da violência explícita e visualmente impactante de algumas cenas. O silêncio e o som ambiente são trunfos potencializados no cinema e que dificilmente terão mesmo efeito na sala de casa, apesar do uso instigante.

Crédito de Imagens: Courtesy of Paramount Pict - © 2024 PARAMOUNT PICTURES
Para a produção, uma trilha de músicas originais foi composta exclusivamente para Naomie Scott cantar. O ep conta com seis canções e está disponível em diversas plataformas. (escute aqui)

Apesar disso, o thriller psicológico e o terror com jumpscares brigam por espaço dentro da história, e muitas vezes um atrapalha o outro, enfraquecendo o equilíbrio entre o medo visual e o suspense emocional. Acompanhar Skye Riley surtando entre suas participações públicas e sua vida privada funciona, mas tende a ser redundante no segundo ato. Ao longo de duas horas de duração, a narrativa se estica para dar mais voltas que o necessário, buscando surpreender na reta final, todavia, perdida em meio aos delírios da própria protagonista. A trama abandona alguns arcos para sua conclusão e pode frustrar algumas expectativas, ainda que possua momentos competentes de terror.

Parker Finn definitivamente ganha a atenção e curiosidade do espectador aqui. O fato de ter mostrado evolução, se comparado ao longa de estreia, e ter demonstrado uma capacidade de instigar em cenas de suspense e gore, o credencia como um nome promissor para o gênero de terror nos próximos anos. Considerando seus acertos e deslizes, é possível dizer que Smile 2 integra a seleta lista de continuações que superam suas obras originais. Assim, deve agradar aos fãs do filme anterior, mas talvez não convença tão facilmente novos públicos. Se você se encaixa no primeiro caso, compre o ingresso, vá ao cinema e Sorria :)

Trailer

Ficha Técnica
Título Original e Ano: Smile 2, 2024. Direção e Roteiro: Parker Fin. Elenco: Naomie Scott, Kyle Gallner, Drew Barrymore, Rosemarie DeWitt, Ray Nicholson, Lukas Gage, Dylan Gelula, Peter Jacobson, Raúl Castillo, Miles Gutierrez-Riley, Daphne Zelle. Gênero: Terror. Nacionalidade: Estados Unidos da América. Trilha Sonora Original: Cristobal Tapia de Veer. Fotografia: Charlie Sarroff. Edição: Elliot Greenberg. Design de Produção: Lester Cohen. Figurino: Alexis Forte. Empresas Produtoras: Paramount Pictures, Paramount Players, Temple Hill Entertainment, Bad Feeling. Distribuição: Paramount Pictures Brasil. Duração: 02h07. Classificação 18 anos.

17 de Outubro nos Cinemas