quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Não Solte, de Alexandre Aja | Sessões Antecipadas


Não Solte!, que chega aos cinemas, em sessões antecipadas, esta quinta-feira (31/10), e, oficialmente no dia 07 de novembro em horários diversos, é mais um na seleta lista de filmes que ganhou tradução do título para o português com uma ordem, Não Olhe Para Cima (Adam Mckay, 2021), Não! Não Olhe! (Jordan Peele, 2022), Não Se Mexa (Brian Netto e Adam Schindler, 2024). O filme de Alexandre Aja possui uma ambientação muito envolvente, mas parece não conseguir decidir a história que deseja contar.

A eterna Tempestade, de X-Man, Halle Berry, interpreta uma mãe que tenta proteger seus dois filhos, Samuel e Nolan, do Mal. Eles moram numa casa no meio da mata, que é envolvida por uma corda sagrada que os protege, essa mesma corda é usada pelos personagens para realizarem expedições nas redondezas, a fim de procurarem comida.

O título do filme é entoado diversas vezes pela ''Momma'', personagem de Berry, aos seus filhos, interpretados por Anthony B. Jenkins e Percy Daggs IV, ela é a única que vê e ouve o Mal, o que acaba despertando, tanto no espectador, quanto nas crianças, um sentimento de desconfiança sobre a extensão da veracidade da história contada e da sanidade da personagem dela.

Trailer



Ficha Técnica
Título Original e Ano: Never Let Go, 2024. Direção: Alexandre Aja. Roteiro: KC Coughlin e Ryan Grassby. Elenco: Halle Berry, Anthony B. Jenkins, Percy Daggs IV, William Catlett, Kathryn Kirkpatrick, George Gracieuse, Matthew Kevin Anderson, Cadence Compton, Christin Park,  Stephanie Lavigne Mila Morgan, Adrien Morot. Gênero: Terror, Suspense. Nacionalidade: EUA, Canada e França. Trilha Sonora Original: Robin Coudert. Fotografia: Maxime Alexandre. Edição: Elliot Greenberg. Design de Produção: Jeremy Stanbridge. Maquiagem: Megan Harkness e Naomi Bakstad. Direção de Arte: Eli Best. Figurino: Carla Hetland. Empresas Produtoras: Lionsgate, 21 Laps Entertainment, France Films TV, HalleHolly, Canadian Film or Video Production Tax Credit. Distribuição: Paris Filmes. Duração: 01h41min.

A personagem conta a história da casa, da corda, do Mal, alerta sobre os perigos, a forma com que o Mal pode seduzir e enganar as crianças, como é preciso confiar e se envolver na corda, seja fisicamente ou no enlace da narrativa apresentada pela Mãe. Berry entrega uma atuação que, quando está em cena, é hipnotizante, a força dela é inegável, mesmo que o texto de Ryan Grassby e Kevin Coughlin não deem a ela um material sólido para trabalhar.

E é nesse jogo dúbio que o filme arma sua armadilha para si, ao alternar em diversos momentos as expectativas do espectador, o longa acaba embaralhando a história sem evoluir com ela. Esse sentimento acompanha boa parte do segundo ato de ''Não Solte'' e até o momento em que as crianças se veem tendo que lidar elas mesmas com a dúvida.

                                     Crédito de Imagens: Paris Filmes / Divulgação / Lion Gate 2024 Entertainment Inc
A produção iniciou seu circuito de estréias em setembro e deve chegar a Turquia somente em dezembro, sua última janela de apresentação nos cinemas

Quando a película foca nas crianças, nas suas diferenças e desconfianças sobre o que a Mãe vem contando, ele cresce vertiginosamente. Ambos os atores conseguem dar peso aos seus personagens, mesmo na limitação do roteiro, que parece ir decidindo sua próxima decisão na sorte. Há aqui um subtexto religioso bem presente, os valores cristãos, como família, a representação de laço familiar, a obediência, a crença, a prece para a casa e para a corda, permeiam a história o tempo todo. Há uma intenção de fazer comentários de falar sobre desobediência civil, de liberdade individual e coletiva, dos sacrifícios para um bem maior e de saúde mental ali, mas tudo fica somente na intenção.

A parte técnica da produção, com a bela fotografia de Maxime Alexandre (A Freira, 2018), o design de produção de Jeremy Stanbridge (Bons Meninos, 2019) e a direção de arte de Eli Best (O Projeto Adam, 2022), dão ao filme o peso que o roteiro gostaria de ter. Os detalhes da casa em que os personagens moram são divertidos de apreciar, assim como a maquiagem de Megan Harkness e Naomi Bakstad (O Extraordinário, 2017), que dá um tom gore ao filme em alguns momentos. A câmera de Alexandre Aja (Amaldiçoado, 2013) consegue mediar os sustos e a tensão de forma competente em quase todos os momentos do filme, o diretor está seguro numa zona de conforto o tempo todo, sem correr nenhum risco.

Ao final, restam boas atuações por parte dos protagonistas, uma ambientação bem estruturada e que causa certa tensão no espectador, mas que a história parece não acompanhar o ritmo da montagem de Elliot Greenberg (Sorria 2, 2024) e não dá o material suficiente para que as atuações deslanchem de vez. O encerramento da trama é frustrante, uma vez que há um aceno para uma continuação. Numa era em que tudo o que importa é o próximo produto a ser lançado e consumido, não seria esse novo título que ficaria de fora. Torçamos para que o próximo seja mais interessante.

Avaliação: Dois urubus e meio rosto deformado (2,5/5).

07 de Novembro nos Cinemas

Terrifier 3, de Damien Leone

 
O Natal chegou mais cedo esse ano. Antecipando a data-mor cristã para o mês do Halloween, o 3º longa da franquia Terrifier desembarca nos cinemas prometendo repetir (e se desafiando a superar) as doses cavalares de violência gráfica cometidas pelo palhaço-mímico-psicopata-demônio Art.

Com o auxílio de Victoria (Samantha Scaffidi), única sobrevivente do filme original, agora possuída por uma entidade maligna, Art, o Palhaço (David Howard Thornton), renasce... de forma desconfortavelmente literal. A dupla passa a espalhar o terror por onde passa, e a vida de ninguém que estiver em seu caminho será poupada. Paralelamente a isso, acompanhamos a sobrevivente Sienna (Lauren LaVera) tentando reconstruir sua vida após os acontecimentos de Terrifier 2. Recém-saída de uma clínica psiquiátrica, ela é recebida na casa de seus tios e tem dificuldades em lidar com o sentimento de culpa pelas mortes de pessoas queridas no episódio traumático do qual saiu com vida. Seu irmão Jonathan (Elliott Fullam) parece estar encarando melhor a situação: agora na faculdade, tenta levar uma rotina normal para fugir das lembranças aterrorizantes que o marcaram para sempre. Quando mortes brutais começam a ocorrer cada vez mais perto de seu novo bairro, Sienna percebe que é apenas questão de tempo até Art cruzar seu caminho mais uma vez.

Desde sua grotesca cena de abertura, Terrifier 3 já dá uma boa amostra do grau de violência que pretende oferecer. A teatralidade das peripécias sangrentas do palhaço Art continua desafiando todos os limites do aceitável. Art é antagonista e ao mesmo tempo co-protagonista. Enquanto o longa mostra as desventuras pós-traumáticas de Sienna, Art tem seu próprio arco independente, quase um spin-off dentro do próprio filme. É uma espécie de construção de personagem... baseada na destruição de outros personagens. Os trejeitos de mímico do aterrorizante palhaço conferem o mínimo de identidade ao figurão que ele é, mesmo que o material oferecido ao intérprete não seja lá muito complexo. A atuação silenciosa e bastante física de David Howard Thornton é o cerne do que, pro bem ou pro mal, torna o ''vilão'' um ícone moderno do Horror. Ao mesmo tempo, Sienna ganha nuances interessantes de estresse pós-traumático, com direito a alucinações e dúvida da realidade. O pacote completo de ''final girl'' sobrevivente. Lauren LaVera, contudo, consegue ir além dos clichês oferecidos a ela pelo roteiro pouco substancial, convencendo até quando o filme insiste em resgatar o plot da profecia de que ela seria uma espécie de guerreira-valquíria predestinada a derrotar Art com uma espada mágica vinda de deus-sabe-onde, presente póstumo de seu pai e que parece ser a única arma capaz de ferir o palhaço imortal. Mesmo ganhando ares fantásticos, a interpretação da atriz se destaca pelos momentos mais pé-no-chão, em seus rompantes emocionais e sua interação com a família, na tentativa de reconstruir sua vida. Ela tem o melhor arco em Terrifier 3.

Trailer



Ficha Técnica

Título Original e Ano: Terrifier 3, Damien Leone. Direção e Roteiro: Damien Leon. Elenco: David Howard Thornton, Lauren LaVera, Daniel Roebuck, Elliot Fullam, Bryce Johnson, Samantha Scaffidi, Jason Patric, Chris Jericho,Tom Savini, Clint Howard. Gênero: Terror. Nacionalidade: EUA. Trilha Sonora Original: Paul Wealey. Fotografia: George Steuber. Edição:Damien Leone. Design de Produção: Olga Turka. Direção de Arte: Violet Morrison. Figurino: Olga Turka. Empresas Produtoras: Bloody Disgusting, Dark Age Cinema, Fuzz On The Lens Productions, The Coven.  Distribuição: Diamond Films Brasil. Duração: 02h05min. 

Estabelecendo em conta-gotas as regras inconsistentes da mitologia da franquia, a narrativa avança alguns passos, mas parece caminhar em círculos em outros aspectos. Enquanto a violência bárbara ainda é o foco dos filmes, elementos sobrenaturais vão ganhando cada vez mais espaço, sem muita preocupação com coesão ou bom gosto. O terror apresenta algumas sacadinhas espertas, como críticas ao boom do true crime como entretenimento, que rende algumas das melhores cenas do longa. Mas, no geral, soa como um pastiche sem vergonha de filmes dos anos 70. Vemos isso em sua direção de fotografia, com imagens granuladas, cores saturadas e brancos encardidos. O mesmo se aplica à trilha sonora composta por Paul Wiley, que usa sintetizadores que remetem a John Carpenter.

Este novo episódio da saga dirigida por Damien Leone conta com um considerável aumento de orçamento em comparação aos episódios anteriores. O investimento de 2 milhões de dólares pode parecer tímido frente às cifras oferecidas por estúdios de Hollywood a suas produções de Horror, mas é um salto bastante grandioso comparado ao pífio orçamento de cerca de 50 mil dólares do 1º Terrifier. O dinheiro injetado é perceptível no nível dos sets e na considerável melhora nos efeitos práticos (que agora soam mais realistas). Contudo, tais avanços não diminuem o aspecto asqueroso e sem vergonha adotado anteriormente, mantendo uma identidade estética coerente com os capítulos anteriores. Terrifier 3 acaba sendo a entrada da franquia com mais “cara” de filme, trazendo algum nível de capricho cinematográfico à trasheira proposto pela saga. Ainda que isso não necessariamente se refletita na qualidade da trama.

Crédito de Imagens: © 2024 Cineverse. All Rights reserved / Courtesy / Everett Collection / Diamond Films Brasil/ Divulgação
A história começa cinco anos depois os aconecimentos de Terrifier 2 (2022)

Talvez o principal problema no ponto atual da franquia Terrifier seja justamente sua carnificina explícita e desmedida. Não pelo choque que causa, mas pela certeza de sua iminência. A antecipação é uma das maiores estratégias do Horror enquanto gênero, o medo da incerteza do porvir. Com Terrifier, não existe incerteza: no momento em que personagens surgem em tela, existe uma probabilidade bastante confiável de que nas cenas seguintes seus corpos serão retalhados com requintes de crueldade pelo palhaço estripador. Quando o assassinato acontece, o impacto é diluído pela inevitabilidade estabelecida pelo próprio filme. Devido a isso, o diretor e roteirista Damien Leone se desafia a aumentar o grau de violência a cada novo episódio, a fim de continuar chocando plateias. Porém, aos poucos a estratégia começa a soar como um dado viciado. Não existe surpresa, não existem riscos. Com exceção de uma única morte (que acontece fora de tela e faz o público se questionar se realmente ocorreu), todas as demais vistas em Terrifier 3 são de personagens que já carregavam um alvo nas costas desde o 1º frame em que aparecem, restando apenas descobrir não o “se”, mas o “quando” e o “como”. Para quem se contenta com o "como", Terrifier 3 talvez seja um prato cheio. Temos aqui decapitações, desmembramentos, degolamentos, crianças sendo explodidas, vísceras, sangue por todo lado e brutalidades indescritíveis com motosserras. Até mesmo nitrogênio líquido é usado de forma diabolicamente criativa numa cena envolvendo tortura com um extintor de incêndio. Tais atrocidades de revirar o estômago fazem o vilão se dobrar de rir em deleite com o sofrimento de suas vítimas, como se desafiasse (e até convidasse) o público a se entreter com seu sadismo, desta vez temperado com algumas pitadas de heresia. Convenhamos, qualquer pessoa familiarizada com essa franquia não tem porquê ficar chocada com as peripécias cruéis de Art. Esse é o motivo principal para a existência destes filmes e de seu sucesso nos cinemas: um festival de violência desmedida e chocante, porém indiferente.

A pergunta que fica é: a franquia Terrifier teria algo a oferecer além de mortes explicitamente gráficas e níveis dantescos de sadismo cartunesco? A resposta é não, mas seu criador não parece estar muito preocupado com isso. E tudo indica que o público também não, visto a receita em bilheteria que cresce a cada novo capítulo. Então cá estamos no 3º filme da saga e com outra sequência já confirmada a caminho.

Com o refinamento estético e a profundidade narrativa de um fatality de Mortal Kombat (e um potencial equivalente de levar adolescentes desmiolados à loucura), a franquia Terrifier continua entregando exatamente aquilo que promete: ótimos efeitos práticos sangrentos e eviscerantes, ambientação asquerosa e senso de humor sombrio para entreter plateias famintas por gore e perturbar pessoas de estômagos mais sensíveis. Uma colcha de retalhos que combinam entre si, mas cujas costuras mal se sustentam juntas. Bom, talvez isso não importe muito quando o propósito é justamente rasgar tudo (e todos) e não ter vergonha disso.

HOJE NOS CINEMAS

quarta-feira, 30 de outubro de 2024

O Brutalista, de Brady Corbet | 48ª Mostra SP



Perspectiva internacional

Exibido nos Festivais de Valladolid, Veneza, Camerimage e no Gotham Awards.

O sofrimento judaico na Segunda Guerra Mundial aliado à ganância e fome de poder das elites racistas dos EUA cria mais um capítulo da grande tragédia americana: O Brutalista. A via crucis dos europeus que fugiram para os Estados Unidos após a guerra é mostrada em toda sua brutalidade. Os sobreviventes dos campos de concentração eram apenas tolerados e foram explorados por um sistema capitalista selvagem, que os triturou.

Os refugiados de guerra aqui são o arquiteto húngaro László Tóth (Adrien Brody), sua esposa jornalista Erzsébet (Felicity Jones) e a sobrinha órfã Zsófia (Raffey Cassidy), sobreviventes do campo de concentração de Dachau e separados após a libertação pelos exércitos aliados. Lászlo consegue migrar primeiro, indo morar com o primo Attila (Alessandro Nivola), dono de uma fábrica de móveis, agora católico e americanizado, na cidade de Filadélfia. Devido falsa denúncia de assédio sexual da esposa de Attila, é expulso de casa pelo parente e vai morar num abrigo para indigentes, com seu único amigo estado-unidense e o afro-americano, Gordon (Isaach De Bankolé), viúvo e provedor do filho.

Trabalhando como operário na construção civil e viciado em heroína, o húngaro muda completamente sua sorte quando uma biblioteca que fez para o ricaço Harrison Lee Van Buren (Guy Pearce), enquanto trabalhava para o primo, é reconhecida como uma obra genial do movimento Bauhaus, importante estilo artístico do século XX. Harrison, encantado por estar recebendo atenção de toda a elite de Filadélfia, convida o judeu para ser o arquiteto de um centro cultural nas suas terras, monumento à memória de sua mãe recém-falecida.

Crédito de Imagens: Brookestreet Pictres,  Kaplan Morrison, Andrew Lauren Productions / Divulgação  Mostra SP / Universal Pictures


Ficha Técnica

Título Original e Ano: The Brutalist, 2024. Direção: Brady Corbet. Roteiro: Brady Corbet e Mona Fastvold. ElencoAdrien Brody, Felicity Jones, Guy Pearce, Joe Alwyn, Raffey Cassidy, Stacy Martin, Isaach De Bankolé, Alessandro Nivola. Gênero:  Drama. Nacionalidade: Eua, Reino Unido, Hungria. Trilha Sonora Original: Daniel Blumberg. Fotografia:  Lol Crawley. Edição: Dávid Jancsó. Design de Produção: Judy Becker. Direção de Arte: Alexander Linde, Csenge Jóvári, Virág Tyekvicska. Figurino: Kate Forbes. ProdutoresTrevor Matthews, Nick Gordon, Brian Young, Andrew Morrison, Andrew Lauren, D.J. Gugenheim. Empresas Produtoras: Brookestreet Pictres,  Kaplan Morrison, Andrew Lauren Productions. Distribuição: Universal Pictures. Duração: 03h36min.

No período de construção de décadas dessa obra, Lászlo enfrenta as agruras financeiras comuns a este tipo de projeto milionário, bem como todos os insultos e preconceitos de seu mentor Harrison e de seu filho Harry (Joe Alwyn). Entre interrupções e retomadas, consegue reencontrar sua esposa e sua sobrinha, sequeladas física e psicologicamente do período no campo de concentração.

Os muitos sofrimentos e frustrações da família judia vão se sobrepondo até um grande clímax, que mostra como a sociedade norte-americana é doente! O ''american dream'' se mescla com a tragédia e efeitos assustadores. Os trabalhos dos atores principais são magníficos em mostrar essa complexidade de sentimentos. Adrien Brody, Guy Pearce e Felicity Jones estão em todas as listas de possíveis atores oscarizáveis, bem como o excelente diretor Brady Corbet, grata revelação no Festival de Veneza deste ano, tendo recebido o prêmio de melhor direção, melhor filme, pela categoria ''Arca Cinemagiovani''. O Brutalista também recebeu os prêmios ''FIPRESCI, CinemaSarà e Unimed Prize for Cultural Diversity'' neste mesmo festival.

Terceiro longa-metragem de Corbet, que assina também o roteiro ao lado de Mona Fastvold, a produção tem investimento dos Estados Unidos, da Hungria e do Reino Unido. Listados na filmografia do diretor estão as películas ''A Infância de um Líder'' (2015) e ''Vox Lux: O Preço da Fama'' (2018). Brady se revela como um dos grandes realizadores de sua geração, tendo dirigido um épico clássico, de grandes implicações políticas e sociais. É um roteiro maduro que aborda preconceito, violência, estupro, dependência de drogas, em cenas intensas, interpretadas por um excelente elenco. Na construção de um grande monumento à morte de uma matriarca de uma família rica, o cimento usado é o sangue dos desfavorecidos do capitalismo yankee.

Essa tragédia do sonho americano malogrado, porém, é ofuscada pelo subtexto político que, de certo modo, favorece Israel e sua guerra atual. Palavras tem muito poder e filmes muito mais! Pena... a produção se apresentaria de forma mais qualitativa se cerca de 40 minutos com esse teor fossem retirados, principalmente o texto final! Entendendo ou não o posicionamento político do diretor, cinema adulto traz implicações éticas, políticas e sociais. 

Nota: 8/10.

Vinheta da Mostra


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Horários de exibição

21/10

20:20

CINEMATECA ESPAÇO PETROBRAS

26/10

19:15

CINESESC

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segunda-feira, 28 de outubro de 2024

O Voo do Anjo, de Alberto Araújo


“Eu estou muito bem: bem velho e bem flácido”!


Com as constantes e céleres modificações ocorridas na linguagem cinematográfica, bem como na maneira de se realizar os longas-metragens (ou mais ainda, na categorização do que seja efetivamente um filme), os críticos se vêem diante de um perene desafio, relacionado às atualizações informativas e receptivas. A antiga dicotomia entre bom/ruim não dá mais conta das necessidades das novas audiências, visto que algumas produções possuem funções específicas, para além da valoração qualitativa: há filmes que servem para difundir doutrinas religiosas, há aqueles que ajudam pessoas atormentadas a acertarem contas com traumas do passado e há aqueles que não sabem direito o que são ainda. Apenas são e/ou tentam ser…

O Vôo do Anjo” (2024), dirigido pelo mineiro Alberto Araújo, por vezes, parece a versão audiovisual das páginas amarelas de uma lista telefônica: sempre que aparece algum estabelecimento comercial, este tem o seu logotipo focalizado em ‘close-up’, a fim de divulgar a marca em pauta. O tom de extensão publicitária é tão explícito que, em dado momento, os personagens do filme viajam para uma vinícola em Paraúna, interior de Goiás, e, de repente, no que parece uma conversa informal com o dono do local, ele começa a falar sobre a seleção cuidadosa das uvas que servem como matéria-prima para seus vinhos, o que é seguido por imagens da colheita, do armazenamento e da fermentação do produto. Tudo bem que, por ser uma arte cara, o cinema requer financiamento, mas, do modo como aparece aqui, foi exagerado! 

Este poderia ser o maior problema da produção, mas há outros ainda mais graves, relacionados à condição de alta classe das pessoas cujos dramas são compartilhados: vinculados à elite econômica do Estado, a bonomia com que eles são tratados contrasta com a maneira com que é representada a empregada doméstica Dora (Cida Mendes), cujas falas são acompanhadas por efeitos sonoros de comédia-pastelão. Chega a ser constrangedor! 

Como estamos aqui para falar do filme, esforcemo-nos para encontrar aspectos dignos de menção: um deles é o instante em que o cantor Fred Monteiro executa “Canção para Aurora”, composta por ele e pelo próprio diretor, que explica o título da película, e serve como alento poético para os personagens e para quem tenha passado por uma tragédia semelhante. A tônica é a da platitude classista, com frases que parecem escritas por um ‘coach’, mas as intenções não parecem ruins… 

Crédito de Imagens: Fata Morgana / Divulgação / Califórnia Filmes
A produção foi rodada em Goiânia e contou com financiamento a partir da Lei Paulo Gustavo em edital de chamamento da Prefeitura de Gyn em 2023.


Protagonizado por Othon Bastos, que está surpreendentemente à vontade num papel sem muita densidade – apesar de sua boa interpretação –, “O Vôo do Anjo” fala sobre um encontro casual que salva a vida de ambos os envolvidos. Vítor Falcão, seu personagem, é um professor de Física aposentado, viúvo há cerca de um ano, que, em seu aniversário de oitenta e oito anos, recebe a notícia de que ficará sozinho, em sua cobertura, no vigésimo andar de um prédio chique de Goiânia. Seu filho Renan (Gustavo Duque) havia marcado um jantar consigo, mas, como ele é cirurgião plástico, não conseguiu desmarcar uma operação pré-agendada. Para compensar a ausência, ele encomenda um prato com picanha, num restaurante refinado. Obviamente, o nome do restaurante aparecerá em destaque! 


Quando a comida chega, o entregador é autorizado a subir no apartamento de Vítor: ele é Arthur (Emílio Orciollo Neto), um professor de Sociologia – que não cita uma única leitura de seu curso – cuja filha pequena caiu de um prédio, durante a festa de aniversário de uma de suas alunas, e ele culpa-se bastante pela situação que desencadeou a morte da garota. Afinal, a sua esposa Karina (Dani Marques) lhe pedira enfaticamente que ele não levasse a criança para aquela festa. Extremamente depressivo, Arthur tinha uma intenção bastante definida ao aceitar este emprego: ter acesso a apartamentos em alturas elevadas, a fim de, assim, vislumbrar o seu suicídio. Logicamente, Vítor não deixará que isso aconteça, e a troca de experiências entre ambos possibilitará que eles constatem que são “irmãos de época”, de modo que Arthur aceita cuidar de seu anfitrião, depois que Dora precisa voltar para a sua residência e Renan viaja para um congresso em Paris…

No afã por preencher uma hora e meia com diálogos e situações que possibilitem um mínimo de identificação emocional com o espectador (além de exibir as fachadas dos estabelecimentos que os ricos personagens freqüentam), Alberto Araújo registra alguns detalhes redundantes do cotidiano dos personagens, como a situação em que o psicólogo de Karina fala sobre “as cinco fases do luto” ou quando Arthur diz a Vítor que, se ele tivesse nascido no Século XV, ambos não teriam se conhecido. Como não se pode reclamar que o roteiro seja inverossímil (há pessoas que realmente interagem de maneira tão superficial, supradiplomática e programadamente otimista quanto os personagens), esperamos que a sua mensagem de conforto chegue a quem dela necessita. Filmicamente, entretanto, trata-se de algo até difícil de catalogar, tamanhos os equívocos estilísticos, a despeito da competência técnica das ferramentas utilizadas para captação de sons e imagens. Quase um documentário involuntário sobre as áreas de lazer dos biomédicos, cirurgiões e donos de restaurantes das zonas urbanas privilegiadas do Centro-Oeste brasileiro!

Trailer


Ficha Técnica

Título Original e Ano: O Voo do Anjo, 2024. Direção e RoteiroAlberto Araújo. Elenco: Othon Bastos, Emílio Orciollo Netto, Dani marques, Cida Mendes, Gustavo Duque, Ana Flávia, Mauri de Castro, Franco Pimentel, Catarina Meneghel, Karlla Braga. Gênero: Drama. Nacionalidade: Brasil. Direção de Fotografia: Émerson Maia ABCine. Direção de Arte: Nelci Batista. Edição de Imagens: Thiago Thessari e Henrique Martins. Trilha Sonora: Guilherme Bicalho. Finalização: Antônio H.L. Queiróz. Produção Fata Morgana. Produção Executiva e Co Produção: Débora Torres. Distribuição: Califórnia Filmes. Duração: 90 Minutos
EM EXIBIÇÃO NOS CINEMAS 

Tudo Que Imaginamos Como Luz, de Payal Kapadia | 48ª Mostra SP


FOCO INDIA
COMPETIÇÃO NOVOS DIRETORES
Exibido em Cannes e Ganhador do Grande Prêmio do Juri


Terno, lírico, sensual, o filme Tudo que Imaginamos como Luz nos conquista pelos sentidos. As imagens e sons nos fazer sentir o calor úmido de Mumbai, suas chuvas torrenciais, suas ruas cheias, suas comidas e especiarias. A tapeçaria em formato de narrativa faz o espectador se sentir vivendo como as três personagens principais: a triste enfermeira casada balzaquiana Prabha (Kani Kusruti); a jovem enfermeira solteira sonhadora Anu (Divya Prabha) e a cozinheira viúva solitária Parvaty (Chhaya Kadam). As trajetórias destes três arquétipos da feminilidade indiana hindu são o tema desta obra-prima única, vencedora do Grande Prêmio do Júri do Festival de Cannes 2024.

Primeiro longa-metragem de ficção da diretora e roteirista indiana Payal Kapadia, seus trabalhos anteriores eram curtas-metragens e o documentário Uma Noite Sem Saber Nada (2021), recebeu o prêmio de melhor documentário na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes. Essa carreira vitoriosa mais uma vez se confirma em 2024, tornando a diretora um dos grandes expoentes do cinema indiano que foge do estilo Bollywood, de tanto sucesso comercial. Então, não espere ver nos seus trabalhos coreografias de dança e lutas elaboradas, nem músicas indianas irrompendo em meio aos diálogos ou tampouco clichês tradicionais da cultura deste país que respira sétima arte.

A cidade de Mumbai, anteriormente chamada pelo Ocidente de ''Bombaim'' devido os conquistadores ingleses, é a cidade mais importante da Índia, com seus doze milhões de habitantes. Maior centro econômico e comercial do país, é o lugar dos sonhos para os seus habitantes. Ou das ilusões, como bem aponta o filme. Entre anseios ou fantasias, neste centro de oportunidades pululam os mais variados tipos da sociedade indiana, hindus, muçulmanos, naturais da cidade ou migrantes das aldeias em volta. Entre esses milhões de almas, as mulheres constituem uma boa parte da população, reféns de tradições conservadoras milenares. Em vários graus de resistência, elas ditam seus caminhos e abrem veredas no caminho rumo à felicidade.

                                              Crédito de Imagens: Petit Chaos  /  48ª Mostra SP / Divulgação


Ficha Técnica
Título Original e Ano:  ,2024. Direção e Roteiro: Payal Kapadia. Elenco:   Kani Kurusti, Divya Prabha, Chhaya Kadam, Hridhu Haroon, Azees Nedumangad, Anand Sami, Lovleen Mishra, Madhu Raja, Shweta Prajapati, Tintumol Joseph. Gênero: Drama. Nacionalidade: França, India, Luxemburgo, Holanda. Trilha Sonora Original: Dhritiman Das Topshe. Fotografia: Ranabir Das. Edição: Clément Pinteaux. Figurino: Maxima Basu.Produção: Petit Chaos. CoProdução: Chalk & Cheese, Arte France Cinéma, Baldr Film, Another Birth, Les Films Fauves, Pulpa Film. Design de ProduçãoPiyusha Chalke, Yashasvi Sabharwal, Shamim Khan. Duração: 115min.

Essas mulheres, que conquistam o coração do espectador, cada uma ao seu modo, são Prabha, que teve um casamento arranjado com um marido que, logo no primeiro ano, migrou para a Alemanha, esquecendo da esposa amargurada e solitária; Anu, que resiste a um casamento hindu arranjado, e apaixona-se pelo jovem muçulmano Shiaz (Hridhu Haroon), e Parvaty, que tem que abandonar sua casa por conta da ganância de uma construtora e prefere voltar a morar na sua aldeia, às margens do mar.

Nessa volta às origens, Parvaty leva, para ajudá-la na mudança, as amigas, companheiras de apartamento, Prabha e Anu. Todas as três trabalham no mesmo hospital. Anu aproveita a ocasião para secretamente convidar Shiaz a visitá-la neste interior remoto. As nossas heroínas tem então chance de redefinirem suas existências nesta Índia rural mítica, onde os deuses as contemplam nas florestas, nos mares e em grutas místicas. Entre a Bombaim gigantesca e o vilarejo de um litoral remoto, entre desfile de divindades hindus e mulheres muçulmanas de véus, entre mulheres reprimidas de três gerações e suas libertações, conhece-se um pouco da Índia contemporânea e a guardamos conosco, num mosaico fascinante e pleno de beleza, explicitado no take final, onde numa escuridão geral os quatro personagens estão num bar de praia iluminado, com um atendente dançando inebriado, de fone de ouvido, uma música de Bollywood.

Esse sonho de película, propõe poesia pura em vários momentos. Ademais, nos faz acompanhar a vida de um trio muito real, três Graças mitológicas, suas frustrações, seus sonhos, seus envolvimentos românticos. Nesses símbolos femininos presenciamos também o sagrado da união com o homem. Algumas das sequências são tão belas que sufocam por sua poesia e misticismo. Conjunções carnais ou apenas imaginação, poesias lidas ou declarações líricas pichadas em templos milenares, os amores destas mulheres são graciosos, mesmo que tristes ou irremediáveis. Entre essa gangorra de decisões próprias ou submissão às convenções sociais, elas cavam seus caminhos para a felicidade.

Mumbai ou o vilarejo, a Índia é um dos personagens em cena. Esse recorte da realidade de um país tão complexo e dispare é um dos grandes feitos da diretora, que faz o espectador se sentir sensorialmente naquela realidade. Essa conjunção de características o faz uma obra-prima da sétima arte. Que Sarasvati, deusa hindu da sabedoria e das artes, abençoe o caminho da equipe e da diretora e a inspire a fazer muitos outros filmes! 

Nota: 10/10.

Vinheta da Mostra



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Horários de exibição

17/10

21:00

RESERVA CULTURAL - SALA 1

19/10

13:00

CINESYSTEM FREI CANECA 1

24/10

19:00

CIRCUITO SPCINE - CFC CIDADE TIRADENTES

26/10

19:30

CINEMATECA ESPAÇO PETROBRAS

30/10

19:00

CIRCUITO SPCINE CEU TAIPAS

30/10

19:00

CIRCUITO SPCINE CEU BUTANTÃ

30/10

19:00

CIRCUITO SPCINE CEU TRÊS LAGOS

30/10

19:00

CIRCUITO SPCINE CEU SÃO MIGUEL

30/10

19:00

CIRCUITO SPCINE CEU CAMINHO DO MAR

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