MOSTRA BRASIL
“O que falta é a gente se unir, para não sermos mais espancados”…!
Ainda que o bolsonarismo – e/ou tendências derivadas, tão malevolentes quanto – continue a vicejar em nosso país, a derrota deste segmento, na eleição presidencial de 2022, fez com que percebêssemos que, unindo forças, conseguimos vencer um inimigo comum. De lá para cá, alguns filmes começaram a abordar como se poderia reintegrar ao nosso convívio pessoas que defenderam ideologias contra-humanistas: “O Mensageiro” (2023, de Lúcia Murat – resenhado aqui) abordou a questão sob o viés biográfico e reflexivo, enquanto este “Filhos do Mangue” (2024, de Eliane Caffé) posiciona-se sob o viés da alegoria inclusiva…
Um tema que atravessa toda a filmografia desta diretora é a lógica comunitária, a associação de convivas em prol de uma causa geral: vimos isso em “Narradores de Javé” (2003), quando os moradores de uma cidade prestes a ser inundada precisa criar um passado louvável, para defender seu patrimônio imaterial; e também no extraordinário “Era o Hotel Cambridge” (2016), em que militantes do Movimento dos Sem Teto elaboram situações docudramáticas, a fim de enfatizar a importância de ocupar locais desabitados; e ainda no fascinante “Para Onde Voam as Feiticeiras” (2020, co-dirigido por Beto Moreira & Carla Caffé), em que artistas LGBTQIA+ realizam intervenções juntos aos transeuntes do Centro de São Paulo, a fim de demonstrar como a resistência política pode surgir de maneira espontânea.
Em “Filhos do Mangue”, estes aspectos retornam através de uma adaptação literária – “Capitão”, de Sérgio Prado –, em que atores profissionais se misturam aos membros de uma comunidade ribeirinha, para contar a história de um homem desmemoriado, que cometeu atos mui reprováveis e, de repente, passa a vagar numa “zona livre”, até montar novamente o quebra-cabeça que é a sua própria vida. Interpretado por Felipe Camargo, este senhor, de nome Pedro Chão, apropriou-se indevidamente do dinheiro de uma cooperativa, além de espancar continuamente a sua esposa Vina (em atuação de Titina Medeiros) e de colaborar com práticas relacionadas à prostituição de menores.
Crédito de Imagens: Bretz Filmes / Mostra SP
Título Original e Ano: Filhos do Mangue, 2024. Direção: Eliane Caffé.Roteiro: Eliane Caffé e Luís Alberto Abreu, baseado na obra literária e no roteiro original CAPITÃO, de Sérgio Prado. Elenco: Felipe Camargo, Roney Villela, Titina Medeiros, Genilda Maria, Thiago Justino, Jeniffer Setti, Luana Cavalcante, Pequena Cintilante, Jurema Terra, Wilaneide Campos, Geisla Blanco, Barney Villela, Arlindo do Nascimento, Chico Gomes, Sergio Henrique, Gilmar de Oliveira, Fátima da Silva, Maria Baixinha, Seu Chão, Fernando Muniz, Vênus de Morais, Ni, Makarios Maia, George Holanda, Salesia Paulino, Felipe Freire, Marcia Lohss, Paola Mallmann, Dona Ditinha, Maria José, Socorro Rabelo, Maria Alice da Silva e Hugo Oliveira. Gênero: Drama. Nacionalidade: Brasil. Trilha Sonora: Thomas Rohrer; Som direto: Lucas Caminha. Mixagem: Alexandre Rogoski e Ariel Henrique. Diretora Assistente: Tarsila Araújo; 2ºAssist. Marina Tinel; 3ºAssist. Marcia Lohss. Preparadora de elenco: Marcia Lohss. Diretor de Fotografia: Pedro Rocha; 1º Assist. de Direção de Câmera: Larissa Vescovi; 2ºAssist.: Gabriel Sager Rodrigues; Operador de Câmera da Segunda Unidade: Zé Bob; 1º Assistente de Câmera da Segunda Unidade: Dudu Barbosa; Logger: Luis Ramon. Diretor de Arte: Rodrigo Frota; Primeiro Assistente e Cenógrafo: Erick Saboia; Produtora de Arte: Valeria Pinheiro; Cenotécnicos: Claudio Carijó, Antonio Lima; Contraregra: Jeferson Vieira, Figurino: Luiz Santana; Primeira assistente de figurino: Michele Dalpasqual 2ºAssist. Sueldo Freitas Soares (Su); Visagismo: Bob Paulino; Primeira assistente de visagismo: Anderson Diniz. Edição: Eliane Caffé, com a assistência de Keily Estrada. Continuísta: David Sobel Logger: Luis Ramon Video Assist: Júlio César Schwantz. Platô: Jairo Dornelas; 1º Assist. Platô: Thierry Henry; 2º Assist. Platô: Will de Oliveira. Som direto: Lucas Caminha; Microfonista: Catha Pimentel; Segundo Microfonista: Carolina Cutrim. Assistente Microfonista e Locação de Equipamentos: Mayra Coelho. Eletricista Chefe/Gaffer: Alexandre Henrique da Silva; Assist. de Elétrica: Gilberto Donato Massari e Leandro Cleyton Lima. Maquinista Chefe: Alex Índio. Produção de Elenco Principal: Fernando Muniz. Produção de Elenco Local: cardeiro.art. Finalização: João Castelo Branco e Rafael Lopes (NIT’S Lab). Desenho de Som: Ale Rogoski. Designer Gráfico (Letreiros/Poster) e Primeiro Desenho de Produção de Arte: Carla Caffé. Controller e Administrativo: Lucio Monteiro Aguiar e Lia Procati. Assistente de Produção Executiva: Paola Mallmann. Diretora de Produção: Andrea Lanzoni. Coordenadora de produção: Keila Sena.Produtores: Fernando Muniz e Beto Rodrigues. Produtores Associados: Anselmo Martini e Carolina Brasil. Distribuição: Bretz Filmes. Duração: 107min.
Quando Pedro desperta, no início do filme, há muitas pessoas querendo espancá-lo. Ele é amarrado e submetido a um julgamento improvisado, quando se constata, de fato, que ele não lembra dos crimes que cometeu. Sem ser efetivamente perdoado, Pedro Chão é solto, mas perambula a esmo pelos ambientes, já que é malquisto por quase todos e se demonstra inábil no traquejo das atividades de subsistência daqueles moradores: ele não sabe caçar caranguejos nem pescar e, quando sente fome, pede algo às mulheres da região, que o rechaçam por causa da maneira brutal como ele tratava Vina. Mas eis que uma dessas mulheres, mais velha, diz que “não sentimos apenas a fome do corpo físico”. É a deixa para que, em seu caminhar quase fantasmagórico, Pedro entenda como pode contribuir com o reerguimento de seus vizinhos – e, por conseguinte, de si mesmo.
Num delírio, Pedro lembra dos ensinamentos de seu pai, que lhe apresenta a técnicas de conjunção de objetos que, mais à frente, desencadeará na longa seqüência em que ele se esforça para montar uma estranha estrutura com retalhos, que encantará quem passa por perto, em razão da estranha beleza de algo cuja construção contou com o auxílio de vários indivíduos, inclusive da filha de Pedro, interpretada por Maria Alice da Silva. Pouco a pouco, ele estará apto não apenas para lembrar do que fez, mas, sobretudo, para tentar corrigir as mazelas que causou.
Possuindo diálogos ostensivos de adesão às causas identitárias – vide o momento em que uma das mulheres mostra, num telefone celular, imagens de companheiras utilizando asas simbólicas, comprovando que “elas podem fazer o que quiserem” e que, como tal, empoderam as demais –, “Filhos do Mangue” atinge ápices existenciais no compartilhamento das experiências de vida da simpática Maria Baixinha e no monólogo de Davi (Thiago Justino, excelente), que explica para Pedro Chão que a Natureza possui uma maneira sábia de devolver às pessoas as conseqüências de suas ações, de modo que a sua amnésia passa a ser uma bênção, no sentido de que ele pode se livrar da identidade negativa do passado. Estes personagens falam diretamente conosco!
Montado, pela própria diretora, de modo a fazer com que o espectador sinta o mesmo estranhamento que perturba (e ressignifica o cotidiano de) Pedro Chão, “Filhos do Mangue” é um filme que faz uso expressivo de seu desenho de som – no qual a colaboração de Thomas Rohrer, na trilha musical, é fundamental – e que é permeado por diversas situações de caráter semidocumental, em que os moradores da região litorânea de Barra do Cunhaú, no Estado do Rio Grande do Norte, representam ações do dia a dia, além de denunciarem os desmandos que eventualmente ocorrem no local. Não é um trabalho tão coeso quanto os anteriores de Eliane Caffé, mas ele nos convida a agir, frente a um dilema imediato: como tratar os agressores contumazes, que alegam estar arrependidos daquilo que perpetuaram publicamente, por tanto tempo? Qualquer ato posterior a isso passa por algo convertido em manifesto fílmico: inspirando-se na força das mulheres!
Vinheta da Mostra
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Horários de exibição
26/10
20:45
ESPAÇO AUGUSTA SALA 2
28/10
13:00
CINESYSTEM FREI CANECA 6
Para adquirir ingressos do filme, clique aqui.
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