O Quarto Ao Lado, de Pedro Almodóvar


O desejo e a escolha de partir são abordagens encontradas no novo longa do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, ''O Quarto Ao Lado''. Almodóvar dirige seu filme mais maduro em mais uma empolgante fase de sua produtiva carreira. A película marca o debut do diretor apresentando um longa-metragem inteiramente falado no idioma inglês. O drama iniciou seu circuito de exibições no Festival de Veneza, em setembro deste ano, onde ganhou o Leão de Ouro. Desde então foi exibido em diversos países em renomados eventos de cinema, entre eles, o Festival do Rio, aqui no Brasil, e já aparece na lista de diversos críticos especializados como um dos prováveis candidatos ao Oscar no próximo ano.
Almodóvar tem um currículo extenso. Pelos seus excelentes trabalhos, como ''Mulheres à Beira de um Ataque dos Nervos'' (1988), ''Tudo Sobre Minha Mãe'' (1999), ''Fale com Ela'' (2002) e vários outros, já deixou seu nome inscrito na lista de maiores diretores de todos os tempos. Nascido em 1949, em Calzada de Catalavra, na Espanha, já passou por várias fases na carreira: uma mais escrachada, baseada em comédia de costumes, a segunda fincada nos alicerces do melodrama e agora, a mais recente, com fundamento nos grandes temas existenciais da humanidade, como a morte. Não é que as fases não se interponham, mas os temas e motivos principais podem ser englobados nestas três categorias.
Trailer

Ficha Técnica
Título Original e Ano: The Room Next Door, 2024. Direção: Pedro Almodóvar. Roteiro: Pedro Almodóvar - adaptação do livro homônimo de Sigrid Nunez. Elenco: Tilda Swinton, Julianne Moore, John Turturo, Ester McGregor, Alessandro Nivola, Alex Høgh Andersen, Victoria Luengo, Melina Matthews, Juan Diego Botto, Raúl Arévalo, Anh Duong, Sarah Demeestere, Anton Antoniadis. Gênero: Drama. Nacionalidade: Espanha e Estados Unidos. Trilha Sonora Original: Alberto Iglesias. Fotografia: Eduard Grau. Edição: Teresa Font. Design de Produção: Inbal Weinberg. Direção de Arte: Gabriel Liste. Figurino: Bina Daigeler. Distribuição: Warner Bros. Pictures. Duração: 01h47min.
Tilda Swinton interpreta a correspondente de guerra Martha. Após uma vida intensa, está doente de um câncer terminal e muito solitária. Não se dando bem com a filha, que teve muito adolescente, está sofrendo sozinha seu martírio, até que recebe a visita de uma grande amiga do passado, Ingrid, vivida pela atriz Julianne Moore. Tendo sido afastadas pelas particularidades da vida, Ingrid por ter ido morar em Paris, Martha pelo seu trabalho em um mundo em guerra, elas têm uma linda amizade que começou em Nova York, onde estão vivendo de novo atualmente.
As muitas conversas entre as duas nos fazem conhecer melhor a jornalista, seu passado com a filha, suas aventuras de guerra, seu desalento com a morte próxima. A sua última tentativa de cura fracassou irremediavelmente. Numa decisão muito pensada, Martha resolve se matar, tomando uma pílula da morte. Para isso, convida Ingrid a uma temporada de um mês numa casa de campo. Elas ficariam em quartos próximos até que uma noite a doente terminal resolvesse tirar sua vida, tranquila, na companhia, no quarto ao lado, de uma grande amiga.

Crédito de Imagens: (C) El Deseo. Photos de Iglesias Más / © 2024 Warner Bros. Entertainment Inc. All Rights Reserved.
A produção foi rodada na Espanha e nos Estados Unidos em maio deste ano.

Ingrid, no início, se recusa, até que cede à amiga e ambas vão se hospedar em uma propriedade rural na região de Woodstock. Então começa a longa preparação para uma morte anunciada e ambas as atrizes dão shows de interpretação, nessa discussão do tema principal da existência humana: a morte. Com atrizes do porte de Tilda Swinton e Julianne Moore, esse flerte com a doença e a finitude está em cada cena do filme e, graças a chegada do término da vida, o diálogo entre duas amigas pode revelar as mais profundas questões existenciais. Personagens secundários, como Damian (John Turturro), amante no passado de ambas e atual ficante de Ingrid, Flannery (Alessandro Nivola), policial religioso que investiga a ocorrência, até mesmo a filha de Martha, acrescentam matizes à narrativa, brilhantemente escrita pelo próprio Almodóvar, a partir da obra de Sigrid Nunez, explicitando o mal-estar que acomete o mundo, com a pandemia, a emergência climática, a extrema direita. O mundo está doente como Martha e caminha inexoravelmente para o fim.
O típico estilo Almodovariano está muito presente também nessa fase existencialista. A montagem da trama com seu humor típico, com suas cores quentes e seus cenários artísticos deslumbrantes, sua assinatura como diretor, continua lá. Sua habilidade como realizador de acrescentar piscadelas aos grandes clássicos do cinema, da literatura e das artes plásticas também. Uma citação do conto Os Mortos, de James Joyce, repetida em algumas cenas do filme, cria um efeito tão bonito, que as lágrimas brotam na emoção genuína de se ver a grande arte, aquela que desvenda os segredos humanos mais profundos. Um filme muito cheio de sentimento e que traz a arte em seu melhor estado! Uma obra-prima irrepreensível de um magnífico diretor. E o trabalho artístico mais uma vez nos faz esperançosos de que a vida está aí, com muita beleza, e de que cada dia é uma benção. Afinal, mesmo que estejamos no quarto ao lado, a neve cairá para todos, para os vivos e os mortos.

Nota: 10/10.

HOJE NOS CINEMAS

Escrito por Marcelino Nobrega

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