MOSTRA BRASIL
Exibido no Festival de Veneza
Mais recente realização da diretora brasileira Petra Costa, orgulho do cinema brasileiro devido a enorme conquista de ter o seu filme ''Democracia em Vertigem'' indicado ao Oscar 2020 na categoria de Melhor Documentário, a produção Apocalipse nos Trópicos embarca os espectadores estrangeiros em outra análise da realidade brasileira que é deveras assustadora pelas situações esdrúxulas apresentadas, mas que, todavia, faz parte do cotidiano dos brasileiros, infelizmente.
O documentário é um resumo didático dos últimos anos da nação verde-amarela. Retrata o fenômeno dos líderes evangélicos que, aos poucos, construíram lideranças políticas, conclamando seus fiéis a votarem em nomes de sua preferência. Essa tomada de posição mais agressiva mudou as esferas do poder municipal, estadual e federal. A mescla de estado e religião deu uma guinada conservadora às últimas decisões políticas; a Bíblia agora é o livro base para as novas leis votadas e decisões executivas e judiciárias tomadas. Todos os últimos acontecimentos político-sociais tem a influência dos evangélicos; é o sagrado misturando-se com o laico, abalando um dos princípios da democracia, que é ser leiga. Além dos três poderes garantidos pela constituição, tem-se o quarto poder que é a Igreja. O Brasil não é para amadores! E a bagunça que se instaurou a todos pertence.
Mostrando através de entrevistas, programas de televisão e imagens diversas a inserção da religiosidade na política como projeto de poder, a diretora expõe claramente como essa confusão de valores ameaçou em vários momentos uma democracia, em si fragilizada, pois recente. Todos os últimos momentos políticos, como as últimas eleições presidenciais, a invasão do Congresso, o impeachment, são apresentados em imagens chocantes de uma realidade quase mágica, de tão absurda que é. Afinal privilegiar uma massa de fiéis em detrimento de minorias não é exatamente um dos conceitos da democracia - nem mesmo dos ensinamentos cristãos. Ainda mais usando para isso trechos escolhidos de um livro milenar, como primordial, o capitulo que contem o ''apocalipse'', numa previsão da batalha final e da vinda do Messias.
Crédito de Imagens: Busca Vida Filmes | Peri Productions | 48ª Mostra SP | Divulgação
Ficha Técnica
Título Original e Ano: Apocalipse nos Trópicos, 2024. Direção e Roteiro: Petra Costa. Com a participação de Silas Malafaia, Bolsonaro, Cabo Daciolo, Alexandre de Moraes, Presidente Lula. Gênero: Documentário. Nacionalidade: Brasil. Música: Rodrigo Leão. Fotografia: João Atala, Pedro Urano, Murilo Salazar. Montagem: Victor Miaciro, Jordana Berg, Tina Baz, David Barker, Nels Bangarter, Eduardo Gripa. Som: Olivier Goinard. Desenho de Som: Olivier Goinard, Felipe Mussel. Produtoras: Petra Costa, Alessandra Orofino. Produção: Busca Vida Filmes, Peri Productions. Duração: 110min.
Não espere grande ou inovador cinema! O que se tem aqui é um feijão com arroz muito bem temperado e consistente da nossa situação política! Essa simplicidade de propósitos e a didática excelente comunicam de maneira muito clara a todos que assistem o que aconteceu e ainda acontece nesta Terra do Sol, onde Deus e o Diabo coexistem e se metem na política. O Presidente Lula e o Pastor Silas Malafaia aparecem em vários momentos, em aparições públicas ou em momentos íntimos como nas refeições com a família. Estas duas bases nas quais se balança o frágil momento político atual norteiam a condução do roteiro, onde ainda brilham outros figurões como Cabo Daciolo, Alexandre de Moraes, Jair Messias Bolsonaro e outros. Esses líderes influenciam o povo, que não é esquecido na história. Os depoimentos das pessoas comuns são impagáveis, o suco da alma brasileira sendo apresentado às plateias do mundo todo. Muita citação do todo salvador, muita oração, muitas lágrimas derramadas e muitas promessas a serem pagas, algumas entrevistas são até cômicas, de tão absurdas e irracionais.
O livro Apocalipse, da Bíblia, não significa batalha final entre o Bem e o Mal, entre os fiéis e os leigos. O termo apocalipse é revelação. Essa revelação, a busca pela verdade, é importante para que se compreenda este fenômeno perturbador. Nada melhor que um documentário para se levar às massas o estudo desse fenômeno, que não vai acabar, é um projeto de poder declarado, conforme mostrado em vários depoimentos. Como os líderes religiosos declaram no filme, a política é uma das colinas a serem dominadas, uma das bases para a guerra. Cabe ao espectador assenhorear-se desta realidade e, também, se posicionar!
Nota: 8/10.
Vinheta da Mostra
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REPESCAGEM - SEGUNDA 04/11 às 15h, no CINESESC
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Um comentário:
Aplausos de pé para esta ótima conclusão: parágrafo final esplêndido!
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