Aqui, de Robert Zemeckis

 
Adaptação da história em quadrinhos ''Aqui'' do desenhista Richard McGuire, o filme de mesmo nome é a mais nova realização do diretor Robert Zemeckis, o cineasta responsável por clássicos como a trilogia ''De Volta Para o Futuro'' (1985, 1989, 1990), ''Uma Cilada para Roger Rabbit'' (1988) e ''Forrest Gump:  O Contador de Histórias'' (1994), que recebeu seis prêmios no Oscar de 1995, entre os quais, o de melhor diretor. Com um naipe deste porte, imagina-se que este estado-unidense genial apresente apenas obras-primas. No entanto, infelizmente, com seu mais recente trabalho, a maestria não entra em cena.

O enredo se debruça sobre cenas e acontecimentos em um determinado espaço de poucos metros quadrados no decorrer de milênios. O cenário de todos os takes será sempre este recorte retangular (o ângulo da câmara não muda por quase toda a película). O período abarcado vai desde a longínqua pré-história até a atualidade, após a pandemia da Covid-19. Em determinado ano do século XVIII ou século XIX, ali constrói-se uma casa, com janelas enormes, e é a sala de estar desta residência que se torna o palco principal no longa e o centro da narrativa destacando o uso estratégico da ''mis en scène''. Durante décadas, moram no lugar várias famílias. O núcleo mais importante e que toma mais tempo de tela é a família de um combatente da Segunda Guerra Mundial, Al e sua esposa, Rose, o casal é interpretado por  Paul Bettany e Kelly Reilly, respectivamente. Já seu filho mais velho, que continua morando na casa mesmo após casado, é Richard, papel de Tom Hanks.

'Em "Here'', título original da produção, o espectador se depara com uma bela homenagem ao longa de Zemeckis ''Forrest Gump'', isto se deve a presença da querida esposa de Richard, Margaret, que é vivida pela atriz Robin Wright. Hanks e Wright se encontram em cena depois de trinta anos e relembram o casal adorável e sofrido que viveram no clássico da década de 90, pena que aqui robotizados por toneladas de pixels de efeitos especiais computadorizados. O rejuvenescimento artificial dos astros prejudica sensivelmente suas atuações, retirando o brilho dos papéis passados e estes estão nesta situação por uma escolha clara do diretor em reutilizar os atores por todo o filme.

   Créditos de Imagens: Miramax, ImageMovers, Canadian Film or Video Production Services Tax Credit (PSTC)/ Imagem Filmes /Divulgação 
Robert Zemeckis tenta fazer aqui o que Lars von Trier fez em ''Dogville'' (2003) ou o que Yorgos Lanthimos traz em seu ''Tipos de Gentileza'' (2024), mas não alcança bons resultados para o seu cinema saudosista e de família. 


Esse é um dos problemas em ''Aqui'': excessos de efeitos especiais. Quando usados em demasia e sem o cuidado com a verossimilhança, nenhuma sequência dramática se sustenta. Beija-flores, veados, dinossauros, atores rejuvenescidos digitalmente, é tudo tão artificial que a emoção genuína que se pretende criar não alcança o espectador. Além disso, a trilha sonora ecoa esse desejo de emocionar à força e é tão exagerada e melodramática que chega a incomodar.

A questão da adaptação de qualquer obra de arte é que ela tem que se moldar à mídia que se pretende utilizar. Algo que funciona perfeitamente numa obra em quadrinhos, às vezes não funciona tão bem na tela do cinema, apesar da proposta criativa. Ao contrário, pode até atrapalhar o caminhar da trama. Assistir ao filme dá a impressão de se estar lendo o quadrinho na tela. A técnica de se sobrepor vários quadros no ecrã ou página, mudanças rápidas de tempo, a edição muito acelerada, ideias e situações importantes para o desenrolar da estória, mas mostradas rapidamente, todas essas técnicas funcionaram na HQ, mas no cinema dão a impressão de incompletude, de rasura na abordagem. Os personagens são tantos, os tempos narrativos tão distantes, a multiplicidade de situações tão gigante, que não se consegue ter empatia com ninguém. Em menos de duas horas de filme, passam pelo cenário indígenas, a família de Benjamin Franklin, escravizados, combatentes da Segunda Guerra, baby boomers, millenials. É muita informação em um espaço só! O quadrinho, quando publicado em revistas independentes,  nos anos 80, foi tido como revolucionário. Somente em 2014 foi compilado no formato de graphic novel e desde então aparece em muitas listas como ''uma das melhores estórias em quadrinhos de todos os tempos''. 

Esta adaptação com, custo de 45 milhões de doláres, não consegue convencer ou estar no patamar de genial e inovadora. É uma pena, mas o mundo do cinema tem seus regramentos, sua gramática tem que ser respeitada em seus pontos básicos. Quando isso não acontece, a obra perde sua unidade narrativa e não consegue passar a mensagem a que se propõe. Ainda assim, é um grande prazer rever a dupla Tom Hanks e Robin Wright trabalhando juntos! E entenda que como cinéfilo, filmes desequilibrados sempre podem trazer uma nova concepção a sua prateleira de estudo da sétima arte. 

Trailer


Ficha Técnica

Título Original e Ano: Here, 2024. Direção: Rombert Zemeckis. Roteiro: Eric Roth e Robert Zemeckis - adaptação da Graphic Novel de Richard McGuire. Elenco: Tom Hanks, Robin Wright, Paul Bettany, Kelly Reilly, Ellis Grunsell, Teddy Russell,  Fin Guegan, Callum Macreadie, Lauren McQueen, Grace Lyra, Jemima Macintyre, Billie Gadsdon, Beau Gadsdon, Harry Marcus, Michelle Dockery. Gênero: Drama, Romance. Nacionalidade: EUA. Trilha Sonora Original: Alan Silvestri. Edição: Jesse Goldsmith. Fotografia: Don Burgess. Empresas Produtoras: Miramax, ImageMovers, Canadian Film or Video Production Services Tax Credit (PSTC). Distribuição: Imagem Filmes. Duração: 01h44min. 

Nota: 5/10.

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Escrito por Marcelino Nobrega

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