Após compor uma das maiores obras primas do horror moderno (O Farol, 2019), Robert Eggers retorna com mais um longa-metragem do gênero neste inicio de ano. Na releitura do clássico alemão de mesmo nome de 1922, Eggers (também roteirista) mantém a linha narrativa muito semelhante. Mas assim como o antecessor foi um filme da vanguarda expressionista e marcou uma era com sua estética, o diretor do remake aposta em uma linguagem e estética bastante autorais.
A maior adição em relação ao filme do início do século XX com certeza é o teor sexual. O erotismo já estava presente na obra original da forma como era possível na época. Embora não se insinuasse explicitamente de forma visual, o conteúdo já indicava o desejo do vampiro vilão sobre a mocinha Ellen papel que aqui é de Lily-Rose Depp. Mas agora, a sexualidade escancara-se de maneira extremamente perturbadora.
Apesar de não ser um galã requintado como Lestat ou Edward Cullen, a presença pútrida de Nosferatu (Bill Skarsgård) inspira sexualidade a todo instante. Além de ficar muito óbvio que o desejo do vampiro por Ellen não passa apenas pela ingestão de seu sangue, mas também pela consumação carnal, a própria forma como ele suga o plasma de outras vítimas faz alusão a uma relação sexual pela forma como ele monta a pessoa e faz movimentos ritmados. Para completar, todas as vezes que Ellen sonha com ele, emite barulhos que remetem a gemidos de prazer.
Sob o olhar de Eggers, Ellen tem muito mais agência sobre sua situação que a mocinha original. Ela não é apenas a mulher cobiçada. Há uma conexão da garota com o monstro desde a cena inicial que tornam seus sacrifícios algo além de heroísmo e martirização, algo como a redenção pelos erros do passado, mesmo que estes tenham sido erros inocentes. E aqui entra a principal crítica ao roteiro: apesar de coeso e bem escrito, ele se atém demais ao original, carregando inclusive suas falhas temáticas. É imputado à mulher um pecado e uma culpa e cabe a ela um sacrifício sem volta para limpar sua consciência e seu passado.
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Tanto o diretor Robert Eggers como a atriz Lily Rose-Depp citam como influência os filmes ''Gritos e Sussurros'' (1972), ''Nosferatu - O Vampiro da Noite (1979), ''Possessão'' (1981) e ''O Farol'' (2019).
O vilão ainda evoca de forma desconfortável a figura de um imigrante que chega para espalhar a peste e corromper as mulheres. O fato do Nosferatu de Skarsgård ser mais humano que o de Max Schreck (Nosferatu, 1922) acentua essa ideia. Seu sotaque marcado, o bigode vasto e a capa de pelo animal ajudam a construir esse aspecto estrangeiro.
O maior mérito do filme realmente está no visual criado pela direção, fotografia e direção de arte. Embora seja um filme de terror com características góticas, em nenhum momento ele se rende ao modismo do cinema contemporâneo de desenhar cenas escuras por demais para evocar um tom sombrio ou realista. A ação do longa se desenrola predominantemente à noite, sob a luz do luar ou de velas e mesmo assim vemos tudo o que acontece com uma riqueza de detalhes sem que a impressão de escuridão desapareça.
O trabalho corporal de Skarsgård e Rose-Depp está sublime e Nicholas Hoult encarna bem o papel de marido bom-moço (curioso lembrar que o ator interpretou o serviçal de Drácula no terror cômico ''Renfield - Dando Sangue Pelo Chefe'', de Chris Mckay', lançado em 2023). Sempre que o sobrenatural está presente, a câmera adquire uma leveza de movimento como se estivesse flutuando, dando a ideia de algo fantasmagórico. O desenho de som ajuda a construir o clima de tensão e de repugnância. Tudo parece úmido e asqueroso. Em suma, Eggers mantém a consistência como um exímio diretor e Nosferatu ganha uma atualização à altura de sua fama, com um visual que não foge ao gênero, mas consegue ser inventivo.
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Ficha Técnica
Título Original e Ano: Nosferatu, 2024. Direção: Robert Eggers. Roteiro: Robert Eggers - inspirado no roteiro de Henrik Galeen e baseado no livro de Bram Stoker. Elenco: Lily-Rose Depp, Bill Skarsgård, Nicholas Hoult, Willem Dafoe, Aaron Taylor-Johnson, Emma Corrin, Ralph Ineson, Simon McBurney, Katerine Bila, Jordan Haj. Gênero: Terror. Nacionalidade: Eua,Reino Unido, Hungria. Trilha Sonora Original: Robin Carolan. Fotografia: Jarin Blaschke. Edição: Louise Ford. Figurino: Linda Muir. Design de Produção: Craig Lathrop. Distribuidora: Universal Pictures Brasil. Duração:02h12min.
02 de Janeiro nos Cinemas
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