A cultura preta norte-americana tem ganho relevância no cinema de Hollywood cada vez mais com a porta que se abriu para histórias e castings mais diversos. O diretor Ryan Coogler, que surgiu no mercado ao lado de Michael B. Jordan, em ''Fruitvale Station'' (2013) integra essa virada de jogo ao lado de diretores como Jordan Peele e Ava DuVernay. Ambos trazendo críticas sociais relevantes as telas e apresentando não só o sofrimento do povo preto, mas também a importância de suas conquistas e jornadas inspiradoras.
Agora a nova parceria entre Coogler e Jordan é um super filme que mescla gêneros (ação, terror, supernatural) e entrega muita história e cultura, além de trazer claras homenagens a música negra que surgiu com o 'Delta Blues', de Charley Patton, durante os anos de 1900 e bolinha, e foi se transformando/se misturando durante o tempo em outros subgêneros como o Soul, o Jazz, o Hip Hop. Logo, na trama que apresenta os irmãos Fuligem e Fumaça, ambos vividos pelo másculo Michael B. Jordan, como dois capangas de Al Capone que voltam de Chicago para o Mississipi para abrir um novo espaço em que a comunidade preta poderá se divertir após o trabalho, pinceladas de aula de história estado-unidense se apresentam e se integram a ficção. Os irmãos, claramente envolvidos com a máfia, retornam a sua terra natal e reveem o primo Sammie, personagem do talentosíssimo e estreante Miles Caton, que adora cantar e tocar blues, e saem em busca de suas conexões, como o casal de amigos comerciantes Bo e Grace Chow, vividos respectivamente por Yao e Li Jun Li, para ajudarem na noite de abertura da nova casa de música e dança para os trabalhadores locais. No meio do caminho, encontram o músico Delta Slim, vivido pelo sempre necessário Delroy Lindo (Romeu Tem Que Morrer, 2000), o forte Cornbread, papel de Omar Benson Miller, e a ex de Fumaça, Annie, interpretada por Wunmi Mosaku (da série da Max, Lovecraft Country, 2020). Com cada um, os gêmeos precisam resolver certas situações e chegar a um acordo e isto decorre em uma boa conversa. Fuligem, que também tem seus casinhos acaba dando de cara com a desbocada Mary, personagem de Hailee Steinfeld, e nesse momento faz de um tudo para se livrar da mulher branca que teve um caso fervoroso, mas ela acaba sabendo o que está havendo e consegue ir até o local em que a dupla de irmãos planeja uma noite sem igual a todos.
O filme entrega aos poucos detalhes sobre traumas das vidas dos irmãos, como a morte de um filho que Annie e Fumaça tiveram, ou que eles compraram o local onde se dará o novo ''clube noturno'' de um fazendeiro ligado a Ku Klux Klan, um grupo de ódio da extrema direita supremacista branca do sul dos Estados Unidos. O inicio da película também nos leva ao mesmo recorte do fim em uma edição muito acertada de Michael P. Shawver, que faz ainda um mix inteligente entre 'dia e noite' durante o caminhar de Sammie pela igreja do pai, onde está todo ensanguentado. A cena denota o suspense e o supernatural que estão por vir.
Trailer
Ficha Técnica
Título Original e Ano: Sinners, 2025. Direção e Roteiro: Ryan Coogler. Elenco: Michael B. Jordan, Delroy Lindo, Miles Caton, Hailee Steinfeld, Jack O'Connell, Helena Hu, Yao, Li Jun Li, Jayme Lawson, Omar Benson Miller,Wunmi Mosaku, Buddy Guy, Lola Kirke, Peter Dreimanis. Gênero: Thriller, Supernatural, Terror. Nacionalidade: EUA. Trilha Sonora Original: Ludwig Göransson. Fotografia: Autumn Durald Arkapaw. Edição: Michael P. Shawver. Design de Produção: Hannah Beachler. Direção de Arte: Jesse Rosenthal. Figurino: Ruth E. Carter. Empresas Produtoras: Warner Bros., Domain Entertainment (II), Proximity Media, Warner Bros. Discovery. Distribuição: Warner Bros Pictures Brasil. Duração: 02h07min.
É realizada uma construção compassada de dados reais que adentram a história. Isto porquê o diretor escolhe mostrar um carro escondido com bebidas alcoólicas pelo mato ao não colocar letras sobre a tela que denotam o período de ''Lei Seca'' vivido no Tio Sam. Apesar de que se evidencia o ano de 1932, dando uma dica mais clara do marco temporal. A própria Ku Klux Klan que chega a ser mencionada no filme não é vista nos seus trajes usuais, mas os figurinos são exibidos em certo momento em que um homem correndo pelo campo chega a casa do casal Bert (Peter Dreimanis) e Joan (Lola Kirke) e ali na cama estão as roupas. Este homem é Remmick (Jack O'Connell). Um camponês que está sendo perseguido por um grupo de Choctaw, uma tribo nativa dos sul. Bert acaba dando auxilio a Remmick, mas mal sabe ele que o líder da tribo o conta a verdade quando bate a sua porta, que o dito ''homem'' é perigoso e não pode se cair na ladainha deste.
Acontece que a chegada de Remmick a trama é o passo para o terror ou o supernatural adentrar a cena. E usando a ideia de que os membros da KKK, Bert e Joan inclusos, já iriam ao tal clube para exterminarem a comunidade de trabalhadores pretos, o homem os torna criaturas da noite, assim como ele e seguem juntos para tentar serem convidados ao bar e assim saborearem uma noite de muito sangue. Mais próximo ao local, o homem sombrio, que tem origens irlandesas, escuta a doce voz de Sammie soar e entende que precisa chegar até ele para assim poder encontrar com o seu passado e suas ancestralidades, visto que a música que o garoto produz tem o poder de visitar culturas. Por fim, cenas de lutas e de total confronto entre os grupos se deflagram trazendo à tona muita surpresa a audiência.
A produção foi filmada para IMAX usando câmeras 15/70MM e Christopher Nolan e a esposa Emma Thomas auxiliaram Coogler com o processo, pois possuem muita expertise.
O texto de Coogler, tão forte e impressionante, apresenta a cultura negra como o centro, a música como seu norte, e perante ela, facínoras que perduram pela humanidade - os homens brancos extremistas da KKK. Levemente apresenta outros grupos que também são perseguidos como os Nativos e os Asiáticos e, ao incluir a jornada de Remmick, revela também a cultura deste quando trata da perseguição que os Irlandeses sofreram nos tempos antigos por conta do cristianismo e de como a terra deles foi tomada. O homem misterioso traz nas canções histórias que deixam claro o preconceito sofrido e a luta por sobrevivência - o que dá um duplo sentido a narrativa quando se pensa na jornada dos próprios irmãos. Sendo o misticismo uma das temáticas, as vertentes nas quais ele se desdobra constroem ótimas bases e preenchem bem o que é real e fictício. O diretor também insere fortemente a origem do Blues aqui e o simbolismo que é para Sammie ganhar uma guitarra que 'talvez' possa ter sido do pai do gênero musical. Aliás, o músico Buddy Guy aparece interpretando o menino em idade mais avançada quando o longa-metragem já está quase no fechar dos créditos.
Miles Caton é a grande revelação do filme e pode se dizer que o grande destaque. No entanto, o conjunto de atores que auxiliam em partes especificas da trama como Delroy Lindo, que é o alivio cômico aqui, Hailee Steinfeld, Jack O'Connell, Helena Hu, Yao, Li Jun Li, Jayme Lawson, Omar Benson Miller e Wunmi Mosaku engrandecem toda a produção e fazem ela mais viva. Michael B. Jordan consegue dar nuances distintas aos gêmeos e também faz bonito. Ludwig Göransson, compositor da trilha original do filme, faz um trabalho dos deuses e chegou até a demarcar ao vivo no set de filmagem as composições para cenas importantes. A fotografia em tons escuros segue a tensão que se precisa, apesar de alguns momentos de claridade e com paisagens solares belíssimas. O figurino de Ruth E. Carter sabe vestir bem os atores e trazer a época em que estão.
A obra, que tem referências a ''Um Drink no Inferno'' (1996), de Robert Rodriguez, acaba ganhando um ar de originalidade como nenhuma outra ganhou nos últimos cinco anos e não só se consolida como produção fílmica de alta qualidade como chega para orgulhar o povo preto de sua história e de sua arte.
Avalição: Cinco guitarras poderosas (5/5).
EM EXIBIÇÃO NOS CINEMAS
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